OPINIÃO

Meditar enriquece os zumbidos que se espalham na inteireza do momento.

A sintonia dos versos de Fernando Pessoa me extasia. Estremeço diante de tanta cadência simbólica.

FÁTIMA QUINTAS
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FÁTIMA QUINTAS
Publicado em 14/12/2022 às 0:00 | Atualizado em 14/12/2022 às 10:24
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Meditação - FOTO: leninscape/ Pixabay
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Guardo memórias antigas. Sou plena de passados. Recordar me faz construir a identidade. Há tantas incógnitas no âmago de cada um que, às vezes, esqueço de presentificar-me dia a dia. Não importa. O próprio ato de Ser implica em renovações instantâneas.

A construção do Eu envolve revivências outras. O ontem se presentifica a cada instante. Toda caminhada carrega memórias indefinidas. Afinal, a vida se constrói sobre sentimentos ficcionais. Apetece-me inventar e reinventar a cada instante. O que seria do cotidiano se não guardássemos espelhos indefinidos? Daí o intenso desejo de renovação. Os reflexos exibem molduras eclipsadas. E, assim, a existência se fortifica no ato de perenes construções. O Tempo Tríbio (passado, presente, futuro), de Gilberto Freyre, esmiuça em detalhes o tamanho de instantes que não se traduzem. Desde quando somos capazes de definir e redefinir a vida? Há tantas minúcias espalhadas em nossos sentimentos que o melhor é vivê-las intensamente. O ir e o vir na estrada indefinida acolhe enigmas que não somos capazes de interpretar. Melhor assim. Não existem certezas absolutas no mistério da vida.

E ninguém melhor que o poeta para traduzir a complexidade da alma: "Sim, sei bem/Que nunca serei alguém./Sei de sobra/Que nunca terei uma obra./Sei, enfim,/Que nunca saberei de mim./Sim, mas agora,/Enquanto dura esta hora,/Este luar, estes ramos,/Esta paz em que estamos,/Deixem-me crer/O que nunca poderei ser".

A sintonia dos versos de Fernando Pessoa me extasia. Estremeço diante de tanta cadência simbólica. Difícil descrever a verdade. Somente o sonhador será capaz de entoar o figurativo do mundo. Nada como palavras místicas para melodiar a escrita. Cada letra retém a intensidade do dizer. E a construção do pensamento vai se espalhando por todo nosso corpo. Seremos únicos na virtude da interação. Nada mais intenso do que o ato de pesquisar o universo. Sigo os detalhes que se apresentam. Vou indo. Mergulhada na explosão interior.

Meditar enriquece os zumbidos que se espalham na inteireza do momento. Há um vai e um vem que estimula diálogos mais fervorosos. Não adianta ignorar a inquietude. Importa acatar as sublimações e delas extrair o que há de excelso nos íntimos diálogos. Sinto-me pequena na redoma do que se passa para além do oculto. Que as enigmáticas circunferências acalmem as minhas interrogações.

Fátima Quintas, da Academia Pernambucana de [email protected]

 

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