Literatura

'A Visão das Plantas' evidencia a complexidade da experiência humana

Romance de Djaimilia Pereira, finalista do Prêmio Oceanos, encanta com sua narrativa poética

Márcio Bastos
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Márcio Bastos
Publicado em 22/03/2021 às 9:19
HUMBERTO BRITO/DIVULGAÇÃO
Djaimilia Pereira de Almeida é considerada um dos principais nomes da literatura contemporânea em língua portuguesa - FOTO: HUMBERTO BRITO/DIVULGAÇÃO
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Nascida em Angola e doutora em teoria da literatura na Universidade de Lisboa, Djaimilia Pereira de Almeida é um dos nomes mais celebrados da literatura em português contemporânea. A autora venceu o Prêmio Oceanos, em 2019, com Luanda, Lisboa, Paraíso, e voltou a ser celebrada na premiação do ano seguinte com A Visão das Plantas (Todavia, 88 páginas, R$ 49,90), desta vez em segundo lugar, atrás de Torto Arado, do escritor baiano Itamar Vieira Jr. Nesta obra, ela reflete sobre a complexidade da natureza humana, com seu potencial para o bem e o mal, em uma narrativa profunda sobre as consequências de nossas ações.

O livro Os Pescadores (1923), do português Raul Brandão, apresenta paisagens e personagens da classe trabalhadora de seu país, figuras historicamente anônimas, cujas vidas o fascinam. Em uma das passagens, ele cita o capitão Celestino, que, apesar do histórico como pirata, "acabou como um santo, cultivando com esmero um quintal". Este personagem enigmático inspirou Djaimilia, que se propõe a fabular este homem, seu jardim e o que a relação com a natureza e o tempo revela sobre as contradições dos indivíduos.

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Mais do que desvendar os mistérios que a figura de Celestino, já velho e solitário, evoca, a autora adiciona camadas a essa figura, que revelam as sombras do passado imperialista e racista de Portugal. Sua história é a de tantos outros que, no passado ou presente, compactuaram com a opressão e a exploração do outro. Ao mesmo tempo, a narrativa proposta pela autora não se interessa por julgamentos ou condenações.

Através da figura do padre Alfredo, que passa a visitá-lo na intenção de fazer o capitão se confessar, ela constrói um cenário onde a própria ideia de culpa e autoconsciência ganha outros contornos. Celestino se arrepende? Sua nova vida o isenta de suas ações? Passado e presente, bondade e crueldade coexistem e não isentam um ao outro.

Com uma construção poética arrebatadora, que provoca uma sensação quase sinestésica no leitor, Djaimilia Pereira de Almeida não oferece soluções para os dilemas da existência.

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