OPINIÃO

Uma tormenta tributária

Na história da tributação brasileira, poucas vezes ocorreu uma combinação tão insólita de medidas como as que foram adotadas no final do ano passado.

EVERARDO MACIEL
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EVERARDO MACIEL
Publicado em 12/01/2023 às 0:00 | Atualizado em 13/01/2023 às 10:45
ARTES JC
IMPOSTOS - FOTO: ARTES JC

No dia 30 de dezembro, foi editado decreto reduzindo à metade as alíquotas do PIS e da Cofins incidentes sobre receitas financeiras. Não vislumbro justificativa para isso, porém o que causa perplexidade é que a medida iria impactar as receitas do governo que tomaria posse em 1º de janeiro. O decreto foi revogado pelo novo governo no dia da posse.

Houve, é claro, uma mitigação dos danos, mas, em virtude da anterioridade nonagesimal, o restabelecimento das alíquotas só produzirá efeitos a partir de abril.

A exemplo das Forças Armadas e Polícia Federal, em 2001, foram criadas adidâncias tributário-aduaneiras nos Estados Unidos e nos países do Mercosul, visando a cooperação institucional com os órgãos homólogos. A experiência foi bem-sucedida.

No final de ano, foram criadas adidâncias em Bruxelas, Paris e Dubai. Além de ser uma medida extemporânea, o espantoso é que os adidos designados foram justamente os titulares dos cargos de alto escalão da administração que saía. Inoportuno e indecoroso.

O novo governo reagiu, entretanto, de forma desproporcional àquela ignomínia. Em lugar de eliminá-la, extinguiu todas as adidâncias tributário-aduaneiras, o que configura medida punitiva à Receita Federal, reforçando a percepção de um contínuo processo de sucateamento do órgão.

Por fim, foi editada Medida Provisória (MP) estabelecendo novas regras para preços de transferências, o mais controverso e complexo tema na tributação da renda.

O modelo brasileiro é o mais simples do mundo, ainda que demande muitos aperfeiçoamentos. Optou-se substitui-lo pelo da OCDE, instituição que tem uma especial predileção por modelos tributários complexos e com elevado grau de subjetividade.

As regras vigentes são disciplinadas em 6 artigos, as propostas se desdobram em 40, o que reforçará as queixas quanto à complexidade do nosso sistema tributário.

O maior absurdo, todavia, é que o modelo somente entrará em vigor em 2024, recorrendo-se, contudo, a uma MP, que se sujeita ao requisito constitucional da urgência. Qual é a urgência?

Para tentar contornar a inconstitucionalidade, admitiu-se que empresas poderiam antecipar para 2023 a adoção das novas regras, embora não conheçam seu disciplinamento infralegal. É claro que só farão a antecipação se lograrem ganho, em prejuízo da arrecadação. E se a MP não prosperar, como ficaria a opção? Quanta lambança!

Everardo Maciel, consultor e ex-secretário Nacional da Receita Federal

 

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