Crime

Caso Beatriz: Guerra de advogados em busca de visibilidade tumultua processo. Carta alegando inocência de Marcelo Silva foi desacreditada

No domingo (16), advogada Niedja Mônica da Silva estava no Fantástico falando sobre Marcelo da Silva como réu confesso da menina Beatriz. Na terça (18), Rafael Nunes surge com carta do suspeito se dizendo inocente

Adriana Guarda
Adriana Guarda
Publicado em 19/01/2022 às 11:14
Montagem
CASO BEATRIZ Pelo menos três advogados disputam defesa de Marcelo da Silva no processo - FOTO: Montagem
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No domingo (16), Niedja Mônica da Silva aparecia no Fantástico falando como advogada de Marcelo da Silva. O discurso não foi dos mais felizes para uma defensora. "Como ele é réu confesso, eu estou aqui para que a lei seja cumprida, porque meu compromisso é com o processo. A gente está aqui para defender os direitos. (...) Não tenho dúvidas de que ele é o culpado". O depoimento derrotista, de quem vai brigar pouco pelo cliente, repercutiu mal entre a família do acusado e abriu brecha para que outros advogados se candidatassem ao posto. O criminalista Rafael Nunes já estava de olho no caso e conseguiu desbancar Niedja. Uma terceira via nessa história é o advogado Francisco de Assis, que defendeu Marcelo no crime de estupro contra uma criança em Trindade, e também se colocou à disposição para fazer a defesa. Mais cauteloso, ele participou de reunião com a família de Marcelo na segunda-feira (17) e justificou sua intenção. O que existe de comum entre os três é o interesse na visibilidade que um caso de repercussão nacional pode trazer para a carreira de qualquer criminalista. Até aí nenhum problema. A questão é quando as vaidades pessoais se sobrepõem e tumultuam o processo. 

Como Marcelo Silva é adulto, os advogados podem abordá-lo na penitenciária e oferecer seus serviços. Ele aceita o defensor assinando uma procuração. Se quiser trocar de advogado basta assinar uma nova procuração, que elimina o efeito da anterior. Provavelmente foi o que aconteceu com Niedja. Depois de uma declaração infeliz em rede nacional, a advogada ficou suspeptível ao ataque dos colegas. Após publicar posts em suas redes sociais, ela chegou a apagar o Instagram ao longo da semana. Niedja disse que foi procurada por um pessoa da família, mas eles negam. Afirmam que não a conhecem. O mesmo vale para o desfensor que substtuiu a advogada no caso. 

Diante do cenário, o midiático criminalista Rafael Nunes apareceu oferecendo uma defesa mais arrojada. No universo do direito criminal, a avaliação é de que a carta de Marcelo da Silva, afirmando sua inocência, seria uma estratégia da defesa, orientada pelo próprio advogado.

"Ele pode ter dito a Marcelo: 'olha, você não precisa confessar. Foi ouvido sem advogado. Diz que falou na pressão, que está com medo de morrer", sugere uma fonte da área. Mal assumiu a causa, Rafael fez posts nas suas redes sociais, apareceu em programas de TV exibindo a carta de Marcelo e convocou entrevista coletiva nesta quarta (19) para comentar o texto com outros veículos de imprensa. O advogado diz que não vai "passar a mão na cabeça" do cliente em relação a outros crimes que ele cometeu, mas defende a inocência de Marcelo no Caso Beatriz. Essa certeza é contraditória já que o advogado sequer teve acesso ao rumoroso inquérito com 24 volumes, não viu o vídeo do depoimento do acusado, nem teve acesso a outras provas. 

Na carta, o suspeito diz que confessou na pressão, mas a Secretaria de Defesa Social rebate, afirmando que "a Polícia Civil filmou o depoimento na íntegra, seguindo todas as regras legais, a fim de evitar quaisquer questionamentos, tentativas de macular a confissão ou estratégias projetadas para tumultuar o caso". A mãe de Beatriz, Lucinha Mota, também disse, por meio da imprensa, que não acredita na carta de Marcelo da Silva e que já aguardava alguma estratégia da defesa neste sentido.

CONFUSÃO CHEGOU À OAB

O caso envolvendo Niedja e Rafael foi parar na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Pernambuco. Tesoureira da OAB Paulista, Niedja ingressou com uma representação contra o colega de profissão. Disse que ele foi "assediar seu cliente" no presídio em Igarassu. A confusão entre os dois chegou à penitenciária. Niedja só soube que estava fora do caso na segunda-feira (17) quando foi acompanhar o indiciado em mais um depoimento. Na representação, ela afirma que quando chegou ao local, Rafael teria sido grosseiro com ela, afirmando que os delegados se reportariam a ele e não mais a ela.

FAMÍLIA E EX-ADVOGADO

Para além das estratégias intempestivas, o ex-advogado de Marcelo Silva, o criminalista Francisco de Assis se coloca como opção na defesa do réu. Após a conversa que teve com a família, ele relata que estão todos muito abatidos e assustados, desde que o exame de DNA comprovou Marcelo como autor do crime. Os pais guardam a memória do espancamento do filho, em Trindade, pelo crime de estupro de uma criança de 9 anos no município. Na ocasião, a família teve sua casa destruída e precisou mudar de cidade. 

O advogado recorda que Marcelo apanhou tanto, que foi considerado morto. Quem veio recolher 'o corpo' foi o carro do IML, até perceberem que ele ainda estava vivo e levarem para o Hospital de Ouricuri. Lá, ele passou pelo menos quatro dias na UTI. Um dos compromissos de Francisco se assumir o caso é preservar a identidade e a localização da família. Ele conta que a mãe já está bastante idosa e tem deficiência visual. O advogado também relata que, além de Marcelo, nenhuma outra pessoa do seu núcleo familiar tem envolvimento com o crime. Marcelo tem pai e mãe vivos, um irmão e uma irmã. A mãe sente muito desgosto pelos crimes que o filho cometeu, mas espera que ele tenha uma defesa digna. 

Com sete anos de experiência em direito criminal e tendo participado da defesa em muitos casos complexos, Francisco de Assis reconhece que a visibilidade do Caso Beatriz lhe atrai e ajudaria a torná-lo conhecido em um universo maior na região,  além de divulgar seus escritórios no Sertão, aumentando sua área de atendimento. Hoje ele tem unidades em Trindade e Petrolina, mas com a pandemia os atendimentos são feitos remotamente, em sua maioria. O criminalista diz que não vai traçar nenhuma linha de defesa antes de conhecer o processo e defende a necessidade de se manter a ética. Afinal, o Caso Beatriz já é complexo demais e não deveria ter espaço para oportunismos. 

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