IMPUNIDADE

Menos de 4% das investigações de roubos de veículos são concluídas em Pernambuco

Números obtidos pela coluna Ronda JC revelam que taxa de resolução de crimes no Estado é baixíssima

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Raphael Guerra

Publicado em 28/12/2021 às 6:45 | Atualizado em 11/01/2022 às 9:16
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O desafio da segurança pública não é só desarticular organizações criminosas para evitar os roubos de veículos - que cresceram em Pernambuco pelo sétimo mês consecutivo. Mas também melhorar as técnicas de investigação para conseguir solucionar os casos. A impunidade é altíssima, como revelam os números obtidos com exclusividade pela coluna Ronda JC, com base na Lei de Acesso à Informação (LAI).

No ano de 2019, o Estado contabilizou 19.454 queixas de roubos e furtos de veículos. Mas, até hoje, só 430 investigações foram concluídas. Isso significa que quase 98% dos casos ficaram impunes.

Em 2020, foram 14.252 ocorrências dessa modalidade crime. No total, a Polícia Civil conseguiu encerrar 503 investigações, ou seja, apenas 3,5%. Na prática, 96,5% dos casos de roubos e furtos de veículos não foram solucionados.

Um médico de 30 anos, plantonista do Hospital Barão de Lucena, na Zona Oeste do Recife, é uma das vítimas que faz parte dessas estatísticas. Na noite do dia 23 de julho de 2020, ele deixou o carro no estacionamento da unidade de saúde. Quando concluiu o expediente e voltou ao local, cerca de 12 horas depois, percebeu que os quatro pneus foram furtados. Até hoje, a Polícia Civil não conseguiu esclarecer o caso. 

No Estado, há apenas uma delegacia especializada unicamente na solução de Roubos e Furtos de Veículos - localizada no Recife e sob o comando do delegado Diego Acioli. As outras, as circunscricionais, também investigam essa modalidade do crime. Mas precisam dar conta da solução de outros tipos de crimes - mesmo com baixo efetivo de policiais e excesso de trabalho. Acaba que resta à sociedade, desamparada, tomar suas próprias medidas de segurança, para tentar evitar o roubo. 

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O delegado Diego Acioli, titular da Delegacia de Roubos e Furtos de Veículos, afirmou que a polícia tem trabalhado para prender os criminosos envolvidos com esse tipo de delito. "Ressaltamos que houve um aumento de 50% em relação às prisões, em um comparativo com o ano passado. A delegacia ainda desenvolveu operações de repressão qualificada e operações de intervenção tática visando elucidar crimes e prender criminosos especializados nas práticas destes crimes." O delegado disse que houve veículos roubados ou furtados que foram recuperados ao longo do ano no Estado, mas não citou números.

Diego Acioli destacou ainda a importância de a população procurar a polícia para registrar a queixa desse tipo de crime. "O registro do boletim de ocorrência pode ser realizado em qualquer delegacia no estado, não necessitando o comparecimento da vítima no Depatri (no bairro de Afogados, Zona Oeste do Recife) para o registro. O objetivo é capilarizar o atendimento e o desenvolvimento das investigações. Neste contexto, a investigação dos crimes também é realizada por qualquer delegacia circunscricional", disse.

ANÁLISE

Para a coordenadora do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM) em Pernambuco, e professora da Unicap, Érica Babini, a baixa taxa de resolutividade dos crimes está relacionada a vários fatores. "A gente observa, por exemplo, que em 2020 houve aumento dos CVLIs (Crimes Violentos Letais Intencionais) no Estado, o que leva a crer que houve um esforço maior para combater esse crime e outros podem ter sido deixados de lado. Há, muitas vezes, a opção de se focar mais nos homicídios porque isso lida com a credibilidade da instituição e gera mais repercussão", afirmou.

Érica diz também que há uma falta de investimentos para combater os crimes com mais eficácia. "Os crimes contra o patrimônio são de difícil investigação e demandam uma estrutura investigativa. A polícia não é aparelhada suficientemente. Por outro lado, o crescimento da impunidade gera a avaliação, para quem comete o crime, de que há vantagem em praticá-lo. E os assaltos acabam aumentando", concluiu.

CRESCIMENTO DOS ROUBOS

Desde maio de 2021, houve crescimento das queixas de roubo de veículos quando comparado com o mesmo período de 2020. A Polícia Civil alega que, apesar disso, também houve mais prisões de suspeitos.

De acordo com as estatísticas da Secretaria de Defesa Social (SDS), 8.704 queixas foram registradas nas delegacias entre janeiro e novembro de 2021. No mesmo período de 2020, foram 8.702. Praticamente o mesmo resultado, mas a diferença surge justamente nos períodos do ano.

A partir da análise dos números mês a mês, há preocupação. Afinal, a curva atual de casos se mostra ascendente. Importante destacar que nos primeiros meses deste ano, o Estado vivia com medidas duras de restrição por causa da pandemia da covid-19 - diminuindo a circulação de pessoas e veículos nas ruas. As ocorrências de roubos estavam mais baixas. Aos poucos, houve a flexibilização das atividades econômicas, impulsionando a volta à rotina. E os números de queixas subiram.

Essa lógica também é observada quando são analisados os números registrados em 2020. Os meses com mais casos são os primeiros daquele ano: janeiro a março, ou seja, anteriores à descoberta da pandemia da covid-19. A partir de abril, quando houve a aceleração dos casos e mortes confirmados pela doença, o governo do Estado foi mais duro nas medidas restritivas e a circulação de veículos também despencou (o home office foi adotado amplamente em 2020) - ao mesmo tempo, houve a queda dos roubos.

As estatísticas da SDS também mostram que cinco municípios concentraram 42,25% das ocorrências de roubos de veículos em Pernambuco neste ano. O Recife liderou com 1.885 casos, seguido de Jaboatão dos Guararapes (555), Caruaru (528), Olinda (411) e Paulista (299). Interessante notar que uma cidade do Agreste aparece na lista. Os dados contribuem para o mapeamento da polícia.

 

 


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