Iza Sabino é prova de como a cena mineira do rap continua potente

Aos 21 anos, a mineira Iza Sabino vive um momento de franca ascensão e maturidade dentro da música e pretende alcançar lugares aonde possa dar espaço para outras mulheres

Rostand Tiago
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Rostand Tiago
Publicado em 16/04/2020 às 11:58 | Atualizado em 16/04/2020 às 11:58
LÉO CASA/RAPBOX/DIVULGAÇÃO
IZA SABINO VIVE MOMENTO DE DESTAQUE DENTRO DO RAP NACIONAL - FOTO: LÉO CASA/RAPBOX/DIVULGAÇÃO

Já é mais que certo que a cena mineira do rap vem dando alguns dos mais inventivos e poderosos frutos do hip-hop nacional nos últimos anos. De lá, vem os mais variados nomes que se destacam no momento, passando por Clara Lima, Djonga, Sidoka, Chris MC, FBC e alguns outros que formam um panteão de versatilidade de sons e rimas.

Mas tudo indica que essa árvore da região metropolitana de Belo Horizonte está longe de parar com os bons frutos. É o que prova o som de Iza Sabino, jovem de 21 anos que vem das batalhas para os streamings. "Eu quero chegar longe e quando eu chegar no longe, quero ir para outro longe. Não quero ter um lugar de chegada”, é sua ambição, totalmente palpável com o que já mostrou em tão pouco tempo.

Seu mais recente trabalho de destaque é o projeto Best Duo, realizado em parceria com FBC, um novo passo em direção a sua maturidade artística, que vem sendo construída nos últimos seis anos. Iza é cria de Santa Luzia, Região Metropolitana de Belo Horizonte. Sempre se envolveu com música, sobretudo por estímulo do pai que adorava colocar um violão em sua mão.

Após passar por uma série de problemas, envolvendo um quadro de depressão e problemas respiratórios, Iza conhece melhor esse amigo que se tornaria o rap ao frequentar as batalhas em 2014 e logo participa delas, na luta também contra a timidez. Dois anos depois, mete a cara para gravar seu primeiro som e no ano seguinte, começa a fazer parte do potente coletivo Original GE, construindo uma relação de amizade com os já citados eminentes nomes na cena mineira. Sabino hoje também integra o grupo Fenda, ao lado de Paige, Laura Sette, Mayi e DJ Kingdom

Em 2019, veio o primeiro EP, Augusta, já carregando uma identificação musical muito própria, mas que também cede espaço para a versatilidade. Usa uma voz grave, na altura dos beats, para cantar sobre sobre suas vivências e sobre seus amores, ocupando espaços que o rap, em um ambiente ainda hostil, não dá o devido respeito.

"Falar de um romance lésbico é ocupar esse espaço que eu não via sendo ocupado. Não que algumas minas lésbicas não falassem sobre, mas como o rap ainda é um movimento machista, os caras invisibilizam isso ainda. A Clara (Lima) ela está no hype e pauta isso, mas mesmo assim, não é uma coisa que as os caras curtem ouvem e nem falam disso. É um assunto que falta ser respeitado", relata Iza.

Todo esse processo criativo é pautado por um método muito particular. Sua experiência com melodias, além de sua atuação também como beatmaker, acabam por tornar os sons como primeiro gatilho para que as rimas sejam atiradas. “Eu sempre pego o som e vou criando um embromation de inglês ou sei lá que língua por cima, uma coisa que meu pai me ensinou e acabei pegando. Aí eu crio uma melodia para o beat e com isso fica mais fácil de fazer uma música boa de ouvir do que se eu fizesse uma letra e depois procurar um beat”, explica. Com o tempo e com ajuda de grandes nomes como o produtor Coyote, foi aperfeiçoando a métrica. Também não deixa de lado sua influências do hip-hop dos anos 2000, com um flow bem travado nas batidas, mas não se limitando a isso.

Já para Best Duo, trabalho que lhe garantiu um outro nível de visibilidade, a versatilidade também estava lá, mas construída de uma forma diferente. A parceria com o amigo FBC teve seus conflitos na concepção do disco em um campo estético. O rapper queria que Iza usasse suas habilidades para trazer uma voz mais aguda, com uma certa tônica de deboche, que se tornaria algo como uma característica da persona que seria conhecida como Sua Mãe dentro da cosmologia do disco.

"Se você olhar meus sons, eu sempre fui muito marrenta, de um jeito bem gangster, bem firme e com voz grave. Quando ele disse para eu fazer uma voz aguda, pensei logo 'vou perder minha postura de bandida' (risos). Falei que não ia fazer, a gente discutiu, ele se ajoelhou, falou que os filhos dele precisavam dessa voz, que a família dele precisava, pegou na minha mão que nem princesa", lembra Iza. Ela decidiu que ia dar uma chance e aos poucos foi se convencendo. Deu certo, o que era para ser apenas uma música que envolvia o universo do jogo Free Fire se tornou um disco de alta qualidade e grande repercussão.

Com uma novo alcance, Iza precisou lidar com nem tão novos obstáculos. "Eu me transformei depois desse álbum. De ver o resultado, de entrar em outro patamar de visibilidade, mas também outro patamar de invisibilidade. Vi o tanto que as pessoas se importam ou não com uma mina cantando rap, mesmo se ela for destaque ou boa. O que importa para eles é que eu sou uma mina e isso já incomoda e já é o suficiente para tentarem me impedir de progredir".

Ela pôde contar com elogios e conversas sobre os desafios esse novo momento, de grande ajuda para lidar com tudo. Nomes como o cearense Don L, Os cariocas NGC Borges e Ebony, além dos amigos mais próximos como o próprio FBC, Clara Lima, Djonga chegaram junto para conversar sobre esse cenário.

Agora é hora de dar continuidade tanto para a música, como para a luta. Iza vem com Malvada, um novo single que estará disponível a partir desta quinta (16) e os planos são de lançar outros durante o período de quarentena. "Quero chegar em um lugar que as pessoas não só parem para me ouvir falar, mas que eu consiga também dar espaço para outras mulheres falarem comigo. É algo que eu acho difícil, mas não impossível. Sou uma mulher negra, lésbica, de quebrada e sempre quero reforçar os assuntos sobre essas minhas vivências e fazer sons que possam empoderar as minhas", arremata.

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