Copa do Mundo no Recife: A mobilidade do improviso

Publicado em 10/05/2014 às 17:30
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    Fotos: Guga Matos/JC Imagem Fotos: Guga Matos/JC Imagem   Mobilidade no improviso. Maquiada, arrumada às pressas, viabilizada numa operação de guerra pelo poder público. Preparem-se. Assim será o ir e vir no Recife durante a segunda Copa do Mundo sediada no Brasil. Dará certo? Pode ser. Muitos duvidam, enquanto os responsáveis garantem que sim. Mas é fato que a cidade, mesmo a um mês do mundial, ainda não se vestiu, arrumou-se para o evento. Os caminhos que levam à Copa no Recife, sejam no transporte individual ou coletivo continuam ruins, abandonados, muito diferente do que prometem os gestores públicos. Não, ainda não estamos preparados. Iremos e voltaremos da Copa, mas as dificuldades existirão. Não importa se de carro, ônibus ou metrô. O  JC deu uma de turista e fez rotas apontadas como oficiais para chegar à Arena Pernambuco. Olhou com olhos de quem é de fora. Não só de estrangeiros, mas principalmente de brasileiros de outros estados, que deverão ser a maioria. Gente que não decorou os caminhos e, por isso, necessita da informação visual, praticamente inexistente nas rotas. Foi de carro e de metrô. De ônibus não deu para ir porque o sistema sequer está em operação, no caso o BRT (Bus Rapid Service, batizado de Via Livre). A impressão foi péssima. As ruas têm buracos e pouca sinalização indicando os caminhos - as placas, aliás, ainda são da Copa das Confederações. O metrô não suporta mais nada - para operar com eficiência nos jogos, terá que diminuir a oferta de serviço nos outros ramais. E o BRT... deixa para lá. A sensação é de que, se fôssemos turistas, sem o uso de aplicativos que hoje em dia fazem as pessoas chegarem a qualquer lugar, nos perderíamos.   https://youtu.be/clvP0dtgkLQ       BR_101   DE CARRO Comecemos pelo automóvel, o transporte preferido pela maioria. Sem dúvida, ir de carro para a Arena Pernambuco é a opção mais confortável. O automóvel tem vantagens. É seu, entra quem você quer, sai na hora em que lhe convém e lhe deixa onde e quando você determina. Não significa dizer que será o mais rápido. Pode ser que não. Os caminhos também não serão fáceis para o transporte individual. A frota veicular não colabora: são 1,2 milhão de veículos registrados somente na Região Metropolitana do Recife e a cidade deverá ser invadida por centenas de outros, vindos de diversos municípios e estados. As vias são outro problema. Aliás, o principal. A BR-101, no contorno urbano do Recife, tem trechos destruídos. Os problemas históricos do pavimento estão sendo potencializados com a chuva. O governo do Pernambuco está à frente da requalificação da rodovia - com recursos federais, começou pela recuperação do pavimento - mas os trabalhos estão muito no início. No Barro, precisamente no km 73 da BR-101, era impossível trafegar na semana passada. Buracos no pavimento, num ponto conhecido pelos problemas, provocavam um quilométrico congestionamento. Mas até a Copa ajeitam? Pode ser, mas o risco de ele reabrir será grande até o início dos jogos. E a BR-101 é rota oficial para a Arena. Quem sai de Porto de Galinhas, principal destino turístico de Pernambuco e um dos maiores do Brasil, por exemplo, passará por ela. A BR-101 se interliga com a BR-232, rodovia que dá acesso à BR-408 e, por sequência, à Arena Pernambuco, por um caminho sujo, degradado e escuro, sem quase nenhuma informação. Se o motorista partir da Zona Sul do Recife, onde concentra-se a rede hoteleira, seguindo o caminho oficial indicado nas placas instaladas ainda para a Copa das Confederações, em 2013, andará por vias esburacadas, como é o caso da Rua Ribeiro de Brito e do acesso da BR-101 à BR-232. Na Avenida Recife, encontrará semáforos fora de sincronia e um trânsito pesado. O percurso só torna-se bom quando o motorista chega à BR-408, duplicada por R$ 465 milhões no ano passado. A partir daí, até a Arena, é tranquilo. Embora o chamado ramal externo da Copa não esteja pronto até agora. O governo jura que o conclui até o fim de maio. É confiar. A verdade é que, para sorte dos turistas, a maioria chegará à Arena em transporte fretado. Ou seja, os caminhos serão abertos por motoristas da cidade, conhecedores dos problemas e acostumados a minimizá-los.   metrô_ambulante DE METRÔ Quem sai do Aeroporto Internacional do Recife com destino ao metrô se impressiona com a passarela elevada e rolante que interliga o terminal à estação Aeroporto do sistema metroviário. A passagem é imponente, está quase concluída - apesar dos atrasos, o governo jura que ficará pronta até o fim de maio - e proporcionará um acesso confortável, moderno e rápido entre os dois modais. É fato. Mas a imponência do caminho termina quando se chega ao metrô do Recife. Com uma média de 10 a 15 panes por mês, que de tão graves exigem a evacuação dos passageiros, o sistema passa a impressão de que não suportará, ao menos com qualidade, a futura operação da Copa. Os trens do metrô estão sem contrato de manutenção, o sistema possui diversos elevadores desativados - a CBTU garante que eles estão apenas desligados para serem poupados de vandalismo - e encontra-se invadido pelos ambulantes. A folga do comércio informal é tanta, que os bloqueios de acesso servem de mostruário para as mercadorias. Salgadinhos, pipoca e água são expostos livremente. Cortador de verduras, gibis evangélicos e cruzadas também. Na estação Joana Bezerra, o segundo principal ponto de troca entre as Linhas Centro e Sul, os ambulantes são reis. Estão nas rampas internas do metrô, nas plataformas e nos trens. Na Linha Sul também ocupam as plataformas. Vendem e sujam tudo sem qualquer incômodo. Se o turista presenciar o que o JC viu na semana passada, poderá não voltar. A reportagem andou em cinco composições e em todas encontrou dois ou três ambulantes, vendendo seus produtos aos gritos, de um lado para o outro. Não havia seguranças, os poucos funcionários nada podiam fazer, e a sujeira predominava. O dia era péssimo para o metrô por ser a quarta-feira 7, quando o ramal Camaragibe parou depois que um trem quebrou desde o dia anterior em uma das vias. Revoltada e cansada das panes - outra tinha acontecido uma semana antes -, a população protestou. Composições que se dirigiam à Camaragibe passavam a cada 30 minutos, sem refrigeração. Eram o inferno em forma de trem. A CBTU argumentou que foi algo pontual. O problema é que praticamente toda semana o sistema tem enfrentando um problema “pontual”.   Passarela     DE ÔNIBUS O sistema de BRT (Bus Rapid Transit) para a Copa do Mundo no Recife ainda é uma incógnita. Maior aposta do governo de Pernambuco para a mobilidade dos jogos, com mais de R$ 300 milhões investidos (prioritariamente do governo federal, é verdade), não estará operando sequer com um terço de sua capacidade. Ao contrário, uma única linha de BRT levará a população à Arena Pernambuco. E, mesmo assim, apenas aqueles que tiverem como destino o estádio, comprovado pelo ingresso na mão. Sem ele, ninguém embarca no BRT. As obras dos Corredores Leste-Oeste e Norte-Sul estão atrasadas a olhos vistos, especialmente a do primeiro corredor, eixo principal do sistema por ligar o Centro ao Terminal Integrado de Camaragibe e, de lá, a São Lourenço da Mata, onde está erguida a Arena. Apenas três das 45 estações dos dois corredores de BRT deverão operar. Essa é a previsão. O esquema de funcionamento está sendo guardado como ouro pelo governo. Nos bastidores, comenta-se que o silêncio se deve ao atraso das obras, que compromete a definição da operação técnica. E quem passa pelos corredores percebe. Até o ritmo dos trabalhos está lento. São poucos funcionários atuando. Na última sexta-feira, só para citar um exemplo, um único trabalhador era visto na estação Guararapes, no Centro, que funcionará como ponto de integração entre o Leste-Oeste e o Norte-Sul. Houve atraso no envio do material de infraestrutura das estações e a chuva tem prejudicado as obras físicas. Por isso o governo silenciou. Sem sistema operando, o JC não pôde observar como será chegar de BRT à Arena Pernambuco. Linhas expressas, como aconteceu na Copa das Confederações e se repete há anos no Carnaval, serão criadas para alimentar o metrô e o BRT, algumas partindo de shoppings. Mas o governo vai anunciá-las apenas na próxima semana. O TI Cosme e Damião, que deveria estar pronto há mais de um ano, arrasta-se. Sabe-se que seis mil pessoas são esperadas para se deslocar de ônibus até a Arena, segundo levantamento da FIFA. Até sentirão alguns benefícios do BRT, como o embarque em nível, o pagamento antecipado da passagem e o conforto do veículo, mas não um sistema íntegro, completo.   BRT_CBV GOVERNO DE PERNAMBUCO GARANTE QUE TUDO DARÁ CERTO Tudo dará certo, a mobilidade para a Copa do Mundo no Recife acontecerá e as pessoas chegarão sem problemas à Arena para assistir aos cinco jogos no Recife. Esse é o discurso do poder público. A Secretaria das Cidades, agora sob comando de Evandro Avelar, foi a única representante do governo a falar sobre os caminhos para a Copa. É verdade que pouco acrescentou, com a desculpa de estar limitado pelo pacto acordado de anunciar o plano de mobilidade somente na próxima semana, quando completam 30 dias para a Copa do Mundo. Mas ao menos conversou com o JC. A Secretaria Estadual da Copa (Secopa), comandada por Ricardo Leitão, sequer deu retorno à demanda de entrevista enviada à assessoria de imprensa, a Exclusiva BR. “Falaremos no momento oportuno. O plano de mobilidade está fechado e será apresentado à população. Teremos várias alternativas para levar as pessoas à Arena. Vamos deixar tudo limpinho e arrumadinho”, garantiu o secretário. A CBTU, responsável pelo metrô, negou o acesso da equipe ao sistema, mas depois informou já ter o esquema montado para o transporte das 25 mil pessoas estimadas para chegar à Arena de metrô. Catorze trens saírão do Recife com destino à Camaragibe. Quem for para Jaboatão terá que fazer transferência na estação Coqueiral.  

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