MULTAS DE TRÂNSITO: comissão da OAB PE critica morosidade do governo de Pernambuco em nomear as JARIs de trânsito
No entendimento da OAB, a morosidade do Estado estimula a impunidade no trânsito
A demora do governo de Pernambuco em nomear os membros das Juntas Administrativas de Recursos de Infrações (JARIs), que analisam os questionamentos das multas de trânsito no Estado, foi criticada pela Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco (OAB-PE). A Comissão de Direito de Trânsito da instituição avaliou que a morosidade representa uma violação de direitos constitucionais da população.
“É uma patente violação ao direito do cidadão de ter a justa apreciação de sua defesa no menor tempo possível, de modo a prestigiar inclusive, o princípio da eficiência e razoável duração do processo”, diz a presidente da comissão, Cecília Ribeiro.
No entendimento da OAB, a morosidade do Estado estimula a impunidade no trânsito. “Provoca a sensação de impunidade na aplicação das penalidades impostas pelos órgãos e entidades de trânsito, uma vez que o Estado tem um lapso temporal previsto em lei para o julgamento dos processos administrativos de trânsito, e o descumprimento desse prazo acarreta o que chamamos de decadência do direto de punir, ou seja, o Estado, não poderá mais aplicar a penalidade e o processo automaticamente será arquivado”, destaca.
E segue cobrando: “Nesse sentido, é imprescindível que alguma atitude seja tomada com a máxima urgência. Primeiro, para preservar o direito do cidadão à ampla defesa, contraditório e devido processo legal, previstos constitucionalmente. Segundo, para garantir a devida eficiência, segurança jurídica e transparência que se espera de todo ato da Administração Pública”.
GOVERNO DEIXOU AS CINCO JARIS DO ESTADO SEM MEMBROS E, POR ISSO, PARADAS
O governo de Pernambuco está estimulando a impunidade no trânsito. Todas as instâncias oficiais de análise de recursos de infrações de trânsito ficaram paradas por quase um ano no Estado devido à desconfiança e inabilidade administrativa da nova gestão. Estavam paradas, inclusive, até esta sexta-feira (24/11), quando parte delas teve os membros nomeados pelo governo.
Segundo denúncias feitas ao JC, mais de 14 mil recursos de infrações de trânsito estão parados em Pernambuco porque, além da ausência de infraestrutura alimentada por várias gestões, o Estado - mesmo após quase um ano do novo governo - não nomeou os membros das Juntas Administrativas de Recursos de Infrações (JARIs), responsáveis por lei (Código de Trânsito Brasileiro) para deferir ou indeferir os recursos movidos pelos motoristas e motociclistas que cometem infração.
A consequência disso? Provavelmente, a maioria dos recursos que aguardam análise vão prescrever e os condutores infratores ficarão impunes. Isso porque as estruturas das JARIs já são pequenas e a quantidade de unidades é pouca. E com o acumulado dos recursos apresentados nos últimos meses, a demanda está gigante.
NÚMERO DE JARIS JÁ É PEQUENO PARA A DEMANDA DE RECURSOS
O caso diz respeito às três juntas do Departamento Estadual de Trânsito (Detran-PE) e às duas do Departamento de Estradas de Rodagem (DER-PE), que estavam sem membros oficializados desde os meses de outubro de 2022 e agosto deste ano. Além do Conselho Estadual de Trânsito (Cetran), segunda instância recursal do Estado, que também segue sem nomeação.
Na verdade, o Estado reativou as duas JARIs do DER e uma do Detran, em atos publicados no Diário Oficial desta sexta, mas falta publicar os atos das outras duas do Detran. Das três JARIs, apenas uma está regular.
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A paralisação das JARIs afeta os recursos relacionados às infrações de competência do Estado, que são as relacionadas ao condutor (como habilitação e alcoolemia ao volante, por exemplo) e ao veículo (licenciamento, equipamentos obrigatórios, manutenção do veículo, entre outros). Além das infrações de excesso de velocidade, no caso do DER, nas rodovias estaduais.
As JARIs são órgãos colegiados, que integram o Sistema Nacional de Trânsito, responsáveis pelo julgamento dos recursos interpostos contra penalidades aplicadas pelos órgãos e entidades executivos de trânsito ou rodoviários. Ou seja, recebem os questionamentos das multas de trânsito.
MAIS DE 3 MIL RECURSOS POR ANO
No Detran-PE, são uma média de 3 mil recursos registrados somente entre janeiro e setembro de 2023. E um total de mais de 14 mil recursos aguardando julgamento até agora. Já no DER-PE, seriam 3 mil recursos registrados entre 2022 e 2023, sem previsão de análise.
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A dificuldade estaria e permanece entre a Secretaria de Mobilidade e Infraestrutura de Pernambuco (Semobi), que gerencia o Detran-PE e o DE-PE, e a Casa Civil. Os nomes dos novos membros - que seguem critérios legais estabelecidos pelo CTB - já teriam sido indicados ao governo há mais de seis meses, mas mesmo assim a oficialização não avançou.
ESTÍMULO À IMPUNIDADE NO TRÂNSITO E PERDA DE RECEITA PARA O ESTADO
Na denúncia feita ao JC, as pessoas ligadas ao setor alertam para o fato de que a maioria dos recursos que estão parados nas JARIs são relacionados aos casos de alcoolemia (dirigir sob efeito de álcool) e excesso de velocidade (a principal infração cometida no Estado e em todo o País, e que, segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS - responde por 50% das 1,5 milhão de mortes anuais no trânsito no mundo).
E mais: a morosidade da gestão pública também representa perda de receita para o Estado, que deixa de arrecadar recursos com o pagamento das multas resultantes das infrações. Para se ter ideia, a multa de alcoolemia custa quase R$ 3 mil. E as multas por excesso de velocidade podem alcançar valores de até R$ 880, conforme o índice de desrespeito.
“O acúmulo de recursos compromete a imagem da fiscalização de trânsito realizada pelo Estado no que diz respeito à segurança viária em todas as suas formas. De que adianta a fiscalização fazer a sua parte, ser eficiente, se o Estado não consegue punir, de fato, o condutor infrator. É uma falha que desacredita o trabalho de tanta gente para garantir um trânsito mais seguro”, analisa um técnico do setor, em reserva.
PERNAMBUCO NA DIREÇÃO CONTRÁRIA DA LEGISLAÇÃO DE TRÂNSITO
Outro aspecto fundamental da denúncia é que a lentidão do governo de Pernambuco em nomear os membros das JARIs aconteceu quando a legislação de trânsito reduziu o tempo de análise dos recursos.
Mudanças no CTB promovidas em 2021 e que passaram a vigorar em 2022 reduziram o número das fases de defesa dos condutores infratores. Antes, eram seis fases, sendo três etapas para a defesa da multa e outras três para a defesa da suspensão da CNH, quando estiver previsto na infração.
Agora, o processo é concomitante: as três fases correram em paralelo, simultaneamente. A Lei 14.229/2021, que entrou em vigor em 2022, determinou que o prazo máximo para aplicação da penalidade dos infratores agora é de dois anos. Assim, o recurso da penalidade terá que ser julgado em 24 meses pelas JARIs e o Cetran. Antes eram cinco anos.
“Ou seja, o prazo é ainda menor. E o mais grave é que a infraestrutura das JARIs já é pequena para atender à média de 350 a 400 recursos registrados por mês, mesmo com os três membros que cada uma possui (dois indicados pelo governo e um da sociedade civil). Agora imagine com esse acúmulo de recursos”, alerta outro especialista, também em reserva.
“Na verdade, se pensa muito na fiscalização, mas não se olha para a estrutura da punição de fato. Isso é péssimo”, reforça.
MAIS DE 23 MIL MULTAS POR ANO, QUASE 6 MIL SÓ DE ALCOOLEMIA
Para se ter ideia da dimensão do problema, somente a Operação Lei Seca fez mais de 4 mil notificações de alcoolemia em 2022 e já vai em quase 6 mil este ano. Em relação às infrações em geral, somente as operações aplicaram mais de 23 mil multas em cada um dos anos.
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E, como o mesmo destaca, no caso dos recursos de infração não é possível realizar um mutirão, por exemplo, porque os membros das JARIs precisam atender a critérios técnicos previstos no CTB e a remuneração é pouca e limitada - o que reduz ainda mais o interesse. Para se ter ideia, um membro da JARI recebe R$ 80 por reunião, mas com um limite de participação em até oito reuniões por mês. Enquanto que um membro do Cetran recebe R$ 162, com o limite de quatro reuniões por mês.
O JC tentou um posicionamento do governo de Pernambuco, mas não teve retorno. Foi apenas encaminhado à reportagem, pela Semobi, os atos publicados nesta sexta e que reativam apenas três das cinco JARIs. O Detran-PE também não informou o número de recursos parados ou em análises no órgão.
Confira a situação de cada uma das 5 JARIs do Estado
DETRAN-PE (uma das juntas teve os membros nomeados nesta sexta - 24/11)
1ª JARI – Mandatos vencidos desde junho de 2023
ATO GOVERNAMENTAL Nº 2446 – PUBLICADO NO DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO EM 30/06/21 PARA MANDATO DE 2 (DOIS) ANOS;
2ª JARI – Mandatos não estão vencidos, mas membros pediram desligamento da função e não foram substituídos
ATO GOVERNAMENTAL Nº 2612 – PUBLICADO NO DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO EM 28/06/22 PARA MANDATO DE 2 (DOIS) ANOS;
Apesar de estar na validade do mandato, houve pedidos de desligamento de alguns membros em dezembro de 2022, sendo solicitado as substituições, mas sem publicação de novo ato governamental até a presente data, ou seja, sem funcionamento.
3ª JARI – Mandatos vencidos desde junho de 2023
ATO GOVERNAMENTAL Nº 2447 – PUBLICADO NO DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO EM 30/06/21 PARA MANDATO DE 2 (DOIS) ANOS.
DER-PE (As duas juntas tiveram os membros nomeados nesta sexta - 24/11)
1ª JARI – Mandatos vencidos desde maio de 2023
ATOS GOVERNAMENTAIS Nº 3176 e 3177 – PUBLICADOS NO DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO EM 15/09/21 PARA MANDATO DE 2 (DOIS) ANOS, COM EFEITO RETROATIVO A 19 DE MAIO DE 2021;
2ª JARI – Mandatos vencidos desde outubro de 2022
ATOS GOVERNAMENTAIS Nº 2558 e 2559 – PUBLICADOS NO DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO EM 16/10/20 PARA MANDATO DE 2 (DOIS) ANOS.
CETRAN-PE - Mandatos vencidos desde agosto de 2023
ATOS GOVERNAMENTAIS Nº 3147 e 3175 – PUBLICADOS NO DIÁRIO OFICIAL DO ESTADO DE PERNAMBUCO EM 15/09/21 PARA MANDATO DE 2 (DOIS) ANOS, COM EFEITO RETROATIVO A 29 DE AGOSTO DE 2021.
NÚMEROS DA LEI SECA EM PERNAMBUCO
Ano 2022 - Janeiro a Dezembro - Operação Lei Seca/PE
Fiscalização
Número de veículos abordados - 260.520
23.721 Autuações por infração de trânsito geral;
Total de autuações por alcoolemia - 4.203 -,
sendo,
• 83 Crimes;
• 469 Constatações;
• 3.651 Recusas;
4.695 Remoções;
2.485 Blitz realizadas.
Ano 2023 - Janeiro a Novembro - Operação Lei Seca/PE
Fiscalização
Número de veículos abordados - 172.581
22.799 Autuações por infração de trânsito geral;
Total de autuações por alcoolemia - 5.749
Sendo,
• 43 Crimes;
• 305 Constatações;
• 5.401 Recusas;
4.504 Remoções;
2.153 Blitz realizadas.