ANÁLISE

Nos 70 anos das novelas brasileiras, Nordeste foi pouco ou mal representado na televisão

A primeira vez em que o Nordeste aparece numa telenovela da TV Globo foi em "O Verão Vermelho", do autor baiano Dias Gomes, em 1969, no horário das 22 horas

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Bruno Vinicius

Publicado em 21/12/2021 às 7:00 | Atualizado em 21/12/2021 às 7:22
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Não há dúvidas de que as telenovelas são os principais produtos audiovisuais brasileiros. Completando sete décadas nesta terça-feira (21) — desde que a TV Tupi levou ao ar Sua Vida me Pertence —, o gênero se consolidou no imaginário brasileiro, e resiste mesmo nesta era de domínio do streaming.

Com histórias que têm marcado as décadas desde o seu surgimento — seja tratando sobre a contextualização política do País ou com personagens icônicos —, as novelas na TV foram responsáveis por exportar a imagem nacional durante muito tempo, assim como apresentava o país ao próprio país. No entanto, se há críticas pertinentes a esse modelo, uma delas é a falta de diversidade regional ou os estereótipos que foram construídos sobre o Nordeste pelas narrativas.

A primeira vez em que a região apareceu numa telenovela da TV Globo foi em Verão Vermelho, do autor baiano Dias Gomes, em 1969, no horário das 22h. O escritor e dramaturgo foi um dos responsáveis por "exportar" o Nordeste e os traços culturais, como o candomblé e as rodas de capoeira, para as telas brasileiras. É o que a autora Andréa Cardoso Nunes traz no artigo "O Nordeste nas novelas da Rede Globo", em que faz uma análise comparativa com O Bem Amado, primeira novela a cores da televisão brasileira.

Nos anos 1980, a região ainda aparecia nas grandes produções da Globo, como foi em Roque Santeiro, de Dias Gomes e Aguinaldo Silva, um baiano e um pernambucano, e em Tieta, de Aguinaldo com Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn, já na virada para os anos 90. Ainda que restritas a personagens estereotipados — como o político corrupto, as beatas ou mulheres fogosas, o analfabeto bruto e violento — e ambientadas em cenários tropicais ou pequenas cidades interioranas, resumindo a região a esses lugares paradisíacos ou peculiares.

Diversidade de atores também é problema

A falta de diversidade na escalação de atores é uma problemática na teledramaturgia. Um dos casos emblemáticos ocorreu na novela Porto dos Milagres (2001), de Aguinaldo Silva e Ricardo Linhares, que escalou brancos para protagonizar uma história na Bahia — que tem 80% da sua população negra. A trama, uma das últimas do gênero realismo fantástico exibida no horário nobre, recebeu uma ampla crítica negativa sobre os atores escalados, principalmente dos movimentos negros.

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Segundo Sol foi criticada por ter atores brancos representando a Bahia - Globo/Divulgação

Mais recentemente, em Segundo Sol (2018), de João Emanuel Carneiro, também na TV Globo, todos os protagonistas eram brancos. O Ministério Público do Trabalho (MPT) chegou a emitir à emissora, por meio da Coordenadoria Nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidade e Eliminação da Discriminação no Trabalho (Coordigualdade), uma notificação recomendatória para levar o folhetim a "respeitar a diversidade racial" de Salvador.

"O MPT entende que o não espelhamento da sociedade nos programas televisivos gera a perpetuação da exclusão e reafirma estereótipos de limitação de espaços a serem ocupados pela população negra. O Estatuto da Igualdade Racial recomenda ao Poder Público a promoção de ações que assegurem a igualdade de oportunidades no mercado de trabalho para a população negra, inclusive mediante a implementação de medidas visando à promoção da igualdade nas contratações do setor público e o incentivo à adoção de medidas similares nas empresas e organizações privadas", disse o comunicado na época.

Em entrevista ao programa Conversa com Bial, no ano passado, Carneiro reconheceu o erro. "Eu acho que tá certo. Tem que dar voz aos negros, fazer a novela com mais atores negros. E nesse evento aí, nessa ocasião do Ministério Público no 'Segundo Sol', eu aprendi. Acho que foi uma lição pra mim. Eu penso em fazer novelas diferentes também", disse João Emanuel.

Primeira protagonista negra veio do Nordeste

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Taís Araújo, primeira protagonista negra em uma novela brasileira - Globo/Divulgação

"Segundo Sol" vai contra a própria trajetória de João Emanuel. A primeira protagonista em uma novela da Globo foi em uma trama escrita por ele, "Da Cor do Pecado". Taís Araújo, que havia feito sucesso como "Xica da Silva", na TV Manchete, foi a escolhida para ser o primeiro rosto negro principal da emissora. A produção também se passava no Nordeste, em São Luís do Maranhão. Durante o início da novela, o centro histórico da capital e os Lençóis Maranhenses serviram de base para a história de Preta e Paco, papel feito por Reynaldo Giannechini.

 

Outras novelas de sucesso

Apesar das poucas novelas representando a região, muitas delas foram sucesso de crítica, público e exportação. "O Bem Amado (1973), "Gabriela" (1975) e (2012), "Roque Santeiro" (1985), "Tieta" (1989), "A Indomada" (1997), "Porto dos Milagres" (2001), "Senhora do Destino" (2004), "Cordel Encantado" (2011) e "Flor do Caribe" (2013) são alguns das novelas que tiveram êxito com a audiência.

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