Em um desses cursos que empresas oferecem, a preço de ouro, aos novos funcionários dos gabinetes de parlamentares que estão chegando a Brasília, um tópico de destaque é sobre o papel dos Três Poderes da República. O material didático não precisava ser mais explícito. No item destinado ao funcionamento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, o zeloso educador destaca que o desequilíbrio é “gritante”. Que “sempre foi assim e dificilmente será diferente.” Na aula virtual, um aluno levanta a mão, em sinal de que está pedindo a palavra e, finalmente, quando chega sua vez o estudante discorre uma série de argumentos que funcionam muito bem na teoria. “Na prática a história é bem diferente”, retrucar o professor.
O novo funcionário, recém saído da universidade, compara o funcionamento dos Poderes a um tripé. Ele se baseia no artigo 2º da Constituição Federal quando aponta que Executivo, Judiciário e Legislativo [aqui eu os descrevo em ordem alfabética] “são poderes da União, independentes e harmônicos entre si” e adverte. “É bom lembrar que a Carta Magna explicita que os Poderes são ‘independentes e harmônicos’”. O aluno lembra que se uma das pernas (do tripé) estiver bamba, se for menor que outra o objeto vai continuar tendo três pernas, mas não haverá nem harmonia nem independência entre elas.
“E então”, resumiu o educador: “aonde você quer chegar com seus argumentos?” Emendas parlamentares, lideranças, interferência do Judiciário nas decisões do Executivo e do Congresso e outros tantos argumentos foram colocados à mesa da conversa virtual. Certamente, sem muita possibilidade de um consenso.
Recorro a uma frase atribuída à ex-primeira ministra britânica Margaret Thatcher (1925 - 2013) para trazer aos dias atuais essas desavenças institucionais, nos Poderes de República. “O consenso é a ausência da liderança”, conforme a “Dama de Ferro”, que exerceu o cargo de 1979 a 1990.
O que teria levado o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a enquadrar seu partido, logo após da disputa de novembro de 2022, para que nem pensasse em articular uma candidatura à Presidência da Câmara? Falta de liderança no seu grupo. Lula, como ninguém - e talvez até por sua própria vontade e responsabilidade - sabe que ao longo dos anos poucas lideranças surgiram no meio político. As mais afoitas tiveram suas pretensões aparadas e sucumbiram ao ostracismo, ainda que temporário.
Logo, antes da troca de presentes do Natal vitorioso dos petistas, Arthur Lira (PP-AL) já tinha sido presenteado, simbolicamente com ouro, incenso e mirra, e o PT nem sequer ensaiou lançar candidatura para à Presidência da Casa. Conteve-se com a 2ª secretaria entregue à deputada Maria do Rosário (RS). O tripé, exaltado pelo aluno do curso, mostrou-se manco. Vitaminado, Lira fortaleceu o centrão e segue ditando as normas, imperioso, em que pese o sistema de governo ser presidencialista. Lira manda e desmanda.
Na falta de lideranças políticas com argumentos consistentes, com diálogo fundamentado e com respaldo para apresentar iniciativas, o Câmara ultrapassa os primeiros 40 dias sem que nenhum projeto de iniciativa do Legislativo tenha sido analisado. As comissões permanentes ainda não foram instaladas, e sem elas, Lira segue dando das cartas com a habilidade de um veterano crupiê. Que falta uma liderança faz!
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