A Música de 1966 (7) - O primeiro disco autoral dos Rolling Stones

Publicado em 28/02/2016 às 23:25
Aftermath, capa da versão original inglesa.
FOTO: Aftermath, capa da versão original inglesa.
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aftermath - red Na noite de 25 de junho de 1965. Bob Dylan, considerado a voz da nova década, adentrou o palco do Newport Folk Festival carregando uma guitarra elétrica Fender, e acompanhado por uma banda de rock. Ele começou o concerto com Maggie's Farm, deflagrando um racha de gerações, e não apenas simbólico. De um lado do palco encontrava-se Peter Seeger (exagerou-se depois que portava um machado), responsável pela popularização da folk music nos EUA, querendo desligar o fio da tomada. De outro a equipe de Dylan impedindo. Vaiado pela plateia, Bob Dylan deixou o palco depois de três canções. Voltaria com um violão, que tomou emprestado, para cantar a emblemática  It’s All Over Now Baby Blue. Ressalte-se que nem foi o primeiro músico a usar guitarras elétricas em Newport. Naquele mesmo dia, antes dele, Lightning Hopkins, The Chambers Brother e a Paul Butterfield Blues Band tocaram plugados. Dylan, assim como, na mesma época, Chico Buarque no Brasil, em relação ao samba, tinha sido ungido ídolo e porta-voz do folk, renovador e continuador de uma tradição. Ele dava sinais de que passariam incólume pela onda de rock que tomou conta do país. Naquele dia em Newport, no entanto, Dylan cortou laços não com a tradição, mas com o purismo. Uma atitude que contribuiu para que o rock and roll alcançasse a maioridade em 1966. Incorporando o espírito do seu tempo, foi a trilha de milhões de jovens que deixaram de viver à imagem e semelhança dos pais. Marcharam e protestaram a favor da democracia, das liberdades individuais, dos direitos da mulher, dos negros, da expansão da mente e mais causas que viessem. Os Rolling Stones, porém, pareciam não ter entendido o que acontecia. Em 1966, o grupo gravou o primeiro disco inteiramente autoral, todas as canções assinadas por Jagger & Richards. Meses antes Andrew Loog Oldham, o empresário e produtor do grupo teria trancado a dupla no quarto de um hotel, garantindo só abriria quando eles tivessem composto músicas suficientes para um álbum. Provavelmente  a história foi mais uma das "criações" publicitárias que Oldham espalhava pela imprensa. Afinal, se ele queria competir com os Beatles, teria que ter uma dupla de compositores no grupo que competissem com Lennon & McCartney. Surgiram algumas canções assinadas por Jagger & Richardas, mas a primeira realmente boa da dupla foi Satisfaction, que por pouco não fica num lado B de um compacto. Aftermath, quarto álbum do Stones, na Inglaterra, gravado em Los Angeles, passa por longe do peace & love que começa a dominar a subcultura pop americana, e do resto do mundo. As feministas da época eram mulheres cultas e acima dos 30 anos, para curtir rock and roll, senão teriam prestado atenção no novo LP dos Rolling Stones. Parte das canções é extremamente misógina. Explicitamente como Stupid Girl, Under My Thumb,  ou nas entrelinhas, feito Take it Or Leave it , High ad Dry. Poderia ter entrado também no album a não menos politicamente incorreta Yesterday's Papers, composta nesta época, mas só lançada no ano seguinte no álbum Between the Buttons. O grupo não atentara para as hordas de hippies que cruzavam os EUA de carona (o disco foi gravado na California), e cantava temas de um universo bem particular. Flight 505, por exemplo, é a história de um cara que manda um avião para o fundo do mar. Paint it Black, que saiu na Inglaterra em compacto, e entrou na versão americana do LP, uma das grandes parceria de Jagger & Richards, ameaçava pintar de preto um mundo que se tornava cada vez mais colorido. Stupid Girl teria sido feita para Chris Shrimpton, então namorada de Jagger (irmã da “manequim” e atriz Jean Shrimpton. Ela é considerada a primeira supermodelo). Under My Thumb, mais bem sucedida comercialmente, tornou-se um clássico da misoginia no rock, e uma das canções preferidas em concertos. O disco ainda reserva um comentário cáustico (este mais a favor), sobre as chamadas senhora de prendas domésticas, em Mother’s Little Helper. Ela abre o disco com a frase “Que saco envelhecer”, e mais adiante: “Embora ela não esteja doente/há sempre aquela pequena pílula amarela”. Uma das primeiras canções a citar um ansiolítico amenizando ansiedade e frustrações. Aftermath, o original inglês, teve três canções bem resolvidas Lady Jane, Under My Thumb e Mother’s Little Helper.  É um disco marcante mais pelas sonoridades variadas em cada faixas. Graças ao alquimista de sons Brian Jones, que botou em ação a parafernália de instrumentos que ia adquirindo em viagens. 1966 foi o último ano em que álbuns recebiam versões diferentes na Europa e EUA. Para que fossem reaproveitadas em mais um LP, foram sacadas cinco faixas de Aftermath (três delas Mother’s Little Helper, Lady Jane e Take it Or Leave It só seriam seriam lançadas na coletânea Flowers, de 1967). Paint it Black, que saiu na Inglaterra como single, tornou-se o carro-chefe da versão americana de Aftermath. Aftermath está presente em todas estas listas que se fazem  de melhores de todos os tempos. O  que é questionável. Mick e Keith mostravam potencial de composição, mas não dominavam ainda a arte. Das 12 faixas do álbum, oito só são lembradas pelos fãs de carteirinha da banda. Mick e Keef escreveram umas poucas músicas boas para compactos, complementadas por enchimentos de linguiça (“fillers”). Um bom exemplo é Goin’ Home, uma das mais pretensiosas e autoindulgentes dos Stones. Bob Dylan, em 1965, com Like a Rolling Stone, derrubou a barreira dos três minutos para música pop tocar no rádio, os Rolling Stones fizeram Goin' On se estender por onze minutos, mas com conteúdo para, se muito, os velhos três minutos.  Goin On foi tocada na turnê de 1967, e caiu na obscuridade. Em 1968 Mick e Keef, com Beggar's Banquet, lançariam o primeiro grande disco autoral dos Rolling Stones. Confiram o clipe promocional dos Rolling Stones em Mother's Little Helper: https://www.youtube.com/watch?v=8T9Aa1V5oyo

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