A crise causada pela pandemia do novo coronavírus trouxe resultados péssimos para o mercado de trabalho. Os números de pessoas desempregadas seguem altos, apesar de dar sinais de que começam a recuar. O Brasil perdeu quase 11 mil vagas com carteira assinada no mês passado, número inferior ao registrado em maio (-350.303). Com o resultado, junho teve 16% menos desligamentos (166.799) e 24% mais admissões (172.520) do que o mês anterior. Ainda assim, mais de 1,5 milhão de postos de trabalho foram fechados no país, desde março, como apontou o Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged). Já segundo o IBGE, a taxa de desemprego ficou em 12,9% no trimestre encerrado em maio, atingindo 12,7 milhões de pessoas.
» Quase 74 mil postos de trabalho foram fechados em Pernambuco durante a pandemia
No entanto, na contramão desse cenário, cresce uma categoria profissional que trabalha por conta própria, muitas vezes tendo o lar como escritório, acerta seu horário conforme é conveniente, convive com pessoas diversas o tempo inteiro e, muitas vezes, precisa lidar com a imprevisibilidade e ter um controle financeiro bem acima do comum. “A pandemia acelerou um processo que já estava em curso nas empresas há pelo menos três anos. A flexibilização das leis trabalhistas em 2017, a aceleração do modelo de home office e a quebra de paradigmas de gestores no home office contribuíram também”, diz o consultor de carreiras, Diego Nogueira.
De acordo com a Workana, plataforma de mercado para trabalho freelancer e remoto, durante a pandemia, em todo o país, houve um crescimento de 38,9% no número desse tipo de projeto na plataforma. Só em junho, foram 37,1 mil novas pessoas se dedicaram aos “freelas” total ou parcialmente. Globalmente, a empresa, que contava com 2,8 milhões de profissionais cadastrados em fevereiro, viu o número saltar para 3,2 milhões durante o isolamento social. Desses, metade é de brasileiros.As áreas com maior aumento de demanda de expertises para profissionais temporários são engenharia e manufatura, finanças e administração, tradução e conteúdos e TI e programação.
Quando o coronavírus chegou, houve uma retração na busca por freelancers, mas isso mudou com o passar dos meses. É o que diz o country manager da Workana no Brasil, Daniel Schwebel. “No início, muita organização deu uma pausa nos novos projetos. Depois, vieram as demissões para reduzir custo. Agora, há um número grande de empresas que está vendo que, mesmo com mão de obra reduzida, precisa entregar produto e serviço para se manter de pé. E aí viram no mundo freelancer uma oportunidade", afirma Schwebel.
» Com chegada do coronavírus, empresas inovam no treinamentos e educação corporativa
Ainda de acordo com a Workana, a resposta dos profissionais é mais vantajosa para o mercado freelancer. Para os trabalhadores tradicionais, durante a crise, o home office foi avaliado como ótimo ou bom por 58%, enquanto a avaliação dos freelancers chegou a 77%. "Uma das principais vantagens dos freelancers é que eles estão acostumados a se adaptar rapidamente frente aos diferentes desafios enfrentados, pois esses profissionais já estão acostumados com o fato de todos os aspectos de seu trabalho estarem 100% sob sua responsabilidade, como prazos, entregas, volume de trabalho e renda", defende Daniel.
» Home office foi adotado por 46% das empresas durante a pandemia
Há pessoas que trabalham como freelancers há muito mais tempo para ter uma renda extra. Esse é o caso do analista de sistemas João Santorini, 29 anos, que aderiu às plataformas de recrutamento de profissionais freelancers há quase seis anos. Ele já trabalhava com programação em uma empresa de tecnologia, mas viu no ‘freela’ a oportunidade de aumentar a renda. "Decidi aderir a essa modalidade para conseguir clientes, fazer um portfólio e também ganhar know-how", afirma ele, contando que muitas vezes, esses clientes acabam se tornando fixos, ao recorrerem novamente em busca de outros serviços do profissional.
Segundo o desenvolvedor, conseguir um projeto no começo é mais difícil, já que a concorrência é com muitos candidatos e não se é conhecido no site. As empresas fazem uma espécie de ranking por meio de qualificações de clientes e número de projetos. "No começo você não tem referência, mas se fizer vários orçamentos uma hora dá certo", pontua ele.
Planejamento é essencial
Não ter chefe, escolher como e quando trabalhar parece aventureiro, e é. Mas, ao mesmo tempo, justamente por fugir do modelo tradicional de trabalho em empresas, investir sozinho na própria carreira exige planejamento. Pensar numa previdência privada, poupança para emergências e ficar atento ao Imposto de Renda. Afinal, o freelancer não ganha 13º, férias remuneradas nem FGTS. Esse tipo de profissional também não tem remuneração fixa e depende de oportunidades sazonais.
“Há quem dê muita importância para um salário certo todo mês. Nesses casos, recomendo colocar tudo na ponta do lápis e só atuar como freelancer nas horas vagas ou integralmente depois que perceber que aquilo vai lhe dar renda para cumprir com seus compromissos”, aponta o ilustrador e designer Gibran Gomes, 31. O próprio Gibran seguiu a dica. Ele só conseguiu abraçar a vida de freelas quando notou que já conseguia pagar suas contas com os trabalhos. “É difícil falar sobre a remuneração, porque é impreciso dizer quanto o profissional pode ganhar, mas dá levantar uma boa grana”, garante Gomes.
Para isso, ele afirma um freelancer tem que aprender a se valorizar e valorizar seu tempo. “Muita gente quer orçamento, mas pouca gente está realmente disposta a pagar pelo que estão pedindo”, pontua o profissional, que alerta para importância de saber dizer ‘não’ na hora certa. “Às vezes, é preciso negar trabalhos. Seja porque não querem pagar o que cobramos ou porque não temos tempo suficiente para entregar o contratado. Não adianta se enrolar por não conseguir negar a oferta. Isso pode nos prejudicar”, finaliza.
Comentários