CUSTO DE VIDA

Carestia força o Natal do rateio em 2021, e mesa farta só é garantida com divisão e substituição

Com impacto da inflação, itens natalinos chegam a estar até 66,8% mais caros do que em 2020. Para quem vende, a saída é oferecer novas porções e produtos que caibam no bolso do consumidor

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Lucas Moraes

Publicado em 19/12/2021 às 8:00 | Atualizado em 19/12/2021 às 9:31
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O espírito de partilha natalino estará presente na mesa dos pernambucanos no Natal de 2021 sob um novo aspecto. O fim deste ano tem sido marcado pela carestia, com a inflação oficial próxima dos dois dígitos. Assim como em 2020, as ceias deverão ser reduzidas, mas por um motivo alheio às restrições da covid-19. Mesmo tendo um pouco mais de garantia para reunir um número maior de pessoas, as famílias estão visando o mínimo para fazer os itens natalinos, que chegam a uma alta de até 66,8% em Pernambuco, caberem no bolso. As táticas vão da substituição de itens, com compras menores, até o bom e velho rateio, que ainda assim está salgado e não garante a compra de tudo que era levado das padarias e mercados em anos anteriores.

A uma semana do Natal, a movimentação em supermercados e padarias ainda não é intensa, pelo menos para fechar a compra. Pelos corredores e gôndolas, o olhar dos consumidores está voltado à pesquisa de preços e promoções, de tudo, para montar uma ceia que não impacte ainda mais o já apertado orçamento.

"A gente ainda não comprou especificamente os itens natalinos, mas já estamos pesquisando, e não é só no mercado não, estamos vendo também muito os aplicativos, que têm promoções. O preço já vem subindo o ano todo, mas agora no Natal sabemos que a coisa tende a ser ainda pior, porque os itens já costumam ficar mais caros", diz Natália Felipe, que comanda uma empresa de formaturas, aos 29 anos.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Pesquisa de preços dos itens da ceia de Natal Natália Felipe - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

Na casa dela, a ceia costuma reunir a companheira Daniele Pimentel, 27, e outros familiares, geralmente em grupos de seis a oito pessoas. Este ano, não necessariamente pela pandemia, a reunião familiar estará restrita a quatro pessoas.

"Em 2019, a gente gastava cerca de R$ 400 para receber um grupo maior de pessoas. Ano passado, a gente nem recebeu. Este ano, a conta deve chegar nos R$ 550 e, mesmo mais caro, a gente vai estar levando menos e para menos pessoas, ainda pedindo para trazerem algo", afirma Daniele.

O fim de 2021, assim como o decorrer do ano, não tem sido nada fácil para fechar a balança dos preços no azul. Com os itens natalinos, que sazonalmente, já costumam encarecer, o peso da inflação tem sido ainda maior.

A inflação dos itens natalinos, mensurada pelo Procon-PE, registrou altas de até 66,8% no período de um ano. O recorde ficou por conta do pêssego em calda, indo de R$ 5,09 para R$ 8,49. Sem deixar muito para trás o vinho tinto suave (65,28%), o queijo provolone (64,66%), o panetone de frutas cristalizadas (55,68%) e o queijo do tipo reino (32,01%). Entre os assados, o Peru baixou 2,72%, mas em compensação, o Chester subiu 21,10%. O pernil, 38,30% e o tender, 16,99%.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Pesquisa de preços dos itens da ceia de Natal - Padaria Jaqueira - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

Além do preço mais alto em relação ao ano passado, o consumidor também precisa estar atento à diferença entre estabelecimentos. Na mesma pesquisa, que envolve 18 estabelecimentos da Região Metropolitana do Recife (RMR), o Procon-PE verificou que dentre os 75 produtos avaliados, alguns, como as frutas cristalizadas, apresentam diferenciação de preços na casa dos 315,32%, indo de R$ 12,99 para até R$ 53,95. Uma diferença tamanha a depender do ponto de venda.

"Lá em casa, quem gosta de cozinhar vai fazer. A gente pedia até peru na padaria, mas vamos fazer com cada um levando uma comida. Está caro, a gente já esperava porque estamos saindo de um período duro de pandemia, mas Pernambuco, para mim, tem sido o pior estado em relação a isso. Na minha casa são quatro pessoas, mas sempre nos reunimos na casa dos meus pais, e vamos gastar cerca de R$ 1,2 mil este ano, dividindo entre todo mundo, é claro", conta a empresária Sônia Paraíba, 61 anos.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Pesquisa de preços dos itens da ceia de Natal - Padaria Jaqueira - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

A família de Luiz Augusto, 50 anos, e Tatiana Sá, 38 anos, vem se preparando para o Natal antes mesmo de dezembro. A compra dos itens que compõem a ceia ainda vai esperar, mas há uma certeza de que tudo será comprado num atacarejo, onde as compras de mais itens saem mais baratos do que supermercados.

"Com certeza a gente vai mudar este ano. Ainda tem a pandemia, que já restringe o número de pessoas. Além disso, está tudo muito caro. Será a ceia natalina mais restrita possível. A gente tem olhado os preços, mas ainda não comprou para ver como vai estar, mas sabemos que todos os itens vão ser comprados no atacado, porque você compra com um determinado valor uma quantia que em supermercados comuns se gasta três vezes mais para comprar a mesma coisa", adianta Tatiana.

Torta salgada substitui o peru

Nos estabelecimentos comerciais, além da inflação do preço dos produtos, o jogo de cintura precisa dar conta dos custos fixos, com mão de obra, gás e energia, por exemplo, e muita negociação com os fornecedores e clientes.

Na Zona Norte do Recife, a Padaria Jaqueira vive a expectativa de um Natal melhor, com crescimento de 25% nas vendas sobre 2020, mas esperam que novas opções, com preços mais acessíveis, sejam aceitas pelo consumidor.

"O que a gente tem sentido muito aqui é o pessoal procurando muito mais a torta salgada. Tenho a impressão de que esse deve ser um item a substituir os assados em algumas mesas este ano", indica uma das sócias da padaria, Juliana Wolfenson.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM
Pesquisa de preços dos itens da ceia de Natal - Padaria Jaqueira - FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM

A diferença, no paladar e no bolso, é facilmente sentida. Enquanto o quilo da torta sai por cerca de R$ 65, um peru assado de três quilos facilmente ultrapassa os R$ 200.

"A gente mudou completamente o cardápio. Em 2020, a gente não teve um aumento forte, assim como já chegamos a ter anos sem nenhuma alteração no preço. Mas em 2021, a carestia do ano todo está pesando muito neste Natal e as coisas subiram até 60%. Isso porque estamos nos apertando e não repassando tudo para o consumidor", afirma a também sócia Riva Wolfenson.

Como alternativa, as recheadas cestas natalinas que figuravam no balcão passaram a dividir espaço com cestas de dois, três e cinco itens. "Com o básico", para caber no orçamento dos clientes e garantir a compra de itens natalinos.

"Mesmo nesse cenário, a gente acredita em melhores vendas, até porque as pessoas estão podendo se reunir e fazer uma ceia mais celebrativa", complementa Riva.

O repasse do custo da produção e a base boa de 2020, quando as pessoas recorreram às padarias em meios às restrições, geram uma expectativa mais comedida no proprietário da Parla Deli, Marcelo Silva.

"O ano passado foi muito forte (vendas). Este ano, vamos ter que dobrar o trabalho para conseguir chegar lá. Sobre 2019, o crescimento em 2020 foi de uns 20%. Se igualarmos ou subirmos 5%, já é um bom resultado", comenta. No cardápio, destacam-se assados como Peru (R$ 79,90 kg), Chester (R$ 79,90 kg) e Tender (R$ 89,90 kg).

No geral, a expectativa das padarias é pela compra de última hora, que intensifica a produção em meados de 20 e 22 de dezembro.

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