Em tempos que não vão muito longe, o estúdio caseiro servia basicamente para o artista gravar demos, ou seja, esboços das músicas que depois seriam trabalhadas num estúdio profissional, particular ou de gravadora. Aí valendo para compor o repertório de um disco. Nesta pandemia, praticamente todos os discos lançados foram realizados em estúdio caseiros. Um destes foi lançado nessa sexta-feira, 20 de novembro, por Elba Ramalho, Eu e Vocês, título de uma toada assinada por Juliano Holanda e Zélia Duncan (Zélia, por sinal, grava um disco inteiro de canções feitas em parceria com Juliano, um os autores mais requisitados atualmente na música brasileira).
“este disco surgiu nesta reclusão involuntária, mas que acabou trazendo frutos bons para muitas pessoas. A gente se improvisou criando novas perspectivas de trabalho. Como tenho um estúdio em casa, sou cantora, e gosto de gravar, por que não gravar um disco? Começamos a conversar e tocar o trabalho pra frente, fui concebendo o repertório. Começamos com a ideia de gravar uma musica minha e de Luã”, explica Elba Ramalho que, pela primeira vez gravou com o filho, uma composição feita pelos dois, Ainda Tenho Asas”. Uma gravação que tem um sabor especial para Elba e Luã, que lhe deu a primeira neta, uma menina chamada Esmeralda, nascida em abril, no auge da quarentena. Ela gravou também uma composição do filho, De Onde Eu Vim. Com Luã, que assumiu a produção do disco, Elba Ramalho gravou as bases de voz e violão, e enviou para os músicos que tocam com ela, no Rio e no Recife.
O disco tem o clima desta época atípica, e a música que mais reflete isto é a que batiza o álbum, a citada Eu e Vocês, ou seja, Elba e o filho (ao violão) e as três filhas, Maria Clara, Maria Paula, e Maria Esperança. Mas o trabalho não ficou restrito ao ambiente familiar. Elba conta com mais duas participações especiais, do sanfoneiro Mestrinho, em Eu Vou Chegar Chegando (Mestrinho), e do Padre Fábio Melo, em O Inverno É Você (Dominguinhos), lançada por Mestrinho há três anos).
DISCO
Um álbum que lembra Balaio de Amor, de 2009, um trabalho que a aproximou do novo forró nordestino (o autêntico), colhendo composições que se atinham até então à região. É o que faz aqui em, por exemplo, Pra Você Voltar Pra Mim, de Dorgival Dantas (mais conhecido por fornecer músicas para bandas), xote romântico que fez sucesso com Flávio José, Ter Você É Ter Razão (Dominguinhos/Climério), lançada no inusitado encontro de Tim Maia e Os Cariocas, que resultou o álbum Amigos do Rei (1997), e que a própria Elba já havia gravado numa participação de um disco de Maurício Mattar (que é o pai de Luã). Álbum também que não tem a urgência de um projeto feito para servir como esteio a uma turnê, ou show de teatro.
O repertório é amarrado com canções de aparentes distanciamentos estilístico. Maçã do Rosto (Djavan), com Sintonia (Moraes Moreira/Fred Góes/Zeca Barreto), ou Felicidade (Chico César/Marcelo Jeneci), numa maioria de xotes românticos, o ritmo que predomina no forró feito no Nordeste, bem representado por Já Com Saudade, (Cezzinha e Clodô Ferreira), ou Seu Olhar Não Mente (Nanado Alves/Ilmar Cavalcanti), lançada há vinte anos por Flávio José. Eu e Vocês navega em águas plácidas, sem a exuberância rítmica que Elba leva ao palco com altas voltagens de energia, é despretensioso e serve para aplacar a saudade que a cantora sente de cantar diante do público, e do público que se ressente de vê-la ao vivo. E não se sabe quando os dois voltarão a se encontrar presencialmente. Elba revelou que ela e parte das pessoas da casa contraíram covid-19 em setembro, estão todos restabelecidos, porém cada vez mais precavidos.
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