Qual é a importância do Circo? Conheça histórias de artistas circenses
A data foi escolhida em homenagem a Abelardo Pinto, o palhaço Piolin, que nasceu em 27 de março de 1897
Antes mesmo de nascer, Gardênia Alves, ou simplesmente Tita, tinha uma tradição a carregar: a do circo. Descendente de peruanos, a diretora e apresentadora do Circo Alves, um dos mais tradicionais em circulação em Pernambuco, carrega uma cultura centenária que nasceu oficialmente em 1903, em Minas Gerais. "O circo é 365 dias do ano para eles (a família). Nós nascemos nele, nós crescemos nele, crescemos no circo e vivemos nossa arte 24 horas por dia, 365 dias por ano", assim ela define sua rotina com o espetáculo debaixo da lona. Assim como a companhia da família Alves, outros circos têm um papel fundamental na cultura brasileira. Itinerantes, chegam com arte em locais que nem o poder público chega. É, às vezes, a única fonte cultural de comunidades rurais e periféricas de cidades com diversas dimensões urbanas.
É com esse objetivo que é comemorado neste 27 de março o Dia Nacional do Circo, como uma forma de de celebrar os circos itinerantes e valorizar os artistas independentes que trabalham com artes circenses. A data foi escolhida em homenagem a Abelardo Pinto, o palhaço Piolin, que nasceu em 27 de março de 1897. Ele foi um artista brasileiro reconhecido no mundo todo, tendo visibilidade pela sua habilidade cômica, além de ginasta e equilibrista. Apesar do não reconhecimento mundial como Piolin ou até mesmo valorização financeira e política, artistas tentam manter essas vivas no País. Seja pelo seu valor social - em atingir grandes camadas que outras artes, talvez, não consigam -, seja pela multidisciplinaridade em agregar outras expressões artísticas, o circo está presente no cotidiano de milhões de brasileiros.
Tita Alves enfatiza as tradições que são repassadas nos circos itinerantes. Como são de gerações familiares, as lonas funcionam como um teto para grandes escolas artísticas. Ali, desde cedo, os artistas aprendem as expressões de artes que são ensinadas por seus familiares. "Nós somos muito, difícil de contar que porque somos itinerantes e muitos no País", conta Tita, que também é de uma das famílias tradicionais. "Meus netos estão nascendo, meus bisavós já eram artistas. Não somos de lugar nenhum. Nós somos da arte, como costumamos dizer. Eu sou apaixonada por qualquer tipo de arte desde pequena. Por isso dei essa entrada. Além de ser apaixonada pela minha arte e ser circense, eu sou uma apologista da arte", explica Tita.
Com o envolvimento na arte, Tita enfatiza que começou a lutar pelos direitos da classe e a incentivar os amigos a também reivindicarem direitos. "Eu comecei a engajar pelo circo e ir em todos os circos que eu podia ir dos amigos. Falar assim: 'nós temos direito'. E também comecei a cadastrar no sindicato, incentivei a inscrever projetos culturais. Por isso, hoje sou uma das referências nas artes circenses aqui em Pernambuco por engajar pela classe. Falar comigo é falar mais do que a arte, mas um projeto de vida", pontua.
Trupe independente
Os artistas João Lucas Cavalcanti e Vitor Lima passaram a se aprofundar nas artes circenses em 2014, quando participaram do Projeto Pirueta. "Eu trabalhava como ator e acabei querendo trabalhar com circo como ferramenta para incrementar meu trabalho como ator. Mas acabou que o circo foi tomando mais espaço e hoje eu trabalho mais com artes circenses do que com o teatro em si", explica Vitor, que fundou a Cia Devir com João Lucas naquele mesmo ano. "Começamos a Cia Devir em 2014, que foi quando decidimos trabalhar com o circo de forma profissional e fazer cursos por aqui mesmo", aponta João.
Após decidirem aprofundar nas artes circenses, os dois estudaram em Londrina e depois fizeram um curso na Escola Nacional de Circo, no Rio de Janeiro. "Temos uns projetos ainda a apresentar. Assim que a gente voltou, apresentamos uma pesquisa no Teatro Hermilo Borba Filho, que envolvia uma mistura de linguagem audiovisual e circo, foi bem interessante. E agora a gente está desenvolvendo uma pesquisa no aparelho multicordas, que são esses algodões trançados, e a gente usa nosso repertório e usa ele para fazer movimentações", explica João.
"Enquanto linguagem circense, eu acho que existe um imaginário muito grande do que é circo muito atrelado à lona, aos circos que vão às cidades e do viajante. Essa itinerância que o circo carrega até hoje, porque existe um fluxo de artistas que se movimentam, acho que isso permanece. Mas há hoje em dia várias vertentes do circo. A gente se considera dentro da linguagem do circo como circo contemporâneo, justamente esse circo que busca outras ferramentas de trabalho. Não que esse circo mais clássico tradicional não dialogue. Porque o circo é conhecido justamente porque tem essa relação com a dança, o cinema surgiu dentro do circo, mas a gente trabalha com essa pesquisa com outras linguagens. A gente gosta de trazer essa espontaneidade para cena, uma dramaturgia pouco mais biográfica, porque a gente gosta de colocar nossas marcas como humanos", frisa Vitor sobre a vulnerabilidade em cena.
Formação
Se o próprio circo é uma escola para companhias itinerantes, hoje há vários desses espaços espalhados pelo País. No Estado, há a Escola Pernambucana de Circo, localizada no bairro da Macaxeira, Zona Norte do Recife, o local de aprendizagem atende crianças e adolescentes dos bairros do entorno. Fátima Pontes, coordenadora executiva da escola, pontua que a pandemia atenuou as desigualdades para os artistas circenses. "A gente não o orçamento onde os serviços que a gente faz enquanto circo, como espetáculos oficinas pedagógicas, recepções de festas mantinha 40% do orçamento para a manutenção da estrutura. Nós temos um prédio grande, que requer muitas manutenções e nenhum edital banca isso", afirma, pontuando coisas que pesam no orçamento do espaço.
"Temos uma agenda puxada, mas com poucos recursos para o que temos que fazer. A gente tem que estar aí fazendo na corda bamba, se virando nos trinta, para dar conta de fazer com poucos recursos. A gente atende muito mais crianças e jovens da periferia da zona norte da cidade. Trabalhamos com todas as modalidades com crianças, adolescentes e os jovens. As crianças e adolescentes trabalhamos com uma formação social e pedagógica", explicou Fátima, que é uma referência na metodologia do circo social.