MÚSICA

Anitta desperta intolerância religiosa ao celebrar o candomblé em clipe

'Aceita' integra o mais recente álbum da cantora, "Funk Generation", que tem a proposta de resgatar as suas raízes

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Emannuel Bento

Publicado em 14/05/2024 às 17:31 | Atualizado em 15/05/2024 às 20:49
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A cantora Anitta perdeu mais de 200 mil de seguidores após publicar imagens de práticas do candomblé de seu novo clipe, "Aceita", lançado nesta terça-feira (14). Envolvendo uma das maiores estrelas da música do País, o caso voltou a acender a discussão sobre intolerância religiosa.

A própria artista quem apontou a queda no número de seguidores. "Ainda fico um pouco assustada com a falta de evolução do ser humano. Nos dias de hoje ainda é um retrocesso tão grande nesse sentido de aceitar, entender, respeitar os caminhos das pessoas", disse, em rápida live no seu Instagram.

"Ainda fico assustada como vai passando o tempo e o ser humano está mais intolerante ao invés de estar aceitando mais, de estar respeitando", refletiu Anitta.

Anitta e candomblé

A carioca já havia revelado ser praticante da religião há alguns anos, mas é a primeira vez que o candomblé ganha tamanha dimensão em sua obra artística. O clipe mostra o cotidiano em um terreiro no município de Magé, na Baixada Fluminense.

"Na tradição do candomblé, eu sou filha de Logun Edé, que é um orixá mega complexo. Sensível e bravo, inteligente e esperto, carinhoso e pragmático… Essa música traduz essas características pro meu universo, na minha história", explica a cantora.

Henrique Tenório, pesquisador e doutorando em Comunicação na UFPE, comenta que Anitta possui uma plataforma midiática muito ampla, o que acaba mobilizando discursos de ódio. "O Brasil é marcado pela intolerância religiosa e pela predominância das religiões cristãs. O racismo faz com que tudo o que seja ligado à cultura negra seja considerado 'ruim', demonizado e que precise ser eliminado."

Anitta reivindica raízes em novo disco

Ricardo Brunini/Divulgação
Anitta no clipe de 'Aceita' - Ricardo Brunini/Divulgação

"Aceita" integra o mais recente álbum de Anitta, "Funk Generation", o seu primeiro lançamento pela Republic Records - após uma saída conturbada da Warner Music por uma "falta de liberdade artística".

O projeto tem como proposta resgatar as raízes do funk do início de sua carreira, impulsionando essas estéticas para o mercado internacional.

"Neste contexto, Anitta se reafirma enquanto uma mulher poderosa que toma as rédeas das coisas que são faladas sobre ela, como uma pessoa que superou muitos obstáculos e as críticas não têm um poder de tirá-la desse lugar", diz Henrique.

"As imagens de 'Aceita' trazem essa Anitta mais vulnerável, que está vivendo um momento de conexão com o candomblé. O 'mostrar o corpo', que é tão alvo de críticas conservadoras, vai ser retirado do lugar da sensualidade para ser colocada no lugar de vulnerabilidade e relação com a religião. O clipe de 'Aceita' posiciona Anitta de uma forma política."

Religiões afro e música popular

Ricardo Brunini/Divulgação
Anitta no clipe de 'Aceita' - Ricardo Brunini/Divulgação

As religiões de matrizes africanas estão muito presentes em diversos ritmos da cultura popular de massa, como samba e axé, além de clássicos da MPB.

Artistas mais contemporâneos do rap, como Emicida, Baco Exú do Blues e Don L, além de cantoras como MC Thá e Luedji Luna, também fazem constantes referências às religiões afrobrasileiros em suas obras.

Pesquisadores já apontaram que até mesmo o 'tamborzão' do funk, ritmo exaltado por Anitta, teria na sua base rítmica sonoridades presentes em terreiros afros.

Apesar dessa ligação, Henrique Tenório lembra que "Aceita" não é uma música que traz o candomblé em sua letra. "É uma relação imagética, na verdade. A canção fala sobre Anitta estar centrada em si mesma, numa autoafirmação."

"No clipe, Anitta se reafirma como parte do candomblé por uma função política, para mobilizar discursos e trazer alguma visibilidade. Mas, o candomblé, nesse sentido, não precisa dela, como se fosse necessário que ela fizesse isso. Porém, é importante que ela demarque uma posição."

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