OPINIÃO

Em "Harry's House", Harry Styles apresenta trabalho coeso conduzido por suas fragilidades e preocupações

"Harry’s House", o terceiro álbum de estúdio do cantor britânico Harry Styles, parece cumprir o que ele tem tentado articular em seu trabalho desde 2017

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Lívia Maria

Publicado em 19/05/2022 às 23:24
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Em 2017, quando Harry Styles lançou seu primeiro álbum solo homônimo, fomos apresentados às suas referências musicais e estéticas. Dois anos mais tarde, em “Fine Line” (2019), o cantor mergulhou de cabeça no seu repertório e nos deu mais amostras do que está por trás da sua já bem sucedida carreira solo, fazendo uma das coisas mais difíceis da indústria: transacionar do papel de ídolo adolescente (Styles é ex-integrante da boyband teen One Direction) para um artista maduro.

Entretanto, é com “Harry’s House” (2022) que Styles encontra espaço para se despir de suas inibições - quase que literalmente, como acontece em uma das cenas do clipe do primeiro single “As It Was” -, baixando a guarda ainda mais e deixando que suas fragilidades e preocupações sejam o fio condutor de um trabalho que se apresenta coeso e honesto desde o começo.

O título do álbum serve a seu propósito óbvio: Harry Styles abre a porta da frente de sua casa e nos convida para um café - ou vinho tinto, como ele deixa claro ser sua preferência em uma das músicas. Mas, “Harry’s House” é primeiramente o título da canção experimental de 1975 de Joni Mitchell, “Harry’s House/Centerpiece”, que mistura jazz e folk. E enquanto referência, o título do terceiro álbum de Styles funciona como um prenúncio de um trabalho mais elegante e refinado, mas também mais aconchegante e íntimo.

Se a “Harry’s House” de Mitchell foi, um dia, referência de um lugar físico real, a de Styles é mais uma coleção de situações, histórias e pessoas: todas as quais Harry irá contar sobre ao longo das 13 faixas do álbum.

"Você está em casa"

Na música de abertura do álbum “Music for a Sushi Restaurant”, Styles canta sobre olhos verdes e longas noites de conversa com seu objeto de desejo. “It's 'cause I love you, babe / In every kind of way / Just a little taste / I love you, baby”, revela, com a voz distorcida e contaminada pela paixão.

É a introdução a uma história de amor do tipo que vira sua vida de cabeça para baixo e onde nada mais importa - e é essa a história que salta aos nossos ouvidos ao longo do álbum, mesmo que pontuada por toques de melancolia, que aparece nas músicas mais animadas como “As It Was”, “Matilda” e “Little Freak”.

Harry’s House” narra um romance que é um diálogo esperançoso entre duas pessoas em pé de igualdade, mas frágil, porque há sempre individualidades em jogo que ameaçam quebrar o equilíbrio do relacionamento. Em “Daylight”, ele questiona se seu objeto de afeto, que eventualmente partiu, ainda sente saudades suas ao mesmo tempo que pinta uma cena em que, com o nariz sangrando, lembra-se quando a misteriosa pessoa usava cocaína na sua cozinha. Cada uma das músicas do terceiro álbum de Styles aborda a fascinação e atração, sugerindo uma obsessão que pode ser, às vezes, perigosa.

Sonoramente, o terceiro trabalho do artista utiliza os sintetizadores e metais de forma brilhante, muitas vezes mergulhados em batidas de synth-pop e R&B. Styles e sua competente equipe de produção costuram ritmos, poesia e metáforas em um álbum que pode ser muita coisa: jazz ou rock, passando pelas boas músicas que tocam em salas de espera do psicólogo. Se no título anuncia uma referência à Mitchell, conhecida pelas experimentações musicais, o cantor faz jus ao caldeirão de referências que une em seu trabalho de forma hábil.

Apesar de uma aparente “dureza” do trabalho, Styles tem garantido pelo menos mais alguns hits massivos do seu terceiro álbum para 2022. Afinal, ouvir o “Harry’s House” nos dá a sensação de estar ouvindo o cantor recontar uma série de encontros românticos a um amigo. É íntimo, mas compreensível; complexo, mas fácil de ouvir.

A casa, para Styles, pode ser uma coletânea de experiências, mas com “Harry's House”, ele fez um álbum que parece o “pequeno chalé” cantada por Mitchell; um lugar onde você “pode realmente encontrar liberação”, relaxar e processar o seu dia.

O terceiro álbum de Styles é como uma aventura romântica de verão passageira, mas também sedimenta a predileção do artista por longos dias do verão, onde tudo que se quer fazer é deitar em espreguiçadeiras em boa companhia, com um drink na mão e se deleitar em um torpor de vitamina D.

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