Uma não pessoa

Arthur Carvalho
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Arthur Carvalho
Publicado em 25/11/2020 às 2:00
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Quem quiser desvendar o que se passa nas eleições dos Estados Unidos e na cabeça de Trump, recomendo dois livrinhos e o conto de Guimarães Rosa Os Irmãos Dagobé, do seu livro Primeiras Estórias.

São eles: Hitler, de Ian Kershaw, tradução de Pedro Maia Soares, Companhia das Letras. Tem 1077 páginas, mas vale a pena. Logo no prefácio, o autor se pergunta como Hitler foi possível e indaga como pôde um desajustado tão bizarro chegar a tomar o poder na Alemanha, um país moderno, complexo, economicamente desenvolvido e culturalmente avançado, e como pôde depois exercer o poder.

Mas adiante, em suas "reflexões", Kershaw disse que o Füher foi considerado um oportunista, sem princípios, desprovido de qualquer ideia, exceto uma: aumentar seu próprio poder e o da nação com que se identificara, preocupado somente com a dominação, travestida em doutrina da raça, e não consistindo em outra coisa senão destrutividade vingativa. Um tipo de vigarista político que hipnotizou e enfeitiçou o povo alemão. Uma figura demoníaca, um daqueles fenômenos históricos inexplicáveis que surgem em raros intervalos na humanidade, que determinou o destino da nação. E transcreve opiniões de cientistas políticos e psiquiatras, considerando Hitler portador de distúrbio mental, um caso patológico, uma "não pessoa" de grande poder carismático, em quem milhões acreditavam, inclusive indivíduos perspicazes e inteligentes, - daí o grande perigo. E conclui: o elemento dominante da sua força interior era sua "egomania sem limite". E, o mais relevante: "Hitler não foi o tirano imposto à Alemanha, foi nomeado chanceler do Reich legalmente".

Se o caro leitor não gostar de comparações, passe para "Como as Democracias Morrem", de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, professores de ciência política da Universidade Harvard, tradução de Renato Aguiar, Zahar. Nessa obra, eles analisam o processo de subversão da democracia que ocorre hoje nos Estados Unidos, a partir de Donald Trump, e comparam o caso do presidente americano com exemplos históricos de rompimento da democracia nos últimos 100 anos, referindo-se a Hitler, Mussolini, Stalin, Getúlio Vargas, Perón, Fujimori, Hugo Chavéz, Silvio Berlusconi, Fidel Castro, Rafael Correa, Pinochet, Putin, Maduro, Ferdinando Marcos e outros ditadores, autocratas e candidatos a autocratas de plantão. E quem quiser saber porque Trump é tão raivoso, saibam que os quatro irmãos Dagobé "eram de guardar brasas em potes."

Arthur Carvalho, é da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas

 

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