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XP mostra que inovação tem vida curta quando lucro vem antes do cliente

Hoje, a situação é bem diferente do que as campanhas publicitárias na TV dizem e a concorrência deixa evidente os crescentes problemas da XP

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Guilherme Ravache

Publicado em 09/03/2022 às 10:31
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Responda rápido: que banco neste momento é melhor avaliado pelos usuários, Itaú ou XP? Se você respondeu que a XP lidera, errou. No site Reclame Aqui, que reúne reclamações dos clientes, a XP tem uma nota de 7.6, contra 7.8 do Itaú Unibanco.

Se você não acertou a resposta, é compreensível. A XP se tornou uma gigante ao entrar no mercado com o discurso de ser uma alternativa melhor que os bancos tradicionais. Hoje, tem mais de R$ 715 bilhões em custódia. E por alguns anos isso foi realidade. A plataforma digital da XP foi a melhor do mercado e seu atendimento era impecável.

Hoje, a situação é bem diferente do que as campanhas publicitárias na TV dizem e a concorrência deixa evidente os crescentes problemas da XP.

Nubank pode ser a nova XP

Uma pesquisa de consumidores de cartões de crédito e investimentos do UBS Evidence Lab, divulgada na segunda-feira, mostrou que o Nubank pode estar conquistando a posição que já foi da XP no país.

O Nu Invest, apesar de menos de um ano no mercado, já alcançou 27% de participação entre plataformas independentes de investimentos. A XP continua a liderar o segmento, com participação de 50%, mas levou mais de 20 anos para conquistar a posição.

O relatório diz ainda que a maioria dos clientes da XP também tem conta no Nubank, o que tornaria mais fácil a fuga de clientes da XP para o Nubank. Pela mesma lógica, clientes do Nubank também poderiam migrar para a XP se ela aumentasse a oferta de serviços bancários.

Mas essas chances da XP virar esse jogo estão cada vez mais distantes, ao menos é o que indica minha recente experiência pessoal.

XP, uma empresa de robôs

Se você, como eu, é cliente da XP e tentou resolver algum problema por meio do atendimento da empresa, há boas chances de ter caído em um interminável labirinto de robôs. Falar com um humano no call center? Mais fácil Guilherme Benchimol, o bilionário fundador da XP e atual CEO, responder um comentário seu no LinkedIn.

A lógica é tentadora. Robôs são baratos. Trabalhadores humanos são caros, já que dormem e têm benefícios trabalhistas. O problema é que a automatização do call center notoriamente degrada a experiência do consumidor. Se existe alguma pessoa no atendimento da XP, confesso não ter tido o prazer de encontrar, apesar de torcer (e esbravejar) muito por alguém que me salvasse do loop interminável de digitar números e receber links no email que nada resolvem.

Particularmente irritante é quando a máquina conclui que o assunto está resolvido e bate a ligação na sua cara e você precisa começar tudo novamente.

Mas os números da XP deixam claro o modelo de negócio. O lucro no último trimestre de 2021 chegou a R$ 2,5 bilhões, 52% maior que o mesmo período no ano passado. A XP se tornou aquilo que combatia, um grande banco mais preocupado em engordar seus próprios ganhos do que em atender seus clientes. Se no call center, a parte mais pública e visível da operação é assim, difícil imaginar que o mesmo não aconteça no restante da empresa.

Sabia que você iria voltar

Quando comentei com minha gerente do Itaú que estava voltando, ela riu e disse. “Você não é o único. Muitos clientes que saíram estão voltando”. O Itaú, que já foi um mastodonte do setor bancário, correu atrás do prejuízo. Reduziu taxas, melhorou o treinamento dos gerentes e seu app, que era uma piada, voltou ao jogo.

Ouvi de amigos comentários semelhantes sobre outros bancos tradicionais.

Sim, o Itaú sofreu um ataque hacker, mas essa se tornou uma realidade nos dias de hoje. O fato de ainda estar funcionando mesmo após o ataque diz muito sobre o quanto a instituição melhorou.

Também troquei o cartão de crédito da XP pelo Nubank. Fui gentilmente atendido no chat do roxinho, mas do outro lado havia um prestativo humano. O app do cartão de crédito da Nubank, e as possibilidades que oferece, faz parecer que a XP está ao menos cinco anos atrasada nesse jogo.

A XP prova que os lucros são a maior tentação, e risco, para empresas disruptivas e inovadoras.

Na biografia “Na Raça - como Guilherme Benchimol criou a XP e iniciou a maior revolução do mercado financeiro brasileiro”, a jornalista Maria Luiza Filgueiras narra em diversas passagens como a XP copiou a gigante americana de investimentos Charles Schwab.

Meu cartão da XP é praticamente igual ao da Schwab. Só mudaram a cor, mas o desenho e até a área de transparência é bastante semelhante. Mas na Schwab, a opção de ser atendido por humanos é imediata e de fácil acesso. Se for para copiar, melhor trazer as vantagens e não somente o design e o discurso.

A propósito deste texto, tentei entrar em contato por email com a assessoria de imprensa da XP no endereço listado no site da empresa. Recebi uma mensagem automatizada de erro. Falar com humanos na XP é um desafio crônico, aparentemente.

Minha torcida é para que os melhores dias da XP não estejam apenas no passado. A empresa de fato revolucionou os investimentos no país e ajudou milhões de brasileiros. Mas inovar é um exercício constante. Felizmente, nunca é tarde para recomeçar.

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