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Montadora brasileira fala sobre trabalho e carreira em Hollywood

A brasileira Claudia Castello trabalhou em produções como 'Sergio', 'Creed' e 'Pantera Negra' e fala sobre os desafios de organizar um filme na sala de montagem

Rostand Tiago
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Rostand Tiago
Publicado em 23/04/2020 às 10:27 | Atualizado em 23/04/2020 às 10:33
DIVULGAÇÃO
A MONTADORA CLAUDIA CASTELLO CONSTRÓI UMA CARREIRA PELO CINEMA NORTE-AMERICANO - FOTO: DIVULGAÇÃO

Sergio, drama sobre emblemático diplomata brasileiro morto em atentado terrorista, está disponível desde a última sexta-feira na Netflix. O filme tem sua estrutura narrativa organizada de uma forma não linear, indo e voltando no tempo e nas memórias de seu protagonista. Trata-se de uma condução que precisa ser bem costurada, para não confundir a audiência e garantir uma unidade a obra. Parte vital desse processo é a montagem, que precisa organizar e dar significado ao material filmado. E a responsável por isso em Sergio é a brasileira Claudia Castello, montadora que vem conquistando um espaço significativo em Hollywood nos últimos dez anos, trabalhando tanto em sucessos independentes, como em grandes franquias e blockbusters.

Claudia se formou em jornalismo e tomou gosto por documentários. Em 2001, se muda para os Estados Unidos na intenção de estudar o inglês e começa a brechar uma ou outra aulinha sobre cinema em escolas diferentes. Durante o período, aprendeu a manusear o Final Cut, software de edição audiovisual da Apple, conseguindo um emprego em uma produtora de comerciais. "Tomei gosto ali por essa coisa de deixar as coisas juntas, montar esses quebra-cabeças, esse mosaico do filme. Teve uma amiga minha que tinha filmado um curta e queria alguém para editar. Eu disse que sabia, mas não sabia (risos). Levei três meses para terminar", conta Castello. Com a vocação descoberta, era hora de aprofundar os conhecimentos. Passou por um curso em montagem na New York Film Academy e depois seguiu para um mestrado na University of Southern California.

Nesse período, conheceu um rapaz que lhe renderia frutíferas parcerias no futuro. Dois semestres mais adiantado que ela estava o cineasta Ryan Coogler, antes de conquistar os olhares com seu Fruitvale Station e comandar gigantes projetos como Creed: Nascido para Lutar e Pantera Negra. "Eu era puxada muito pela coisa do documentário, era o rumo que queria seguir. Fui para uma aula e vi o Ryan Coogler mostrando um trabalho dele. Foi aí que desisti do documentário e pensei 'eu quero trabalhar com esse cara'", relata. Claudia montou Fig, um dos primeiras curtas de Coogler e retomou a parceria em Fruitvale Station: A Última Estação, primeiro longa do diretor desenvolvido ao ser contemplado pelo programa de incentivo do Festival de Sundance. A parceria entre os dois se firmou e seguiu nas produções sucessivas de Coogler.

As portas se abriram ainda mais para Claudia com a visibilidade desses trabalhos, assim como foi experimentando outros métodos de trabalho e outras parcerias. Ainda com Ryan, chegou o momento de mexer com imagens e uma história já marcante dentro do imaginário do cinema americano: o universo de Rocky Balboa. A montagem de Creed ganhou um ritmo diferente em relação ao Fruitvale Station, que foi montado com as filmagens já encerradas. O segundo longa, centrado no filho do maior oponente/amigo de Balboa, ia sendo organizado diariamente, ao final de cada dia de filmagem, ao lado de Michael P. Shawer, com quem dividia o trabalho.

"A gente parou para assistir todos os Rocky, tinha que ser uma referência. Realizamos um primeiro corte nosso e depois o Ryan chegava mais junto e íamos corrigindo e fazendo alterações. Mais para o final, ele fica 100% do tempo na sala de montagem com a gente. Nessa reta final, também tivemos a presença próprio Sylvester Stallone, que se doou muito para que o filme ficasse bom, além de ser uma pessoa super divertida", relembra Claudia.

Em sua rotina de trabalho, Claudia aponta que a forma de trabalhar com os diretores costuma ser a mesma, dando sua visão inicial e depois refinando junto aos cineastas. O ambiente costuma ser de liberdade. Mas o cenário em uma escala de pretensões bilionárias, como foi com Pantera Negra, da Marvel Studios, a coisa fica um pouco diferente. Do um ano de montagem da produção, ela passou por seis meses, trabalhando no corte de Ryan. "Fizemos o corte do diretor, mas aquilo ia com certeza mudar. As etapas seguintes, com o corte dos produtores e do estúdio, iam ser algo mais afunilado, com menos liberdade. Pelo tamanho do filme, a produção acaba tendo um peso maior nessas decisões do que o normal", explica.

Já em Sergio, o desafio vem com a já citada estrutura não linear da narrativa, com idas e vindas no tempo e espaço. "A gente tinha que costurar tudo e estabelecer uma regra para que o público pudesse entender sobre essas quebras para depois podermos ficar mais livres e quebrar essa regra. Ainda tínhamos que manter uma certa tensão o filme inteiro, além de conseguir criar arcos específicos", afirma Claudia. Após Sergio, trabalhou com o diretor brasileiro Fernando Grostein em Abe, protagonizado por Noah Schnapp (Stranger Things) e Seu Jorge (Tropa de Elite 2), disponível no streaming estrangeiro e que deve estar em breve disponível no Brasil. Um trabalho intenso, realizado em 3 meses de dedicação diária.

"A montagem é a última vez em que o filme é escrito, depois do roteiro e da direção. Essa coisa de moldar uma história e um sentimento é algo muito intenso, além da influência que você tem no resultado final, é algo que me fascina", elabora Claudia. Mas a direção também chama sua atenção e atualmente ela desenvolve um projeto para dirigir, com planos de ser realizado no Brasil.

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