É sempre tempo de voltar aos clássicos e o mês de junho, é indissociável de Virginia Woolf por causa do icônico Mrs. Dalloway, cujo enredo se passa ao longo de um único dia deste mês. Recentemente, a Peguin-Companhia das Letras lançou uma nova edição de outro romance da grande escritora inglesa, Flush. Lançado em 1933, pouco após o experimental As Ondas, Flush representa uma retomada à narrativa mais tradicional.
A forma, é verdade, não tem nenhum elemento extraordinário, mas a escolha por escrever a biografia de um cão é ousada e divertida. Com sagacidade, Virginia Woolf discorre sobre importantes questões de classe da Inglaterra do século 19, além de homenagear a memória da poeta Elizabeth Barret, dona do cocker spaniel protagonista, fazendo uso de fatos reais da vida dos dois, tais como a mudança da Inglaterra para a Itália ou ainda o sequestro do cão por uma gangue londrina.
Leia um trecho de Flush:
"Até mesmo nos dias de hoje, talvez ninguém seja capaz de tocar a campainha de uma casa em Wimpole Street sem tremer. É a rua mais imponente de Londres, a mais impessoal. De fato, quando o mundo parece estar se despedaçando em ruínas e a civilização parece tremer sobre as bases, basta ir até Wimpole Street, caminhar por aquela avenida, observar aquelas casas, avaliar sua uniformidade, maravilhar-se com as cortinas das janelas e com sua harmonia, admirar os batentes de latão polido das portas e sua regularidade, observar açougueiros oferecendo peças inteiras de carne e cozinheiras recebendo a mercadoria, calcular a renda de seus habitantes e deduzir daí sua consequente submissão às leis de Deus e dos homens — basta ir até Wimpole Street e beber profundamente da paz exalada dessa fonte pura para ostentar um suspiro de agradecimento por Wimpole Street permanecer lá, imutável, enquanto Corinto caiu e Messina desabou, enquanto coroas foram levadas pelo vento e antigos Impérios consumiram-se em chamas.
(...)
Muito lentamente, muito vagamente, depois de muito fuçar e sentir o terreno cautelosamente, Flush começou a distinguir o delineamento de diversos itens de mobília. Talvez aquele enorme objeto ao lado da janela fosse um guarda-roupa. Ao lado dele, parecia, havia uma cômoda. No meio do quarto, emergia à superfície uma mesa que parecia ter um anel à sua volta; e então afloraram as estruturas amorfas de uma poltrona e de outra mesa. Mas tudo estava disfarçado (...)"
Confira as outras notícias da Coluna Escrita desta terça-feira (30):
- Já estão abertas as inscrições para a segunda turma virtual da oficina de Escrita Criativa ministrada pelo escritor, dramaturgo e ator Cleyton Cabral. Os encontros - que são realizados de forma coletiva e online - irão acontecer nos dias 6, 8, 13 e 15 de julho, sempre das 20h às 22h. O investimento é de R$ 90. Temas como os elementos e a estrutura da narrativa, construção do texto e exercícios de escritas são abordados nas aulas. Os interessados devem entrar no site www.sympla.com.br e procurar por O Salto na Folha em Branco, nome do curso.
Leia também: Autores pernambucanos são selecionados em edital do Itaú Cultural
Ronaldo Correia de Brito reflete sobre os efeitos da pandemia no fazer cultural
- Autora dos livros Recortes Para Álbum de Fotografia sem Gente, Amora (pelo qual venceu o Jabuti em 2016) e, mais recentemente, a ficção científica escrita a oito mãos Corpos Secos, Nathália Borges foi convidada na coluna Um certo Alguém.
A iniciativa é do Itaú Cultural e estreou com Tom Zé no último dia 18. A escritora foi a segunda artista a compartilhar memórias, anseios e desejos. Para ler a entrevista, basta clicar aqui. Toda quinta tem novo convidado.
Comentários