Brega-funk: Influenciadores de dança e humor assumem as vozes do ritmo
Importância das redes sociais nessa cena musical cresceu ao ponto de derrubar os muros que separavam as figuras de "MC", "dançarino" ou "influencer"
No começo do brega-funk, quase todos os MCs seguiam um certo perfil: eram homens ligados ao antigo cenário do funk e que atuavam muito em palcos e bastidores dos eventos das periferias, movimentando uma economia paralela e ainda pouco midiatizada. O crescimento das redes sociais no jogo não só ampliou bastante a dimensão desse movimento, como vem incluindo vozes com diferentes idades, gêneros e trajetórias nos hits.
Influenciadores digitais que ganharam visibilidade com conteúdos de dança ou humor são, cada vez mais, os responsáveis por sucessos que conquistaram virais do TikTok, do Instagram Reels e adquirem milhões de visualizações no YouTube. Esse fenômeno não é de se estranhar, visto que o brega-funk nasceu junto à explosão da cultura digital, sendo um fruto desses tempos que vivemos.
É também nas redes que os nomes da cena criam verdadeiros campos de combate, sendo alçados a fama através de polêmicas e conquistas replicadas por páginas desse nicho. Nesse sistema de celebridades, estão caindo os muros que separavam as figuras "MC', "dançarino" ou "influencer".
Natural do Ibura, periferia da Zona Sul do Recife, Eodon é um exemplo dessa nova geração. Começou como humorista até se tornar um dos cantores do momento do brega-funk, tendo até vencido por voto popular o prêmio de "Melhor MC" do Brega Awards, organizado por páginas como Brega Bregoso e Babado dos Famosos PE com apoio da Prefeitura do Recife.
"Eu fazia vídeos de humor com amigos no Facebook. Depois, passei a fazer também no Instagram. Comecei na música na brincadeira. A primeira foi uma paródia com um amigo, George, chamada 'Tome Gaia'. Depois fiz uma com Barca e Reino, que era 'Tapa na Minha Cara'. Ambas têm mais de meio milhão de visualizações", explica Eodon, de 21 anos, ao JC.
@beca Dc: @fefezete e @ramon.sl ? Movimenta (feat. Mc Nick & mc jhenny) - Brega Funk - GS O Rei do Beat & Eo Don & Mc Gw
"A partir daí eu gostei da coisa e fiz um segundo que foi 'Movimenta'. Se juntar todos os canais que a música foi publicada, são 40 milhões de visualizações. Essa música também viralizou no TikTok, mas eu não sabia de nada de música, era todo leigo”, continua o MC, que profissionalizou a carreira de cantor ao assinar com a Jorge Music Produtora.
"Eu tinha 20 milhões em uma música, 10 milhões em outra, mas ainda não sabia como ganhar o dinheiro. Eu fiz para tocar nos cantos mesmo, mas hoje estou levando a sério a música. Tô mais artista, recebendo o dinheiro direitinho e trabalhando a minha imagem também".
Jorge Music, que comanda a produtora que leva o seu nome, vem apostando alto nessa onda dos "cantores influencers". Além de Eodon, ele fez convites inicialmente inusitados para grandes dançarinas das redes: Danny Maria, 17, e Vitória Kelly, 22.
Danny é natural de Natal, no Rio Grande do Norte, cidade que está numa certa "zona de influência" dos ritmos que emergem da periferia do Grande Recife. "Eu comecei dançando em casa, e daí foram surgindo oportunidades. Eu vim pro Recife e comecei gravar com os Neiffs, aparecia muito com os meninos, daí acho que foi bem espontâneo a minha fama em Pernambuco."
"Eu não tinha tanta vontade de cantar, apesar de pensar. Eu não tinha muita esperança, mas Jorge me passou tudo e tá ajudando", diz a jovem, que mora em Natal e visita o Recife a trabalho. Danny Maria estreou com a romântica "Quero Acordar", em parceria com Danilo Chatinho, da dupla Os Neiffs. Ela também lançou "Amigo Secreto", com Eodon. "A gente está começando a organizar o show. Acho que é o nosso maior trabalho."
Já Vitória Kelly é bastante conhecida na cena recifense como dançarina do MC Tróia, sendo uma das personalidades do brega com mais seguidores no Instagram (2,2 milhões). Até então, ela lançou parcerias com os MCs Terror, Kevin, Draak e Eodon. A inserção de Vitória e Danny também mostra as mulheres tomando os vocais do brega-funk, algo incomum há cinco anos.
"Está sendo muito desafiador. Estamos trabalhando a minha voz e o meu público está gostando muito, muito mesmo", diz Vitória. "Acho que a música acaba sendo mais uma oportunidade para muita gente. Acho que todo mundo que eu conheço está começando a trabalhar com isso, ou considerando trabalhar. Querendo ou não, é sempre bom estar fazendo mais trabalhos. Você faz tudo, se aproximando mesmo. É ter mais trabalhos na rua e visibilidade, né?."
Apesar de subir aos palcos todas as semanas com Tróia, a dançarina admite que o seu maior desafio é o show próprio. "Acho que vai ser babado. A gente está tentando lançar a música solo, mas, nesse comecinho, para ficar mais à vontade, quero continuar trabalhando com os meninos. E só depois vir com a minha."
'É o futuro dessa cena'
O produtor artístico e musical Jorge Music ressalta que os criadores de conteúdo possuem talentos que podem ser mais trabalhados. "Eu já vinha acompanhando todos os dançarinos e digitais influencers e me interessei por esse gerenciamento. Com os MCs, é mais fácil pois fazemos as músicas com falas e expressões, e com menos canto. Eu fui professor de canto, o que tornou mais fácil lidar com isso, direcionando como eles devem cantar e se comportar".
Jorge ressalta que os públicos que essas celebridades possuem também ajudam muito na circulação da música. "Para a Danny, por exemplo, lancei a proposta assim que ela terminou um namoro, pois foi quando vi a oportunidade de ter uma música de acordo com o que ela vinha passando. Muita gente acompanha o que eles passam. Isso ajuda muito na audiência, no lançamento. Com certeza, esse é o futuro dessa cena. A música é uma questão de surpresa, né? Não existe fórmula do sucesso, mas podemos dizer que a música precisa caminhar com a surpresa", finaliza.