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Em spray nasal, vacina brasileira contra covid-19 entra com pedido à Anvisa para testes em humanos

Pesquisa, liderada por médicos da USP, mostrou que animais imunizados com a vacina em spray nasal tiveram altos níveis de anticorpos

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Cinthya Leite

Publicado em 22/10/2021 às 9:55 | Atualizado em 22/10/2021 às 10:11
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O Instituto do Coração do Hospital das Clínicas (InCor) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) deu entrada, na quinta-feira (21), no pedido de autorização à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para início dos estudos clínicos fases 1 e 2 da vacina contra a covid-19 administrada em spray nasal. O desenvolvimento brasileiro é inédito no mundo não apenas pela sua forma de administração pelas narinas, mas também pelos componentes derivados do vírus que ele utiliza para a imunização e pelo veículo que os transporta (nanopartículas).

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As pesquisas experimentais, realizadas até agora, mostram que os animais imunizados com a vacina do InCor apresentam altos níveis de anticorpos IgA e IgG, além de uma resposta celular protetora. "Estamos esperançosos nos resultados clínicos desta vacina em spray, pois todos os testes que nos propomos a fazer têm nos mostrados importantes conquistas no combate ao vírus", diz o pesquisador-chefe do estudo, Jorge Kalil, diretor do Laboratório de Imunologia do InCor e professor Titular da FMUSP.

O objetivo é que os testes sejam iniciados em janeiro de 2022. O estudo contará com 280 participantes distribuídos em sete grupos - seis deles tomarão doses diferentes entre si, para testar a melhor dosagem, e o último receberá apenas placebo . As duas primeiras fases dessa etapa clínica terão duração de até três meses e contemplarão a análise de segurança, a resposta imune e o esquema vacinal (dose) mais adequado.

REPRODUÇÃO/INCOR-USP
A proteína vacinal é inserida em nanopartículas capazes de atravessar a barreira de cílios e muco presentes no nariz, chegando às células - REPRODUÇÃO/INCOR-USP

O imunizante contra covid-19 desenvolvido pelo Laboratório de Imunologia do InCor conta com a parceria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e das seguintes unidades da USP: FM (Faculdade de Medicina), Instituto de Ciências Biomédica (ICB) e FCF (Faculdade de Ciências Farmacêuticas).

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De acordo com Kalil, o modelo em formato de spray de aspiração nasal visa combater o coronavírus no local mais importante da infecção, as vias aéreas. "O vírus entra no organismo pelo nariz infectando a mucosa. O nosso foco é criar uma vacina que atue diretamente no sistema respiratório, fortalecendo a resposta imune de toda essa região, de forma a evitar a cadeia de infecção do indivíduo, desenvolvimento da doença e transmissão para outras pessoas", explica. 

Diferentemente das vacinas atuais, que usam a proteína spike para induzir a resposta imune do organismo, a vacina do InCor utiliza peptídios sequenciais (biomoléculas formadas pela ligação de dois ou mais aminoácidos) derivados de proteínas que compõe o vírus. Para fazer a administração pelas vias aéreas superiores, os pesquisadores desenvolveram uma formulação também inédita. A proteína vacinal é inserida em nanopartículas capazes de atravessar a barreira de cílios e muco presentes no nariz, chegando às células.

O mecanismo, diz Kalil, tem se mostrado capaz de aumentar o nível de imunoglobulinas A, anticorpos que são os grandes defensores das mucosas, e também potencializar a resposta celular local, elevando sua proteção.

"O coronavírus vai persistir na sociedade. Sabe-se que as vacinas atualmente em uso não garantem a proteção por longos períodos, sendo necessário um reforço vacinal. Como a maioria da população brasileira está imunizada, iremos recrutar voluntários já vacinados contra covid-19 e, com isso, poderemos analisar o efeito de potencializar a resposta imune", esclarece.

Entenda a pesquisa da vacina contra a covid-19 administrada em spray nasal

Kalil conta que, logo no início da pandemia, o grupo resolveu desenvolver uma vacina que fosse uma alternativa ao que estava sendo desenvolvido no exterior e que fosse um projeto essencialmente brasileiro com completa autonomia de ação. "Graças ao financiamento do MCTI (Ministério da Ciência Tecnologia e Inovações), através da Rede Vírus, congregamos cientistas de nosso laboratório com larga experiência na área de vacinas (Edecio Cunha Neto, Keity Santos e Verônica Coelho), associados à Dra. Silvia Boscadin e o Dr Edison Durigon (ICB-USP), além do Dr. Marco Antônio Stephano, da FCF. Foi incorporada também, no grupo, a Dra. Daniela Santoro. Agora, na fase dos ensaios clínicos, contaremos com a ajuda do Dr. Pedro Giavina-Bianchi."

Em volta desses pesquisadores no núcleo central do projeto, agregam-se hoje mais de 30 especialistas, entre cientistas sêniores e alunos de pós-doutorado e pós-graduação, que se dividem nas múltiplas tarefas do complexo desenvolvimento de uma nova vacina. "Para chegar aos parâmetros de proteção contra a covid-19 que balizaram o modelo da vacina, nós contamos com o estudo da resposta imune de proteção de 220 voluntários convalescentes da doença, ao longo do primeiro semestre de 2020", diz Kalil.

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