Na pandemia, Jardel Soares, 27 anos, agiu como boa parte da população brasileira. A cada fim de semana, acessava uma lista de lives que estavam sendo transmitidas na internet. Se engana, no entanto, quem pensa que o jovem estava atrás de conteúdos musicais. Recente investidor na Bolsa de Valores, o interesse era por conteúdo de youtubers, influenciadores digitais e analistas que falassem sobre o universo financeiro. O grupo de investidores pessoas físicas, sobretudo mais jovens e de pequenos investimentos, tem ampliado espaço nos últimos anos. Com quase 3 milhões de contas com CPFs cadastrados, a B3 acompanha a evolução dos pequenos investidores, mesmo em cenário adverso, sendo impulsionada pela disseminação de informação nas redes sociais e seus efeitos benéficos ou maléficos para o mercado.
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Motivados pelo patamar histórico da redução da taxa de juros, os brasileiros continuam apostando em maiores riscos para ampliar o retorno dos investimentos. Só na pandemia, entre os meses de março e julho, 900 mil novas contas foram abertas por pessoas físicas, o que elevou o total para mais de 2,8 milhões de contas na bolsa ao fim de julho. Em 2017, a bolsa tinha pouco mais de 600 mil investidores pessoas físicas, alcançando o patamar histórico de 1,6 milhão ao fim de 2019. Em março deste ano, as pessoas físicas tinham um saldo total de R$ 257 bilhões (14% do mercado) na carteira de ações. O volume diário de compra e venda era de R$ 10 bilhões no mesmo período.
“Sem dúvida é uma conjunção de fatores. Além do mercado financeiro ter mudado, principalmente a taxa de juros, que caiu sobremaneira nos últimos anos, saindo de 14,25% ao estágio de hoje (2%), há mais acesso à informação e cultura financeira. O próprio mercado também gerou oportunidades que fizeram com que muitos dos novos investidores, assim que conseguiram começar a poupar, por receber um pouco mais, já começassem a entrar na Bolsa”, avalia o especialista em investimentos e coordenador de pós-graduação da FECAP, Marcelo Cambria.
Essa conjunção de fatores impulsionou a entrada de jardel no universo da renda variável. “Era uma coisa que sempre sabia que existia, mas eu não tinha o conhecimento que julgava necessário. Fui muito influenciado por amigos que começaram a ser bombardeados por anúncios de corretoras e conteúdos em redes sociais. No Twitter, Instagram ou Youtube há verdadeiros nichos que geram informação sobre o tema, desde como fazer para começar a investir, até orientar na tomada de decisões. Tenho conseguido resultados bons até então, sem necessariamente fazer uso de um volume muito grande de dinheiro”, conta o jovem estudante de administração.
O valor do CPF na Bolsa
No mês de julho de 2020, a Bolsa de Valores alcançou a marca de 2,8 milhões de contas abertas por pessoas físicas, num montante de R$ 382 bilhões
Em Pernambuco, são 64,2 mil contas (R$ 4,7 bilhões)
Queda de juros e democratização do mercado, com maior acesso à informação têm guiado um movimento de adesão dos pequenos investidores
Só na pandemia (entre março e julho) 900 mil contas foram abertas. Dos 223 mil novos investidores (março), 30% fez o primeiro investimento com menos de R$500. Quase 40% foram até R$ 1 mil
Carteiras com até R$ 10 mil representavam 54% dos investidores até o mês de março
Evolução contas pessoas físicas:
2014 - 564 mil
2015 - 557 mil
2016 - 564 mil
2017 - 619 mil
2018 - 813 mil
2019 - 1,6 milhão
2020 - 2,8 milhões (até julho)
Fonte: B3
Se levado em conta o recorte de idade e montante aplicado, os próprios dados da B3 apontam que a faixa etária entre 19 e 39 anos já representa quase 60% dos investidores pessoas físicas. Em 2017, não chegavam a 30%. Só entre os que têm até 24 anos, o percentual saltou de 1% (2018) para 10% até o mês de março deste ano. Dos 223 mil novos investidores de março, pelo menos 30% fizeram o primeiro investimento com menos de R$ 500, contribuindo para uma média do primeiro investimento na renda variável na casa de R$ 1,6 mil. O saldo mediano das aplicações dos investidores com CPFs em março chegou a R$ 8 mil, reduzindo 58% frente 2018, o que reforça a presença dos pequenos investidores.
“Analisamos que, de forma geral, o perfil da pessoa física na bolsa é mais jovem, se preocupa em diversificar seus investimentos e começa a montar sua carteira com valores reduzidos. Eles também têm demonstrado uma visão de longo prazo ao manter suas posições mesmo no auge da volatilidade dos mercados. Além disso, o ticker mais baixo e uma população mais jovem demonstram a mudança geracional de um investidor que busca na renda variável acumular poupança de forma sustentável”, analisa o diretor de relacionamento com clientes da B3, Felipe Paiva.
Riscos
A mudança do perfil geracional também impõe novos desafios ao mercado. Com investidores cada vez mais baseando suas decisões a partir das discussões abertas em redes sociais, a educação financeira e responsabilidade na divulgação de informações, até mesmo pelas próprias empresas listadas na bolsa, são fundamentais. “As informações estão somente por meio de um clique. É muito importante ter responsabilidade para seguir as regras da CVM e da Anbima de acesso à informação. O mercado não pode ser ludibriado, porque uma vez que o mercado não for crível, o que trazido um efeito benéfico pode mudar rapidamente para o mal. Por ora, isso não parece ser uma tendência, mas pode acontecer”, ressalva Cambria.
Os riscos alertados pelo professor podem ser traduzidos, por exemplo, numa supervalorização dos atuais preços dos papéis, levando a uma bolha descolada da realidade que pode estourar posteriormente e resultar em prejuízos. “É importante ressaltar que hoje o leque de informações disponível é muito grande e é essencial que as pessoas estejam cada dia mais atentas não só à qualidade das informações, mas também à credibilidade, reputação e histórico da fonte. Utilizar os profissionais de mercado, das corretoras e bancos, como parceiro das decisões de investimentos é extremamente importante para que o investidor esteja o mais seguro possível”, alerta o diretor da B3.
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