Entrevista Karol Conká

"Consegui dar meu melhor estando na pior"

Assim que foi eliminada do "Big Brother Brasil 21" com rejeição recorde (99,17%), Karol Conká, ainda no estúdio do programa, pediu perdão ao público e lhe disse que procuraria terapia. A rapper cumpriu e está de volta aos palcos e ao público analisada e — conta — curada. "Urucum" é o título do disco e da turnê que a traz de volta — pois urucum tem propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes. As novas músicas foram compostas entre sessões de terapia e horas de estúdio junto com o produtor baiano RDD. Suas letras cantam sobre a experiência do 'BBB', mas sem tristeza. Na entrevista que segue, feita por telefone, me disse, mais de uma vez, que foi tudo aprendizagem. Nesta sexta-feira (29), ela reencontrará o público recifense na festa Batekoo, coletivo que tem garantido som e palco para a música e os artistas pretos e LGBTQIA+.

Romero Rafael
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Romero Rafael
Publicado em 28/04/2022 às 0:00
JONATHAN WOLPERT/DIVULGAÇÃO
Karol Conká - FOTO: JONATHAN WOLPERT/DIVULGAÇÃO
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JC - Karol, você está retornando aos palcos e ao seu público de uma forma duplamente especial, imagino. Primeiro, porque estamos, de fato, na volta aos eventos desde o início da pandemia. Segundo, porque você está podendo reencontrar seus fãs depois das ondas muito altas que se levantaram desde o Big Brother Brasil 21.

KAROL CONKÁ - Nossa! Esse reencontro tem sido como uma vitamina. Estou me sentindo nutrida, bem recebida e muito grata por ter a chance de poder me renovar e me reconectar com a galera segurando a minha mão, me apoiando e me reconhecendo como artista e ser humano. É muito legal receber esse tipo de apoio e acolhimento. Contribui muito para a melhora da pessoa que eu sou e traz muito carinho ao meu coração. Eu fico muito emocionada toda vez que subo ao palco e eles estão gritando, cantando. A arte salva, mas o amor é que cura mesmo.

JC - Incomoda, depois de um ano e de outra edição já encerrada [o 'BBB 22', que acabou terça-feira, 26], ter que continuar falando da sua experiência no 'BBB'?

KAROL - Não me incomodo, tudo bem as pessoas comentarem. Foi uma coisa muito forte, intensa, e todo mundo viveu aquilo junto, de certa forma. Sempre falo de maneira bem transparente, porque acho importante dissolver os assuntos — se falam é porque há dúvida, e eu estou com disposição para dividir o meu aprendizado.

JC — Você acha que, num momento breve, a gente vai conseguir dissociá-la dessa experiência?

KAROL - Acredito que sim; o tempo vai passando e a gente vai vivendo novas coisas. As pessoas vão saturando da mesmice, e o que fica são os aprendizados de toda essa experiência. Em breve eu serei dissociada por causa da minha arte, das coisas naturais da vida, e porque as pessoas terão outros assuntos.

JC - Com Urucum, você faz seu grande retorno à carreira. Sobre as letras, a gente entende que elas têm a ver com a experiência no 'BBB'. Mas não é mais naquele lugar triste de Dilúvio, música lançada depois da sua saída do programa. É isso mesmo?

KAROL - Esse disco representa um mergulho na intensidade das minhas emoções e uma conexão com a minha própria essência. Eu deixei as minhas personas se expressarem — das músicas mais calmas às mais agitadas —, como eu me sinto nos meus estados de espírito. Deixei minhas quatro personas, a Karol Conká, a Karoline [seu nome de nascimento], a Mamacita [a mulher poderosa que entrou no 'BBB'] e a Jaque Patombá [apelido ganhado quando estava no confinamento], cantarem no álbum. Através da terapia, eu entendi que é natural do ser humano ter temperamentos em situações diferentes. No meu processo terapêutico, fiz as pazes com a vulnerabilidade e trouxe isso para a produção do álbum. A gente, no estúdio, embarcava nas minhas descobertas de sensações e climas, e acabava naturalizando elas.
O nome, urucum, eu escolhi por último, quando todas as faixas já estavam prontas. Cheguei a ele pelo fato de me sentir muito curada nesse processo produtivo. Conforme fui compondo, me senti curada, perdoada, em constante aprendizado e autoconhecimento. Isso me trouxe a cura das feridas.

JC - A música, então, te curou?

KAROL - A música me cura desde pequena. Meu refúgio é cantar, musicalizar as dores e descobertas. Quando eu estava passando por esse momento de mergulho na vulnerabilidade, musicalizar era o que me trazia alívio. Quando eu vi que tinha um álbum pronto, percebi o quanto eu estava viva ainda, o quanto eu consegui dar meu melhor estando na pior. Mostra a força que o ser humano tem de se renovar e de se entregar à humildade para aprender. Fui tocada pelo acolhimento das pessoas que tiveram empatia comigo, e assim pude me curar das feridas e parar de ferir.

JC - Você ainda sente alguma animosidade do público que te cancelou?

KAROL - Acho que já passou, estou bem tranquila e não sinto nenhum fragmento negativo quanto a essa experiência. Hoje, me sinto muito grata. Acho que foi um privilégio poder ter tido meus erros expostos, com tanta gente me ajudando a percebê-los e incentivando a procurar terapia, para seguir com saúde mental e fazendo a minha arte. Essa experiência me trouxe esse tipo de percepção.

JC - Voltando ao Urucum, acredito que a sonoridade dele também te ajuda a recomeçar, porque deu uma mexida no seu som, com toda a mistura de trap, reggae, pagodão baiano, baião...

KAROL - Foi algo bem orgânico. A gente não tinha um planejamento de como seria o álbum, foi tudo feito de forma espontânea. Cada dia eu estava com uma sensação, num 'mood' diferente, um humor. 'Ah, hoje eu quero fazer uma música que fala sobre calma'. 'Calma', eu digo, foi a Karoline que escreveu para a Jaque Patombá, e a Jaque escreveu 'Cê Não Pode', que é sobre cancelamento, para a Karoline (risos). A gente foi brincando conforme fui fazendo minhas terapias. Então, foi tudo de forma intuitiva, com a sonoridade que carrego comigo há muito tempo.

JC - Como é o show de agora?

KAROL - Canto músicas do álbum Urucum e também sucessos antigos. Trago um visual bem 'urucunzado' (risos), um vermelho intenso, e também mensagem no telão. Gosto de manter o mesmo clima do álbum, que traz umas carrancas — que são de proteção, para proteger de energias que desconectam a gente da nossa essência. Esse show está com essa energia, com muito vermelho e batucada. E eu estou bem feliz e satisfeita com esse momento. Estou me sentindo vermelha — que é a minha cor favorita —, de tanta intensidade. Como se eu tivesse retomando com mais vontade de viver, de aprender, de estar e ser quem eu sou.

JC - É simbólica a sua volta aos palcos pela festa Batekoo, que enaltece a música e os artistas pretos e LGBTQIA .

KAROL - Minha história com a Batekoo é antiga. A gente tem esse clima de família e não poderia ser diferente, nessa retomada, eles terem vindo junto comigo. Após a minha saída do 'BBB' sempre deixaram claro o apoio e a parceria. Isso foi muito importante para mim e o público que acompanha o nosso trabalho. Porque, afinal de contas, tem um público que conversa com a minha arte, e esse público sempre esteve do meu lado.

JC - Está ansiosa para voltar ao Recife?

KAROL - Eu estou louca para encontrar todo mundo no Recife. Abraçar, conversar, dar risada, curtir muito e cantar muito Urucum. Espero que esse show traga bastante reflexão e que todo mundo saia dele se sentindo revitalizado, cicatrizado, 'urucunzado'.

 

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