OPINIÃO

8 de janeiro: crime impossível ou tentativa inidônea

Os atos de vandalismo praticados nos prédios dos Três Poderes não representaram nenhum perigo de deposição do Presidente da República, nem do fechamento do Poder Legislativo, nem, tampouco, de ameaça ao funcionamento do Judiciário.

CÉLIO AVELINO
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CÉLIO AVELINO
Publicado em 15/02/2023 às 0:00 | Atualizado em 15/02/2023 às 11:32
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No dia 8 de janeiro, milhares de apoiadores de Bolsonaro vandalizaram prédios dos 3 poderes, em Brasília - FOTO: Divulgação

O vandalismo contra os prédios dos Três Poderes da república,  ocorrido no último dia 8 de janeiro, é ato extremamente grave, que há de ser investigado, apurado, punindo-se os seus autores na forma da lei, inclusive indenizando-se o Estado pelos danos provocados. Mas o que grande parte da sociedade classifica como “Tentativa de Golpe de Estado”, não vejo como existir.

Nem o Presidente da República legitimamente eleito correu algum perigo de ser deposto, nem o Poder Legislativo de ser fechado, nem, tampouco, o Judiciário de deixar de funcionar.

O crime é consumado, quando “nele se reúnem todos os elementos de sua definição”, e é tentado, “quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente” (Código Penal, art. 14, incisos I e II).
Em relação ao crime tentado, o nosso ordenamento jurídico dispõe que “Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime” (Código Penal, art. 17).
Até em relação à prisão em flagrante, há súmula do Supremo Tribunal Federal dizendo que “Não há crime, quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação” (Súmula 145, STF).

Assim, só há crime tentado se a conduta adotada pelo agente tornar possível a sua consumação. Caso contrário, seja por absoluta ineficácia do meio empregado, ou absoluta impropriedade do objeto, não há não há que se falar em punição desse crime impossível ou tentativa inidônea.

Os graves atos de destruição que atingiram os prédios do Supremo Tribunal Federal, da Câmara dos Deputados e do Palácio do Alvorada não podem, com seriedade científica, serem considerados como tentativa de golpe, pela ineficácia absoluta dos meios, mesmo que a intenção dos manifestantes tenha sido a de praticar um Golpe de Estado, tomar o Poder, destituir o Presidente da República, fechar o Poder Legislativo e o Poder Judiciário.

Exemplo clássico de crime impossível por absoluta ineficácia do meio empregado, é quando o agente, pretendendo matar a vítima por envenenamento, coloca açúcar em sua bebida, acreditando que está adicionando veneno. Obviamente, o homicídio não se consuma, pois o açúcar, no caso, não tem o poder de matar a vítima.

Outro exemplo de tentativa inidônea ou crime impossível pela impropriedade do objeto: a ingestão de drogas abortivas pela mulher para provocar aborto, quando a perícia médica constata inexistência de gravidez. Inexistente a gravidez, obviamente é impossível a tentativa de aborto.

Em ambos os casos, embora a intenção do agente fosse, efetivamente, a prática de tais crimes, inexiste pena para essa intenção, já que só se pune os atos executados.

Os atos de vandalismo praticados nos prédios dos Três Poderes não representaram nenhum perigo de deposição do Presidente da República, nem do fechamento do Poder Legislativo, nem, tampouco, de ameaça ao funcionamento do Judiciário.

Tentativa de Golpe de Estado, não vejo como existir. É crime impossível ou tentativa inidônea.

Célio Avelino, advogado e membro efetivo da Academia Pernambucana de Letras Jurídicas.

 

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