Diesel caro prejudica toda a sociedade. Entenda os motivos
Diesel mais caro significa fretes mais caros, produtos mais caros e dificuldades para transportadoras e caminhoneiros. Mas há possibilidade de melhoria se o governo estabelecer novas diretrizes
Somente este ano, o diesel aumentou de preço cinco vezes. A alta acumulada é de 33,9%. Entre todos os combustíveis, é o diesel que mais influencia na vida da população. O diesel é um dos principais itens de custo do transporte rodoviário de cargas e o Brasil é um País extremamente dependente do modal rodoviário. O resultado é que a alta do preço do combustível recai diretamente sobre o valor do frete, que será compensado com a elevação do preço dos produtos que chegam ao consumidor.
O doutorando em Logística e professor da UniFBV, Paulo Alencar, dá uma visão do peso dos caminhões na economia. Ele revela que cerca de 70% da matriz de transportes brasileira é formada pelo transporte rodoviário. “Dentro da cadeia logística, este é o segundo tipo de transporte mais caro, o primeiro é o aéreo. Ora, se o custo desse transporte aumenta, o valor da carga também aumenta com um impacto final na carga transportada de 7% a 9%”, diz Alencar.
PRESSÃO
O professor acredita que a decisão do governo em zerar os impostos federais sobre o diesel, por dois meses, está longe de resolver o problema e só tem um efeito imediato. Tentar reduzir a pressão social para evitar uma nova greve dos caminhoneiros, como aconteceu em 2018. “A suspensão da cobrança da Cide, e do Pis/Cofins pode fazer o preço do diesel cair em torno de 9% nos postos. Mas, como a Petrobras não dá sinais de que vai mudar sua política de preços, alinhada com o mercado internacional, o próximo aumento que vier irá anular em parte, ou totalmente, a suspensão temporária do imposto”. Para Alencar, o governo agiu com uma medida populista para tentar acalmar os ânimos, mas prejudicou os acionistas, derrubou o valor da Petrobras na Bolsa e não resolveu o problema do combustível caro.
Para Paulo Alencar, a Petrobras não irá mudar sua política de preços. Ele acredita que a solução para a inflação dos combustíveis no Brasil é mais complexa.“ Eu costumo dizer que a solução está nos trilhos”. Para Paulo, se o governo conseguisse atenuar o preço do combustível, somente metade do problema estaria resolvido, porque a dependência do transporte rodoviário continuaria. “O Brasil tem dimensões continentais e, à semelhança de outros países pobres, concentra sua logística no rodoviário. Países desenvolvidos usam mais ferrovias no transporte à longa distância. Aqui, toda fruta do Vale do São Francisco e todo o gesso do Araripe são escoados via caminhão. Em um trem com 110 vagões...cada vagão substitui duas carretas e meia. Nós teríamos 220 carretas a menos no trecho, menos demanda por diesel, um frete menor e uma cadeia logística mais estruturada. Mas nós acabamos pagando mais caro por nossa ineficiência logística”, diz o professor.
DIFÍCIL
Enquanto o País não muda sua matriz logística, a vida para os caminhoneiros autônomos e transportadoras não tem sido fácil. O caminhoneiro José Marcos de Lima trabalha no Ceasa, no Recife, há mais de 30 anos. Chegou a ter cinco caminhões mas conta que o trabalho para o caminhoneiro autônomo tem ficado cada vez mais difícil. “Toda vez que o diesel aumenta o pessoal bota os caminhões pra vender. Eu tenho um amigo que tinha vinte caminhões, já vendeu dez. Eu mesmo já vendi três e se o diesel não baixar tô pensando em vender mais um”. Marquinhos Carga, como é conhecido no Ceasa, contou que, recentemente, enviou um carregamento de louças sanitárias para Belém, no Pará, e trouxe o caminhão carregado de laranjas para o Ceasa. A viagem acabou não compensando. “Só o custo com diesel foi R$ 1 mil acima do que eu tinha previsto. Sem falar na alimentação na estrada que também está mais cara porque o gás [de cozinha] subiu, né? Um PF [prato feito] era R$ 15 agora é R$ 30. Tá tudo mais caro, não é só o óleo [diesel] não”.
O caminhoneiro conta que muitos profissionais, para ter algum lucro, se arriscam transportando cargas acima da capacidade do caminhão. “Às vezes o valor do frete só paga as despesas, então o caminhoneiro bota um pouquinho mais de peso pra fazer um frete melhor e não chegar em casa sem nada”, revela.
O presidente da Federação das Empresas de Transportes de Cargas e Logística do Nordeste (Fetracan), Nilson Gibson, também vê com preocupação a escalada do preço do diesel. Ele acredita que, por ser uma comoditie, os derivados de petróleo sempre sofrerão com a volatilidade do dólar e do mercado internacional de petróleo.
ALTERNATIVAS
Ele defende que o governo poderia tomar medidas mais efetivas para reduzir o preço do diesel nas bombas, como acabar com a obrigatoriedade da adição do biodiesel, na proporção de 12%, ao diesel vendido nos postos. O derivado vegetal custa quase o dobro do preço do diesel derivado de petróleo. “Além disso, o governo e o Legislativo poderiam estudar outras medidas para diminuir o custo dos transportadores como reduzir o preço de insumos, como pneus e lubrificantes, e facilitar o crédito para renovação da frota”.
Nilson Gibson revela que nas cargas fracionadas, que é o envio de pequenas quantidades de mercadorias para vários clientes, o diesel responde por 14% da composição do valor do frete. Já nas chamadas cargas lotação, quando o espaço de carga do veículo é utilizado integralmente por um único produto e, geralmente, é enviado para um único destino, a exemplo de soja, cimento ou açúcar, o combustível chega a representar 50% de todo o custo do frete.
“As transportadoras são livres para negociar o valor de seus fretes com os clientes e os condutores autônomos, mas nem sempre essa negociação é possível. Há embarcadores que praticamente monopolizam determinado mercado, e cabe a transportadora aceitar ou não o valor proposto”, explica Gibson. Para ele, que representa empresas transportadoras de sete estados nordestinos, a tabela mínima de fretes, cujos valores foram recentemente reajustados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (Antt), não resolve o problema. “Essa tabela foi criada logo após a greve dos caminhoneiros, em 2018, e não resolve o problema de ninguém porque tira a autonomia das empresas para negociarem seus fretes. Até hoje estamos esperando que o STF julgue a constitucionalidade desta tabela”, explica Gibson.
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