O prazo de oito meses dado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para que 70% dos presos fossem tirados do Complexo Prisional do Curado, na Zona Oeste do Recife, chegou ao fim. Mas a meta não foi atingida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE).
A determinação foi feita há oito meses, logo após visita da então corregedora Nacional de Justiça, Maria Thereza de Assis Moura, junto a uma comitiva do CNJ, que confirmou o cenário de superlotação, precariedade e até "favelização" nos três presídios que compõem o Complexo Prisional do Curado.
No dia da visita, no final de agosto de 2022, havia 6.509 detentos cumprindo penas ou aguardando julgamento nos presídios. A capacidade, no entanto, era de 1.819.
Atualmente, segundo a Secretaria Executiva de Ressocialização (Seres), o número foi reduzido para 3.342, ou seja, uma queda de 49,7%. O Complexo, portanto, segue superlotado.
Por meio de nota, o TJPE informou as "ações para melhorar as condições dos presos se tornaram uma prioridade desde a criação do Gabinete de Crise" e que a redução foi possível por meio "de alvará de soltura, livramento condicional, progressão para regime aberto, progressão para regime semi-aberto ou foram transferidos".
Também pontuou que "vêm conseguindo atingir seu objetivo de atender o que foi determinado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) ao Estado brasileiro".
Por decisão da Corte, referendada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, a Justiça está aplicando o "cômputo em dobro" das penas dos presos que já estão no Complexo do Curado. Isso significa que cada dia em que o detento permanece em um dos três presídios será contado em dobro - reduzindo o tempo de permanência dele no regime fechado.
De agosto de 2022 para cá nenhum preso foi encaminhado ao Curado. Segundo o TJPE, além dos juízes das Varas Criminais de Pernambuco, existem mais 15 magistrados atuando para agilizar os processos de réus presos e dar maior celeridade aos julgamentos.
CENÁRIO DE CAOS AO COMPLEXO DO CURADO
A visita da comitiva do CNJ às unidades prisionais do Complexo Prisional do Curado foi considerada estarrecedora, por causa das condições desumanas em que vivem os presos e pelo estado de favelização.
No Presídio Juiz Antônio Luiz Lins de Barros, foram encontrados problemas estruturais e falta de higiene por toda a parte. Sem quartos, detentos improvisaram buracos para dormir. Para ter acesso, eles têm que rastejar. Os presos também são forçados a dormir no chão por falta de celas, abrigados da chuva por pedaços de lona.
Na decisão que determinou a redução de detentos no Complexo do Curado, a então corregedora Nacional de Justiça, Maria Thereza de Assis Moura, destacou que há um "mercado paralelo" nos três presídios.
"A falta de água potável e de alimentação adequada e em quantidade suficiente enseja a ostensiva comercialização, por parte das próprias pessoas presas, de insumos de sobrevivência básica, vendidos em 'cantinas', com preços abusivos", declarou, em documento entregue ao TJPE, na ocasião.
Procurada nessa terça-feira (2), a assessoria do CNJ pontuou que, no mês passado, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e da entidade, ministra Rosa Weber, visitou o Complexo do Curado para verificar os avanços e as melhorias no sistema prisional, a partir das medidas impostas.
Em reunião com representantes do Poder Judiciário pernambucano, a ministra reforçou a necessidade de medidas para garantir o direito das pessoas que estão privadas de liberdade.
MEDIDAS ADOTADAS PELO GOVERNO DE PERNAMBUCO
Sobre a situação do Complexo do Curado, a Seres informou que "uma seleção pública simplificada foi concluída e contratou 113 profissionais (22 psicólogos, 27 assistentes sociais, 6 advogados, 32 assistentes de ressocialização, 18 analistas de monitoramento, 6 técnicos de informática, 3 analistas de sistema, 02 engenheiros civis e 2 arquitetos) para fortalecer o processo de reestruturação" dos três presídios.
Reforçou ainda que pelo menos 954 novas vagas estão sendo criadas com a obra do Presídio Frei Damião de Bozzano, um dos presídios que faz parte do Complexo.
CORTE CONDENOU ESTADO BRASILEIRO
A situação desumana no Complexo do Curado é antiga e sempre foi de conhecimento de todos dos poderes de Pernambuco. Tanto que, em 2011, a integrante do Conselho da Comunidade da 3ª Vara de Execuções Penais da Capital e coordenadora do Comitê Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, Wilma de Melo, precisou denunciar o Estado brasileiro à Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Naquele ano, quando foi editada a primeira medida cautelar, a população carcerária se aproximava de 5 mil pessoas. Uma década depois, apesar de a Corte ter proibido a entrada de novas pessoas, o número de detentos no Complexo continuou a crescer, sem melhorias da estrutura.
O País foi condenado pela Corte IDH e, por isso, o CNJ foi obrigado a fiscalizar e cobrar com rigor melhorias nas condições de sobrevivência dos presos.