MÚSICA

Herança musical: conheça artistas que foram inspirados por suas famílias

Da bossa nova ao forró, amor pela música atravessa gerações e resulta em novas sonoridades

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Emannuel Bento

Publicado em 18/02/2022 às 19:52 | Atualizado em 20/02/2022 às 19:05
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Aquela música que tocava nos domingos, durante almoços familiares na infância, costumam marcar para sempre a memória das pessoas. Imagina, então, quando se tem uma família de músicos? Não é de se estranhar que muitos filhos, netos e parentes decidam seguir a carreira artística, seja tocando ou cantando. O saber musical, afinal, pode ser repassado de maneira muito empírica. A música é apaixonante, sendo um tipo de arte que diz sobre quem somos.

 

Recentemente, despertou atenção o interesse da pequena Sofia Gilberto, neta de apenas seis anos de João Gilberto (1931-2019), na música. Ela é filha do primogênito da lenda da bossa nova, João Marcelo Gilberto, com a produtora Adriana Magalhães. A família já disse à imprensa que a menina tem aptidão natural, já que o pai a colocou para ouvir jazz desde bebê e os exercícios musicais começaram ainda com o avô em vida.

A pequena Sofia já compôs cerca de 30 músicas, e suas gravações contarão com a presença de Roberto Menescal, outro veterano da bossa. O caso lembra de Maria Luiza Jobim, que ainda pequena gravou com Antônio Carlos (1927-1994) as faixas "Samba de Maria Luiza" e "Forever Green" no álbum "Antonio Brasileiro" (1994). A menina cresceu e lançou em 2019 seu primeiro disco: "Casa Branca". A própria Bebel, filha de Gilberto, soube reinventar a bossa nova e atingir o mercado internacional, assim como o pai, em "Tanto Tempo" (1996).

Os "herdeiros" musicais atravessam a música brasileira. Caetano Veloso trouxe a veia artística já consolidada da prole para os palcos com a turnê "Ofertório", em quarteto com Zeca, Moreno e Tom Veloso. O projeto foi registrado no disco homônimo.

A questão reaparece de tempos em tempos, não como uma simples utilização de sobrenomes, mas por esse gosto que nasce por vivências familiares e tradição. O trio Os Gilsons é um exemplo recente, sendo formado por um filho de Gilbeírto Gil (José Gil) com dois netos do artista baiano (Francisco Gil e João Gil).

O vínculo artístico com o novo imortal da Academia Brasileira de Letras está na MPB, que aparece com uma roupagem mais contemporânea, unida ao suingue, beats e levadas modernas. O projeto lançou em 2 de novembro o álbum de estreia, "Pra gente acordar", com nove faixas, incluindo os recentes singles "Proposta" e "Duas Cidades".

"O trio surgiu de forma 100% despretensiosa. Já fazíamos música juntos, mas foi através de um amigo nosso que nasceu o projeto. Ele convidou eu e o José para um show. De cara, já pensei em chamar o João, que tinha um repertório grande de harmonias", diz o neto Francisco, filho de Preta Gil.

"A gente cresceu numa educação pessoal e profissional em que a nossa individualidade sempre foi muito respeitada e incentivada. Desenvolvemos tudo o que a gente tem para vida e para a música muito desse lugar".

O artista conta que lida com a ligação familiar ao Gilberto Gil de forma bastante suave. "Já existe um aprendizado de uma geração anterior à nossa, que já passou por isso: a minha mãe, Preta, e mãe do João, a Nara, são pessoas que já passaram por isso de serem filhas de Gilberto Gil e tiveram de enfrentar isso em suas carreiras. Então viemos de uma geração que lida com isso de uma forma leve. Gilberto Gil só vai existir um (risos)", diz.

ZABENZI/DIVULGAÇÃO
MÚSICA Francisco Gil, João Gil e José Gil formam Os Gilsons - ZABENZI/DIVULGAÇÃO
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MÚSICA Francisco Gil, João Gil e José Gil formam Os Gilsons - ZABENZI/DIVULGAÇÃO
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MÚSICA Francisco Gil, João Gil e José Gil formam Os Gilsons - ZABENZI/DIVULGAÇÃO

"Bebemos sim dessa fonte musical, mas a nossa sonoridade é nossa. Misturamos com o que trazemos dos nossos tempos, as nossas inspirações são muito atuais também. Os artistas da nossa cena também alimentam muito a gente: Duda Beat, Luedji Luna, Baiana System e tanta gente nova que a gente gosta”.

No ápice da pandemia, Gilberto Gil compartilhou nas redes um vídeo tocando ao lado da neta Flor, outra Gil com pretensões artísticas. Eles cantam “Baby One More Time”, de Britney Spears. "Quem disse que divas pop não podem fazer parte do repertório de Seu Gilberto? Para espantar o tédio durante o isolamento. Fica a dica pra você não arrancar os cabelos neste período: invente, tente, arrisque coisas novas!", dizia a legenda.

Em Pernambuco, o repasse da prática artística ocorre bastante, visto que é uma tradição também na cultura popular. Temos Maciel Salu, filho do Mestre Salustiano, Nonô Germano, filho da lenda do frevo Claudionor, e vários artistas da família Queiroga.

A questão da herança artística é nítida na família de Nando Cordel. Dos seis filhos, quatro trabalham na banda do pai: Tauana (baixista), Caiã (percussionista), Felicidade (backing vocal) e Tauã (baterista). Esses dois últimos também lançaram suas carreiras como cantores. "Minha relação com a música nasceu assim que eu nasci. Digo que nasci dentro da música. A música é uma coisa tão mágica, tão surreal, que você não quer sair nunca mais", diz Tauã.

CHARLES JOHNSON/DIVULGAÇÃO
MÚSICA Tauã Cordel segue os passos do pai apostando em forró, mas com novas sonoridades - CHARLES JOHNSON/DIVULGAÇÃO
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MÚSICA Tauã Cordel segue os passos do pai apostando em forró, mas com novas sonoridades - CHARLES JOHNSON/DIVULGAÇÃO

"Quando eu me entendia por gente, o meu pai já era famoso. Então eu via todos os artistas dentro da nossa casa: Dominguinhos, Chico Buarque, Ivete Sangalo, Maria Bethânia, Netinho e quem mais você possa imaginar. Viajávamos para Xuxa, Faustão. Esse ambiente vai lhe consumindo de certa forma. O meu pai também nunca foi envolvido com álcool ou drogas, então isso ajudou nessa proximidade."

Com apenas 12 anos, Tauã se tornou roadie da banda de Nando Cordel, porque "achava bonito montar bateria". Foi conhecendo tanto do backstage que já aos 14 se tornou produtor. Chegando na adolescência, aos 16, Nando fez uma proposta: teria uma turnê nos Estados Unidos e só levaria os filhos se eles tocassem na banda. Tauã aprendeu a tocar bateria e, desde então, passou a integrar a banda do pai.

Por oito anos ele liderou a banda jovem Tribo Cordel com o irmão Caiã . O projeto surgiu em 2011 com um som mais voltado ao público adolescente, o que eles chamavam de forreggae. Em 2019, ele assumiu o desafio de se tornar cantor solo e segue se inspirando no forró.

"Eu pensei em fazer algo mais 'good vibes', como faríamos num palcozinho na praia. Comecei a trazer mais esse som da música praiana no forró”, diz Tauã. "Existe uma lacuna muito grande do forró pé de serra, ele ficou como uma tradição de outra geração. Mas todo mundo ama o forró de serra quando adaptado. Quando vem aquele forrózinho de luau, como um sunset, a exemplo do Falamansa, a galera fala 'poxa, que massa'".

Entre os nove singles lançados, está "Você Endoideceu Meu Coração", regravação do clássico de Nando. Outro destaque é “Namora Comigo”, que mescla o forró tropical com o reggae do grupo paulistano Maneva. O próximo lançamento será um projeto audiovisual gravado na praia de Pipa em maio, com participações de cantores conhecidos nacionalmente.

"Eu sempre tento levar Pernambuco no meu trabalho. Acho que o estado perdeu, na grande massa, figuras de artistas nacionais. Temos sucessos comerciais, mas trabalhos conceituais, com um pouco mais de respeito, acho que não. Apesar disso, a música pernambucana é muito querida".

Felicidade Cordel - Foto: Mau Mau Studio / Divulgação
Felicidade Cordel - Foto: Mau Mau Studio / Divulgação - Felicidade Cordel - Foto: Mau Mau Studio / Divulgação

Felicidade Cordel também começou aos 12 anos. Ela passou um ano ensaiando muito até Nando a chamar para ser back vocal. "No nosso caso, ele sempre nos deixou bem à vontade. Isso foi totalmente interesse nosso, mas lidamos com a música desde muito novos. Nando transpira música. Ele sempre está compondo, escrevendo. Crescemos ouvindo isso, isso inspira que tenha aptidões".

A cantora lançou um álbum homônimo em 2016, mas enfrentou depressão e deu uma pausa na carreira. "Recentemente, me juntei com o meu pai. Fizemos canções e nesse ano iremos lançar várias músicas. A primeira será em março: 'Eu Sou de Luz', que fala da minha história com depressão. Acredito que vá inspirar muita gente. Acho que a música é isso: ela ultrapassa dimensões que nem imaginamos, ajudando as pessoas", finaliza.

SHOWS

Recentemente, Lenine e o filho Bruno Giorgi anunciaram que estão em estúdio gravando em álbum de inéditas, que será lançado no primeiro semestre deste ano. O projeto se transformará em turnê nacional, prevista para estrear no Circo Voador, no Rio de Janeiro, em 2 de julho. Antes do adiamento por conta da pandemia, a data para o Recife era 14 de maio. Ainda sobre pai e filho no palco, Nando e Sebastião Reis estão com data marcada para se apresentar no Teatro Guararapes, em Olinda: 18 de março, após três adiamentos.

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