Dia do trabalhador: Brasil é País do auxílio e do bico
Em março, o Brasil encerrou o trimestre com taxa de desocupação em 11,1%. Nas entrelinhas, o número quer dizer que menos gente procurou emprego e que, de fato, há um pouco mais de vagas, mas não quer dizer que vamos bem
Os últimos dados divulgados pela Pnad Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na sexta-feira (29), mostram uma estabilização do percentual de desemprego no trimestre encerrado em março. A estabilização, em outros momentos, poderia até ser comemorada; o que, agora, não é o caso. A situação do emprego ainda é muito ruim no País, e sobretudo em Pernambuco, em um dia do Trabalhador inglório àqueles que estão no mercado, formal ou informal, e mais ainda para quem incessantemente busca uma oportunidade.
Em março, o Brasil encerrou o trimestre com taxa de desocupação em 11,1%, mesmo patamar registrado no período de outubro a dezembro do ano passado. Nas entrelinhas, o número quer dizer que menos gente procurou emprego e que, de fato, há um pouco mais de vagas, já que a taxa de desocupados era 14% há um ano, mas não significa que vamos bem.
Na passagem do trimestre, a população ocupada (95,3 milhões de pessoas) caiu 0,5%, o que aponta menos 472 mil pessoas trabalhando. Parece pouco, mas é mais um movimento que corrobora para a manutenção de uma taxa alta em relação ao desemprego no País.
O Brasil ainda tenta se reerguer da crise pandêmica, enrolada com outras crises geradas por aqui, e, enquanto isso, a população fora da força de trabalho (65,5 milhões de pessoas) cresceu 1,4% (mais 929 mil pessoas) ante o trimestre anterior. A melhora caminha, mas ainda a passos muito lentos. O número de empregados com carteira assinada no setor privado cresceu 1,1% (34,9 milhões de pessoas) - o que além da falta de emprego, aponta para o emaranhado de postos inseguros, informais, e que deixam o trabalhador fora da proteção legal - ainda representando 40% do total das pessoas na força de trabalho deste País.
"A população ocupada neste trimestre recua, mas embora haja esse movimento, houve modificações importantes, como no caso da carteira assinada. Embora a população ocupada retraiu no todo, a gente ainda percebe a manutenção do emprego com carteira e, por outro lado, a retração do trabalho informal, sobretudo por conta própria, movimentos distintos daqueles observados no primeiro ano da pandemia, que se observava fundamentalmente a expansão por meio da informalidade", sustenta a coordenadora de Trabalho e Rendimento do IBGE, Adriana Beringuy.
Apesar da Pnad do trimestre não trazer recortes regionais, é sabido, pelo próprio levantamento, que Pernambuco lidera a taxa de desocupação no País. A taxa média de desocupação no Estado é de 19,9% no recorte anual. Por aqui, 33,1% dos trabalhadores atuam por conta própria. E a informalidade ainda recai sobre 52% deles.
"A geração de emprego depende do aumento da atividade econômica, e o Brasil vive um período não só de crise endêmica, também política e serie de instabilidades que têm abalado a economia", resume o doutor em Economia, professor de Finanças e Economia da Faculdade Nova Roma, Antonio Carvalho.
Gerar postos de trabalho é uma tarefa que depende originalmente do ambiente de negócios e da capacidade de investimentos a serem feitos tanto pelo setor público quanto pelo setor privado que, respectivamente, seja pelo orçamento curto ou pelo crédito mais caro, não estão fazendo isso na velocidade necessária. A população, por sua vez, precisa trabalhar para ter renda, num cenário de inflação galopante, o dinheiro significa sobreviver. Sem muita opção, o que aparece é bom negócio.
O ministério do Trabalho, por meio do Caged, mostra que que o trabalho intermitente (18.574) e o parcial (15.733) têm saldo positivo entre admissões e demissões no primeiro trimestre deste ano, mas dentro de um ano salário já caiu mais de 7%. No Nordeste, o número de inscritos no Auxílio Brasil já maior do que o total de trabalhadores com carteira assinada.
O governo federal prepara para a próxima semana um novo pacote de medidas que inclui a formalização de trabalhos temporários no campo e promete legalizar os motoristas e entregadores de aplicativos ainda neste ano. A promessa é garantir seguridade, mas não classificar esses trabalhadores com vínculo empregatício e nem igualar ao modelo da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
A professora de Direito da Universidade da Califórnia Veena Dubal alerta que o futuro do mercado de trabalho, sob risco de retroceder, precisa ser discutido agora, mas com o máximo de garantias.
"Temos o benefício da retrospectiva. Olhando para trás, para a Revolução Industrial, sabemos que tipos de práticas trabalhistas exploratórias podem surgir se o Estado não intervir agora. E sabemos suas consequências a longo prazo. Já é hora dos legisladores reconhecerem que, embora as tecnologias digitais possam ser deslumbrantes, elas criam e recriam novas e antigas formas de exploração. Para o futuro dos trabalhadores -- para o futuro da democracia, para o futuro da igualdade -- devemos resistir às narrativas e aplicar as leis trabalhistas", pontua.