Romoaldo de Souza

A pergunta da semana na Câmara dos Deputados: tornozeleira eletrônica funciona como roteador de wi-fi?

Leia a coluna Política em Brasília

Romoaldo de Souza
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Romoaldo de Souza
Publicado em 04/03/2023 às 12:07 | Atualizado em 04/03/2023 às 12:38
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Zé Trovão, emergente militante bolsonarista, tornou-se deputado, usando "roteador de wi-fi" - FOTO: Reprodução/Twitter

Estava um grupo de deputados e senadores reunido no Salão Verde da Câmara dos Deputados, anunciando a apresentação de requerimento para criar a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de Janeiro, cada um se espremendo o mais que possível para caber na foto, quando a deputada Carla Zambelli (PL-SP) chamou um assessor e deu ordens para começar a live. Estudo do Laboratório de Pesquisa em Comunicação, Culturas Políticas e Economia (Colab), da Universidade Federal Fluminense, concluiu que a deputada foi a mais citada nas redes sociais na derradeira legislatura (2019 a 2022).

Em 8 de janeiro deste ano, o Salão Verde, espaço de aproximadamente 2 mil metros quadrados, foi dos mais vandalizados pelos manifestantes. Obras de arte foram quebradas, vidraças estilhaçadas, e até o carpete verde teve de ser reconstituído. Talvez por não terem encontrado o banheiro, bolsonaristas fizeram, ali mesmo, algumas de suas necessidades fisiológicas, enquanto rolava o quebra-quebra.

Voltando ao ato político pela CPMI. Encontrando alguma dificuldade tecnológica, a live de Zambelli não começava. Ligaram e desligaram o smartphone, analisaram se o pacote de dados ilimitados estava ativado, checaram se a rede de internet da Câmara estava funcionando. Nada. Foi aí que o colega de partido, Zé Trovão (PL-SC), se aproximou e perguntou se a deputada queria ajuda.

O caminhoneiro Marcos Antonio Pereira Gomes tinha em sua playlist na boleia do caminhão, “modão” do sertanejo raiz, como “Estrada da Vida”, com Milionário e José Rico; “Tristeza do Jeca”, com Tonico e Tinoco. Forró “das antiga” feito “Festa na Roça”, de Mário Zan e “Riacho do Navio”, nas vozes de Luiz Gonzaga e Fagner. Mas uma música não parava de tocar no “Pionner” com tampa removível: “Ana Raio e Zé Trovão”. “Pensar só nos traz alegria. Saber já é outra questão. Somente quando sonha o homem vai ao céu. E o resto é pelo chão. Ana Raio e Zé Trovão”. Vem da novela na extinta Rede Manchete, estrelada por Almir Sater e Ingra Liberato o apelido usado como nome político.

Quase dois metros de altura, chapéu de abas largas, dessas que medem 7cm, Zé Trovão era um emergente manifestante que liderou, em Santa Catarina, a greve dos caminhoneiros, em 2018. Sempre em defesa do voto impresso e pelo impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal. Por incentivo de bolsonaristas catarinenses e do então presidente da República disputou uma cadeira de deputado federal. Ganhou notoriedade em 3 de setembro, quando o ministro do STF, Alexandre de Moraes, decretou sua prisão. Foi eleito em novembro, com mais de 72 mil votos.

Três meses depois de eleito, Zé Trovão adentrou solenemente o plenário da Câmara dos Deputados. Ele usava um terno claro, gravata azul bebe, o inseparável chapéu e uma tornozeleira eletrônica imposta por Alexandre de Moraes. Cantou o Hino Nacional "Mas se ergues da justiça a clava forte. Verás que um filho teu não foge à luta. Nem teme, quem te adora, a própria morte" e jurou cumprir a Constituição Federal. "Prometo manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro e sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil". Na penumbra do plenário, era possível ver a luz piscando. O tornozeleira virou atração.

Vendo Zé Trovão se aproximar, Carla Zambelli sentenciou: “Sai daqui, Zé, você usando esse roteador de wi-fi vai é atrapalhar o meu sinal”. Entre os “patriotas” presos na Papuda - onde ficam os homens - e na Colmeia - onde estão as bolsonaristas que participaram do quebra-quebra de 8 de janeiro, a tornozeleira eletrônica ganhou o apelido de “roteador de wi-fi”. A live de Zambelli era retardada enquanto Zé Trovão pegava o microfone para pregar a “liberdade aos patriotas inocentes”.

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