ARBOVIROSES

Risco de morte por chicungunha continua até três meses do início da crise, mostra estudo

"Estudo reforça a hipótese de que a chicungunha é a mais grave das arboviroses", diz Carlos Brito, professor de UFPE que participou do estudo

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Cinthya Leite

Publicado em 15/02/2024 às 17:07 | Atualizado em 16/02/2024 às 12:30
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O risco de óbito após a fase aguda da chicungunha (primeiros 14 dias de doença) permanece até três meses do início dos sintomas. É o que mostra um estudo publicado este mês na revista científica The Lancet Infectious Diseases

A pesquisa utilizou uma amostra da população brasileira entre 2015 e 2018 para investigar a chance de morte de pessoas infectadas pelo vírus chicungunha, responsável por grandes epidemias nos anos de 2015 e 2016 em Estados como Pernambuco e Bahia. 

Os principais sintomas da infecção por chicungunha são edema e dor articular incapacitante. Também podem ocorrer manifestações extra articulares. Os casos graves de chicungunha podem demandar internação hospitalar e evoluir para óbito.

Liderado por pesquisadores do Centro de Integração de Dados para Conhecimentos em Saúde (Cidacs) e do Laboratório de Medicina e Saúde Pública de Precisão (MeSP2), ambos da Fiocruz Bahia, o estudo comparou o risco de morte em pessoas com a doença causada pelo vírus chicungunha com aquelas sem a doença.

O grupo de pesquisa, do qual fez parte o médico pernambucano Carlos Brito, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), chegou à conclusão de que há um risco aumentado de morte para até 84 dias após os primeiros sintomas da infecção.

"O estudo reforça a hipótese que levantamos de que a chicungunha é a mais grave das arboviroses", diz Carlos Brito. 

Em 2016, ele levantou a hipótese, no Brasil, que o risco alto de morte por chicungunha não estava sendo percebido. "Desde aquele ano, já considerávamos a doença mais do que uma doença articular grave. Outros colegas e autores começaram a identificar essas manifestações graves, e as evidências foram se acumulando", acrescenta.

O estudo publicado no The Lancet Infectious Diseases revelou que, entre o 1º e o 7º dia de infecção, as pessoas tiveram um risco 8,4 vezes maior de morte, em comparação com as que não foram infectadas.

Do 57º ao 84º dia após os primeiros sintomas de chicungunha, o risco diminuiu para 2,26 vezes maior que as pessoas sem a doença. Após, o risco se aproximou de 1 - ou seja, não houve diferença significativa no risco de morte entre os grupos expostos e não expostos após o 84º dia do quadro inicial da chicungunha. 

 

SÉRGIO BERNARDO/ACERVO JC IMAGEM
"A chicungunha é mais do que uma doença articular grave", reforça o clínico-geral Carlos Brito, professor da UFPE - SÉRGIO BERNARDO/ACERVO JC IMAGEM

Na análise do estudo publicado no The Lancet Infectious Diseases e dos dados disponíveis, em um cenário com 100 mil pessoas doentes, são esperadas cerca de 170 mortes a mais nos primeiros 84 dias, em relação a um cenário sem a doença.

Quando foram consideradas as causas específicas de morte das pessoas infectadas pelo vírus da chicungunha, foi observada maior mortalidade associada a diabetes e à doença cardíaca isquêmica até os primeiros 28 dias. Essa associação permaneceu significativamente elevada até 84 dias para doença cardíaca isquêmica e até 168 dias para diabetes.

O estudo vinculou dados sobre notificações e análises laboratoriais de desfechos para chicungunha, dengue e zika. Para a pesquisa, foram utilizados apenas os dados de pessoas infectadas por chicungunha. Foram usados dados do período de 1º de janeiro de 2015 a 31 de dezembro de 2018.

Dois métodos foram usados: o primeiro de coorte retrospectiva, a fim de comparar o risco de morte entre pessoas expostas ao vírus e as não expostas ao longo de um período de até dois anos após a infecção.

Já o segundo método, de série de casos autocontrolada, seguindo a mesma temporalidade de análise do método anterior, incluiu apenas as pessoas que morreram após terem a doença, comparando o risco de morte em diferentes períodos em relação a data dos primeiros sintomas.

Foram incluídos na pesquisa 143.787 casos de chicungunha de 2015 a 2018. Entre eles, 1.933 foram a óbito algum período após a doença. Foram dois os desfechos de mortalidade: o primário, por causa natural; e o secundário, relacionado às mortes associadas a causas específicas, incluindo doenças cardíacas isquêmicas - àquelas que afetam as artérias e impedem a passagem do sangue, de oxigênio e nutrientes necessários -, diabetes e doenças cerebrovasculares.

O estudo utilizou dados da coorte de 100 milhões de brasileiros, inovação científica que inclui dados de mais de 130 milhões de brasileiros do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico). Para esse estudo, foram vinculados dados do CadÚnico aos dados do Sistema Nacional de Informação sobre Doenças de Notificação Notificável (Sinan) e Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM).

CHICUNGUNHA NO BRASIL

No Brasil, até o momento, o vetor envolvido na transmissão do vírus chicungunha é o Aedes aegypti.

O vírus chicungunha foi introduzido no continente americano em 2013 e ocasionou uma importante epidemia em diversos países da América Central e ilhas do Caribe.

No segundo semestre de 2014, o Brasil confirmou, por métodos laboratoriais, a presença da doença nos Estados do Amapá e Bahia. Atualmente, todas os Estados registram transmissão da chicungunha.

No ano de 2023, ocorreu importante dispersão territorial do vírus no Brasil, principalmente para Estados da Região Sudeste. Anteriormente, as maiores incidências de chicungunha observadas no Brasil concentravam-se na região Nordeste.

SINTOMAS DA CHICUNGUNHA

A chicungunha geralmente aparece com febre de início súbito, acompanhada de artralgia ou artrite intensa (dor nas articulações) que surge de forma repentina.

Os principais sintomas da infecção por chicungunha são edema e dor articular incapacitante. Também podem ocorrer manifestações extra articulares. Os casos graves de chicungunha podem demandar internação hospitalar e evoluir para óbito.

O vírus chicungunha também pode causar doença neuroinvasiva, que é caracterizada por doenças neurológicas como encefalite, mielite, meningoencefalite, síndrome de Guillain-Barré, síndrome cerebelar, paresias, paralisias e neuropatias.

A chicungunha pode evoluir em três fases:

  • Febril ou aguda: tem duração de 5 a 14 dias
  • Pós-aguda: tem um curso de 15 a 90 dias
  • Crônica: Se os sintomas persistirem por mais de 90 dias após o início dos sintomas, considera-se instalada a fase crônica. Em mais de 50% dos casos, a artralgia (dor nas articulações) torna-se crônica e pode persistir por anos 

Há possibilidade de a infecção por chicungunha levar a problemas cardiovasculares e renais.  

“A matéria apresentada neste portal tem caráter informativo e não deve ser considerada como aconselhamento médico. Para obter informações fornecidas sobre qualquer condição médica, tratamento ou preocupação de saúde, é essencial consultar um médico especializado.”

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