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Covid-19: capacidade de reinfecção por nova variante traz preocupação sobre maior disseminação do coronavírus

Pesquisadores ouvidos pelo JC explicam por que as modificações do novo coronavírus podem agravar ainda mais a pandemia

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Cinthya Leite

Publicado em 01/02/2021 às 15:39 | Atualizado em 01/02/2021 às 15:51
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Desde que foi detectado há um ano, na cidade de Wuhan (China), o novo coronavírus já mudou bastante e, com isso, o código genético que carrega tem sido alterado. Segundo a Organização Pan-americana da Saúde (Opas), três variantes do vírus, detectadas inicialmente no Reino Unido, África do Sul e Brasil, já foram encontradas em 14 países das Américas. Uma dessas novas cepas, batizada de P.1, foi identificada em janeiro em pessoas que desembarcaram em Tóquio (Japão), após passagem pelo o Amazonas. E é essa variante que tem despertado um leque de preocupações em pesquisadores e autoridades sanitárias ao redor do planeta. "As mutações dos vírus respiratórios são esperadas. É uma forma de eles se adaptarem ao hospedeiro. Estudos mostram que algumas variantes trazem alteração de genes que as tornam mais contagiosas", explica o médico Paulo Sérgio Ramos, chefe do Serviço de Doenças Infecciosas e Parasitárias do Hospital das Clínicas (HC) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Também pesquisador da Fiocruz no Estado, ele chama a atenção para o fato de que, ao passo que as variantes se tornam mais contagiosas, elas atingirão mais pessoas e consequentemente se aumenta a proporção da pandemia de covid-19. "Elas farão mais pessoas doentes e proporcionalmemte haverá maior número de mortes. Não se sabe ainda, contudo, se a variante em si aumenta diretamente o risco de gravidade da covid-19 ou de óbito."

Segundo informou a Opas, na quinta-feira (28), as pessoas infectadas com a cepa britânica "têm um risco maior de morrer do que as pessoas infectadas com outras variantes". Já em relação à variante sul-africana, a Opas indicou que estudos preliminares sugerem que ela está associada "a uma carga viral mais elevada, o que poderia sugerir uma potencial maior transmissibilidade". Além disso, a organização internacional destacou que essas mutações "levantou preocupação sobre a possível maior disseminação e gravidade dos casos de covid-19 na região das Américas". Sobre a cepa do Amazonas, autoridades da Opas alegam que ainda é cedo para tirar conclusões.

Para o infectologista Paulo Sérgio Ramos, a variante do Amazonas tem habilidade de fugir aos mecanismos de reconhecimento dos anticorpos contra o vírus. "Teoricamente uma pessoa infectada por uma dessa variante teria maior risco de se reinfectar, até mais precocemente do que na cepa original, sobre a qual estudos mostram que, quando ocorria a reinfecção, era num período de três a seis meses", diz o médico. Ele acrescenta que se acredita na possibilidade de as pessoas se reinfectarem mais precocemente com essa nova variante (do Amazonas). "Isso pode ser explicado pela forma que o vírus tem de escapar ao mecanismo de imunidade humoral, aos anticorpos."

Em Pernambuco, segundo o secretário Estadual de Saúde, André Longo, ainda não foram identificadas novas linhagens do vírus. "Em parceria com o Instituto Aggeu Magalhães (unidade da Fiocruz em Pernambuco), estamos fazendo o sequenciamento genético, e a expectativa é que, nos próximos dias, possamos ter resultado", informa Longo. Para controlar as modificações do coronavírus que podem agravar a pandemia, ou tornar as vacinas menos eficazes, o genoma precisa ser sequenciado. "Recebemos amostras na quarta-feira (27) à tarde para o sequenciamento, o que começará a ser feito na próxima semana. É uma espécie de vigilância; estamos na eminência de descobrir essa variante em diferentes pontos do Brasil, já que as fronteiras estão abertas e os pacientes (de Manaus, infectados com nova cepa do coronavírus) estão sendo transferidos (para Pernambuco e outros Estados)", ressalta o biomédico Marcelo Paiva, pesquisador colaborador da Fiocruz Pernambuco e professor da UFPE.

Ele destaca que, como a P.1 tem sido dominante no Amazonas, detectada em mais de 90% dos doentes, certamente a cepa será encontrada em mais Estados. A preocupação com essa linhagem do vírus, segundo Marcelo, é imensa. "Ela preocupa pelo ponto de vista científico e pela questão da saúde pública. É uma variante que aumenta a transmissão (do vírus) em até 70%, e isso em meio a um quadro altíssimo de casos e mortes que a gente vem vivenciando diariamente. Isso é desesperador. Começamos a ver as coisas acontecendo no Norte, e precisamos sempre olhar um pouco para o lado da gente também", sublinha o pesquisador, ao frisar que autoridades de demais regiões devem adotar monitoramento e medidas para se evitar uma minipandemia dentro da pandemia que já é extremamente grave.

Na visão de Paulo Sérgio, novas cepas fazem o controle da covid-19, no Brasil, tornar-se mais complexo. "Não se sabe dizer se isso impacta numa menor eficácia das vacinas. Mas, à medida em que a campanha de imunização tem ocorrido de forma lenta, a gente pode perder o controle da pandemia. Uma das hipóteses é que isso possa estar ocorrendo em Manaus: um misto da falta dos mecanismos de contingência, como distanciamento social, com uma explosão de casos associados à nova variante", salienta o infectologista.

 

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