Vacina, reformas e cortes são a cura para economia brasileira em 2021
Economistas analisam o que é preciso o governo federal e o Congresso fazerem para recolocar economia do País nos trilhos
Não é exagero dizer que 2021 será o ano das incertezas. A imunização da população e a capacidade do governo federal de sinalizar que vai colocar em ordem as contas públicas - com a previsão de gastos menores bancados pela União - são as duas grandes variáveis que precisam se concretizar ainda no primeiro semestre de 2021 para que ocorra a retomada da atividade econômica dentro do que está sendo
esperado pelos economistas.
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Independente da instituição, as previsões são parecidas: o Produto Interno Bruto (PIB) deve crescer (entre 2,8% e 3,8%), o preço do dólar (em Real) deve cair, a inflação (medida pelo IPCA) deve ficar em 3,34%, sendo menor do que a registrada em 2020.
A primeira incerteza de 2021 que impacta na economia é em quanto tempo o governo vai conseguir resolver a imunização dos brasileiros. “Ter a vacinação concluída para a maioria da população significa não ter mais medidas restritivas com a abertura ou fechamentos de alguns setores. Isso é fundamental para a produção voltar ao normal em 2021”, afirma o gerente de Relações Industriais da Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (Fiepe), Maurício Laranjeiras.
Caso ocorra essa imunização e a economia volte a crescer, ele acredita que o setor industrial vai precisar contratar mais pessoas no próximo ano, elevando a produção gradativamente por causa do aumento do consumo.
Segundo o economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Joelson Sampaio, caso o governo federal tenha dificuldade em sair da crise sanitária - sem realizar a vacinação contra o coronavírus - ainda no primeiro semestre de 2021, isso pode “impactar”, diminuindo a previsão de crescimento do PIB do ano inteiro. De uma maneira grosseira, o PIB é formado por tudo que se produz num determinado local.
Ainda de acordo com os economistas, paralelamente à imunização, o governo deve mostrar que tem o controle dos gastos públicos. A União gasta mais do que arrecada desde 2015. A principal fonte de receita do governo federal são os impostos e taxas cobrados aos cidadãos. “O governo arrecada de 33% a 36% do PIB e gasta entre 44% e 45% do PIB”, explica o sócio-diretor da Consultoria Ceplan Jorge Jatobá, ex-secretário da Fazenda do governo Jarbas Vasconcelos (MDB).
Ou seja, o governo está pedindo dinheiro emprestado para fechar as contas. “A dívida do governo está crescendo de uma forma acelerada e já está numa proporção de 96% do PIB. Cerca de 1/3 (33%) dessa dívida vence nos três primeiros meses de 2021”, comenta Jatobá.
Em 2021, esse controle dos gastos vai resultar em menos dinheiro da União circulando. Provavelmente, o auxílio emergencial não vai ser pago, já que a liberação da última parcela ocorreu em dezembro. “Para essa diminuição dos gastos do governo não impactar muito a economia, tem que crescer o investimento privado e o consumo das famílias. O problema é que temos um cenário adverso com incertezas, como o atraso na vacina, a eleição para presidente da Congresso Nacional e o mercado percebe tudo isso”, resume Jatobá.
“O governo gastou muito em 2020 e não vai poder fazer a mesma coisa em 2021. O ministro da Economia, Paulo Guedes, vai ser pressionado a flexibilizar os gastos por causa dos interesses políticos eleitorais do presidente Jair Bolsonaro", comenta Jatobá.
A liberação do auxílio emergencial trouxe mais popularidade ao presidente da República, principalmente no Nordeste. Essa pressão sobre Guedes já ocorreu em 2020, liderada pelo ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, que defendeu, várias vezes, um maior gasto da União. E Jatobá argumenta: “Se abrir a porta dos gastos públicos, aumenta a inflação, resultando em recessão. Esse filme a gente já conhece”, se referindo a uma das maiores recessões do País (a de 2015 e 2016) que ocorreu também por causa do aumento dos gastos públicos da União. “Ou enfrenta o risco fiscal ou então vamos ter, neste ano, mais inflação, desemprego e recessão”, conclui.
E, por último, os economistas também afirmam que é importante o Congresso Nacional sinalizar que serão votadas, principalmente, as reformas tributárias - que prevê uma simplificação no recolhimento dos tributos - e a reforma administrativa - tornando os gastos do Estado mais racionais. “O crescimento mais robusto a longo prazo depende do acúmulo de capital (equipamentos e infraestrutura), qualificação de mão de obra e tecnologia. As instituições também têm que ser mais acolhedoras aos negócios, à inovação e à flexibilização”, resume o professor do Insper e economista Fernando Ribeiro Leite.
Desemprego
Mesmo se ocorrer a vacinação e as contas públicas ficarem organizadas, o desemprego deve se manter acima de 14% e neste janeiro deve ultrapassar este percentual, segundo o professor do Centro Universitário Tiradentes (Unit-PE), Edgard Leonardo Lima. “Essa taxa de crescimento do PIB que está prevista (em torno de 3%) não vai recuperar, num primeiro momento, os empregos num patamar antes da pandemia”, comenta.
Ele defende que aqueles que perderam o emprego em 2020 devem num primeiro momento cuidar das finanças em 2021 e se “reinventar”. Ele cita que com o atual cenário será difícil conseguir um emprego que pague o salário no mesmo patamar de antes da atual crise. “Não é pra todo mundo, mas uma parte dessas pessoas pode partir para empreender”, revela.
Edgard argumenta também que o desemprego prolongado também impacta a economia. “Contribui para a perda de produtividade, porque há quadros especializados que não conseguem se recolocar na mesma área e aí uma parte do conhecimento acumulado por aquele trabalhador se perde”, conta. “Também é bom usar esse tempo pra se capacitar, voltar a estudar”, aconselha o economista Joelson Sampaio.
Também existem coisas positivas no cenário de 2021. Edgard Leonardo lembra que a economia mundial deve crescer no próximo ano. “Se o Brasil fizer o dever de casa (cuidando das contas públicas) pode atrair investimentos internacionais em áreas que têm potencial como infraestrutura e ampliar a cadeia do agronegócio”, diz.
Ele também argumenta que o País tem um mercado consumidor de 210 milhões de pessoas e isso também pode ser um grande potencial, caso haja uma sinalização que a economia está andando nos trilhos.