OPINIÃO

A alma do São Paulo

O encouraçado São Paulo, que serviu à Inglaterra na Primeira Guerra, e ao Brasil, na Segunda, foi revendido à Inglaterra no término da Segunda Guerra como ferro velho - e paira até hoje o mistério de seu desaparecimento

ARTHUR CARVALHO
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ARTHUR CARVALHO
Publicado em 15/02/2023 às 0:00 | Atualizado em 15/02/2023 às 11:33

Tecnicamente, uma belonave existe para defender o território de um país ou atacar o inimigo quando necessário. O porta- aviões São Paulo foi comprado à França pelo Brasil, em segunda mão, já um tanto enfadado, precisando de importante reforma para se tornar útil, o que não foi feito pelo custo elevado da obra. E morreu virgem de um tiro em favor do Brasil, afundado na tarde de sexta-feira, pela Marinha, em Águas Jurisdicionais Brasileiras (AJB) a 350km da costa e com profundidade aproximada de 5 mil metros, por decisão polêmica do Tribunal Regional Federal da 5ª. Região de Pernambuco, contrariando o parecer do Ministério Público Federal e do Ibama.

Consta que o São Paulo foi afundado devido à alta toxidade de seu casco, portador de cinco toneladas de amianto, capaz de deteriorar o ecossistema. E como aprendi com o Almirante Leandro e o prático da barra Luiz Augusto que todo navio tem alma, pergunto para onde teria ido a alma do aeródromo São Paulo, vagando e perambulando solitário e sem rumo pelas águas do Atlântico Sul, como um zumbi, carregando a pecha de imprestável e fardo para a Marinha, proibido de atracar nos portos brasileiros e até da Turquia, para onde foi vendido como ferro velho. A proposta final da Arábia Saudita de comprá-lo por 30 milhões de dólares chegou tarde.

Conheci pessoalmente o encouraçado Minas Gerais durante a Segunda Guerra. Vivia ancorado no Porto de Salvador, colado ao quebra-mar, guarnecendo sua entrada dos submarinos alemães. Fora comprado pelo Brasil à Inglaterra, a quem serviu na Primeira Guerra, juntamente com o Encouraçado São Paulo, também comprado pelo Brasil à Inglaterra para nos defender na Segunda Guerra.

Durante a Segunda Guerra, os temidos encouraçados faziam sucesso. Eram grandes navios, armados com potentes canhões e casco reforçado para resistir aos torpedos adversários. Já perto do fim do conflito, a Alemanha construiu Bismarck, que se tornou o orgulho da Marinha alemã. Seu tiro de canhão atingia o inimigo que nem aparecia no horizonte. O Bismarck afundou tantos navios, principalmente da célebre Marinha Real Inglesa, que Churchill deu uma ordem definitiva: "Afundem o Bismarck!" E o Bismarck terminou afundado em consequência do tiro de um caça de porta-aviões britânico que destruiu seu leme, deixando-o à deriva numa tarde de tempestade, com 300 jovens marinheiros a bordo. Sabendo que o Bismarck terminaria afundado, Hitler proferiu um longo discurso aos marinheiros, exortando-os a "morrer heroicamente pela pátria".

O encouraçado São Paulo, que serviu à Inglaterra na Primeira Guerra, e ao Brasil, na Segunda, foi revendido à Inglaterra no término da Segunda Guerra como ferro velho - e paira até hoje o mistério de seu desaparecimento. Ele estava sendo rebocado por um rebocador, rumo às ilhas britânicas, em sua última viagem, com mar calmo e noite enluarada, quando naufragou ao atravessar o Triângulo das Bermudas sem deixar vestígios.

P.S. A Academia Pernambucana de Letras de luto com a morte de Olympio Bonald Neto.

Arthur Carvalho, da  Academia Recifense de Letras.

 

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