ARTES VISUAIS

Escultor com cinco décadas de criação, Ascânio MMM expõe pela primeira vez no Recife

Artista português radicado no Rio de Janeiro apresenta oito obras na mostra "Geometria Oscilante", na Amparo 60

Romero Rafael
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Romero Rafael
Publicado em 07/09/2022 às 22:37 | Atualizado em 08/09/2022 às 19:23
THALES LEITE/DIVULGAÇÃO
ESCULTURA Ascânio MMM traz oito obras das mais recentes em suas cinco décadas de arte - FOTO: THALES LEITE/DIVULGAÇÃO
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"Ascânio, tem algo mais que você queira dizer?", pergunto antes de encerrar a entrevista por chamada de voz feita pelo WhatsApp. "Eu estou impressionado com a altura dos prédios da praia de Boa Viagem. Não sei como a Prefeitura deixou fazer esses prédios à beira-mar. Eu estou impressionado."

Meu interlocutor é Ascânio MMM, escultor com cinco décadas de trabalho artístico, que havia visitado o Recife, pela última vez, no início dos anos 90, e está de volta agora para sua primeira exposição individual na capital pernambucana: Geometria Oscilante, que abre nesta quinta-feira (8), a partir das 19h, na galeria Amparo 60, em Boa Viagem.

Ascânio MMM é, além de artista formado pela Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro, um arquiteto — o que ilustra seu estado boquiaberto para os prédios erguidos na orla de Boa Viagem. Não que só arquitetos deem conta de que um paredão de concreto em frente a uma praia seja contra a lógica urbana, a estética, os ventos e o sol.

Mas bem, importa dizer que a arquitetura é fundamento para o olhar e a criação deste artista visual. "Falo sempre que, se eu tivesse feito só o curso de artes plásticas e história da arte, não teria chegado ao estágio em que eu estou. O curso de arquitetura foi muito importante para o desenvolvimento do meu trabalho."

Arte feita de alumínio

 

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Ascânio MMM traz oito obras das mais recentes em suas cinco décadas de arte - THALES LEITE/DIVULGAÇÃO

Em seu estágio atual, o artista arquiteta esculturas de chão e parede a partir de alumínio. O material entrou em seu ateliê, no Rio (onde vive desde 1959, quando chegou de Portugal, onde nasceu), a partir dos anos 90. À época, teve de criar uma obra para fixar em via pública, e então recorreu a algo mais resistente do que a madeira, com que trabalhava e ficou conhecido.

Quando não está em viagem (antes do Recife, expôs no MON, o Museu Oscar Niemeyer, em Curitiba), Ascânio MMM recebe em seu ateliê barras de alumínio de seis metros, que manuseia, cortando, furando, parafusando, com a ajuda de quatro jovens formados naquele espaço (e que entraram sob a condição de estarem matriculados e frequentando o Ensino Médio).

Aos 80 anos (e prestes a completar 81, no próximo dia 16), ele cumpre uma rotina de trabalho de segunda a sexta, das 10h às 16h. Foi nessa lida, já neste ano, que criou as obras reunidas na exposição do Recife, Geometria Oscilante. São oito trabalhos, duas esculturas de chão e seis de parede, medindo de 70 x 70 a 1,20 x 1,20 m. Todas de alumínio.

"Hoje, a minha obra é toda de alumínio." Nem por isso se define condicionado. "Com a minha idade, eu sou um dos poucos artistas que está inventando a cada dia coisas novas. Eu não estou acomodado." Cogita, inclusive, trabalhar com outro material:

"O alumínio nunca foi estranho para mim, ele é muito usado na arquitetura, mas não sei se amanhã eu volto a continuar a fazer tudo de alumínio. Eu estou sempre aberto a novas invenções."

Um artista construtor

O arquiteto tem criado, nessas décadas todas, movido pelo processo da obra, e não pela obra em si. Indício disso é que ele não só desenha as peças, mas as executa, ou supervisiona a execução no próprio ateliê — é comum que seja o contrário: o artista desenha um projeto ou faz uma maquete e envia a uma oficina que executa o trabalho.

"Há uma coisa no meu trabalho — e isso é muito importante", introduz. "Eu invento as peças e construo. Esse percurso é muito importante para mim: sempre há questões a serem resolvidas nessa execução", completa, com a práxis de um arquiteto que pensa em resoluções para a arte.

É a chamada relação corpórea que Ascânio MMM mantém com a arte, em que há um embate do artista com o material.

Embora a obra dele leve a falar de materiais e processo de construção, o que remete à rigidez da construção civil, ela pretende outra coisa. "Suas obras não se pautam numa discussão sobre massa ou volume; são translúcidas porque querem, exatamente, criar agenciamentos, embates e encontros entre elas e o corpo do espectador. Querem ser atravessadas, tocadas, usadas assim como desejam ser percebidas como projeções virtuais no espaço", escreve o curador da mostra, Felipe Scovino.

"As obras de Ascânio trazem essa ideia de participação. O público precisa se locomover, precisa observar a peça de vários ângulos, perceber suas possibilidades", registra o curador.

E assim é ainda mais compreensível que Ascânio MMM se abisme diante dos espigões da orla de Boa Viagem, construções com que não há diálogo — só se impõem como grande massa ou volume.

Primeira exposição no Recife

Ascânio MMM já havia recebido dois convites para expor na capital pernambucana: nos anos 1980, no Rio de Janeiro, ele conheceu a arquiteta pernambucana Janete Costa, de quem se aproximou e quem o convidou. Agora, o artista pertence ao casting da Amparo 60, da galerista Lúcia Costa Santos, filha de Janete. "Estou com a sensação de que estou respondendo ao pedido de sua mãe."

Geometria Oscilante permanece em cartaz até o 16 de outubro na Amparo 60 (3º andar da Dona Santa, à Rua Professor Eduardo Wanderley Filho, 187, Boa Viagem). A galeria está aberta à visitação de segunda a sexta, das 10h às 19h, e aos sábados das 10h às 15h.

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