Como se não bastasse as mortes no trânsito, que aumentaram 23% em 2017, os casos de mortes por poluição também cresceram. Foto: Bobby Fabisak/JC Imagem
Em pleno mês escolhido para criação do Maio Amarelo, movimento que busca despertar o alerta para a violência no trânsito, as mortes nas avenidas e estradas brasileiras voltam a crescer. Estamos matando ainda mais ao volante. O número de óbitos cresceu 23% comparando 2017 com 2016. Se há dois anos foram 33.547 casos, ano passado o total de mortes chegou a 41.151 pessoas, segundo relatório do DPVAT, o seguro obrigatório de veículos, pago por todos os motoristas brasileiros. E, o que é pior: após uma sequência de cinco anos de redução na letalidade das colisões de trânsito. Um crescimento que não só assusta, mas que deve servir de alerta para o poder público e suas ações.
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No trânsito, é preciso ter medo do acidente, da morte, da mutilação. Campanha do SJCC aborda o tema
Principalmente no momento em que o Senado analisa o Projeto de Lei 426, apresentado ainda em 2012, que pretende destinar 30% da arrecadação com multas de trânsito para o Sistema Único de Saúde (SUS), como se já não bastasse o envio de 50% do DPVAT, que totalizaram, em 2014, R$ 4,4 bilhões. Não é à toa que muitas entidades do setor de mobilidade têm se posicionado contra o PL por entender que, ao fazer isso, estaremos remediando os estragos provocados pela violência no trânsito no lugar de preveni-los, já que iremos reduzir ainda mais o escasso recurso investido em fiscalização, sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento e educação.
O crescimento da letalidade no trânsito teve, ainda, outra face cruel. A liderança, mais uma vez, das motocicletas, é resultado direto da crise econômica. Os dados do DPVAT mostram que, na recessão econômica evidenciada de 2016 para 2017, o volume de automóveis nas ruas diminuiu como sempre acontece nas crises. E, por isso, muitas pessoas trocaram o automóvel e até o transporte público pela motocicleta, que embora seja mais barata, é o mais letal de todos os veículos porque assemelha-se a um atropelamento com o agravante da velocidade. O condutor está tão desprotegido quanto um pedestre e ainda desenvolvendo – na maioria dos casos – altas velocidades.
Os números comprovam essa constatação: ao longo de 2017, mais de 74% dos acidentes envolveram motocicletas (que historicamente sempre tiveram um percentual altíssimo nas estatísticas de mortes, principalmente no Norte e Nordeste), com 59% dos acidentados sendo os próprios condutores. Além disso, 90,5% das vítimas do trânsito estavam na fase economicamente ativa, o que gerou outro dado assustador: a violência no trânsito provocou um impacto econômico de R$ 199 bilhões no ano passado, o equivalente a 3,04% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Esse valor corresponde ao que as vítimas teriam gerado se estivessem trabalhando e está embasado no Valor Estatístico da Vida (VEV), fator que mede a perda da capacidade produtiva, ou seja, quanto cada brasileiro é capaz de produzir enquanto vivo.
Mais uma vez, as maiores variações observadas nos acidentes de 2017, em comparação com 2016, foram no Nordeste e no Centro-Oeste, com alta de 30% no número de casos fatais ou com invalidez permanente. A Região Sudeste apresentou um crescimento de 23%, com destaque para os Estados do Rio de Janeiro (34%) e São Paulo (20%).
Foto: Diego Nigro/JC Imagem
REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFE
Na Região Metropolitana do Recife, uma das unidades que mais atende vítimas de colisões de trânsito, o Hospital Miguel Arraes, também contabilizou um aumento nos atendimentos. Enquanto o hospital recebeu 564 pacientes entre janeiro e abril deste ano, em 2017 foram 509 atendimentos (55 a menos). E a motocicleta, como esperado, continuou sendo o principal veículo envolvido – 72,2% das vítimas estavam em motos. São as motocicletas, inclusive, que respondem por quase 50% das internações de acidentados no trânsito. Só lembrando que, segundo dados médicos, nos acidentes envolvendo motocicletas os membros inferiores são atingidos em 46% dos casos e em 77% ocorrem fraturas. Ou seja, o período de internação hospitalar é longo e, consequentemente, a recuperação é difícil.
POLUIÇÃO QUE MATA
Como se não bastassem as mazelas provocadas pela imprudência e irresponsabilidade, o trânsito ainda provoca outros males. O mais recente relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) – divulgado no início do mês – apontou que a poluição do ar foi responsável, em 2016, pela morte de 51.826 pessoas no Brasil. O levantamento leva em conta a exposição das pessoas aos materiais particulados, classificados em MP 2,5 (2,5 microgramas por metro cúbico) e MP 10 (10 microgramas por metro cúbico). No mundo, por ano, a poluição matou 7 milhões de pessoas em 2016.
As queimais que ocorrem nos canaviais e as atividades industriais são apontadas como causas deste quadro. Mas a mobilidade urbana também é considerada pela OMS como um fator relacionado ao combate à poluição e melhoria de qualidade de vida. Entre as recomendações, que valem mundialmente, estão o incentivo ao transporte coletivo, em especial aos que utilizem energias não dependentes do petróleo ou de queimas de plantações, como redes metroferroviárias, frotas de ônibus elétricos e trólebus, e a ampliação dos deslocamentos não motorizados (a pé e por bicicletas). Por isso é preciso investir em calçadas e ciclovias.