OPINIÃO

Poder Judiciário e burocracia

O nome, burocracia, há de fazer-nos medo posto que tem origem francesa e quer significar, por sinédoque, o "poder do escritório". No linguajar mais pedestre pode expressar algo muito pior, o "poder do birô".

FÁBIO ANDRÉ DE FARIAS
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FÁBIO ANDRÉ DE FARIAS
Publicado em 11/03/2023 às 0:00 | Atualizado em 11/03/2023 às 15:02
THIAGO LUCAS/ DESIGN SJCC
BUROCRACIA - FOTO: THIAGO LUCAS/ DESIGN SJCC

A burocracia e seus executores, os burocratas, não gozam de boa reputação entre nós e a prova maior disso é que o tema mereceu até um Ministério para a sua eliminação ou redução, o da Desburocratização, tendo sido seu primeiro ocupante o Ministro Hélio Beltrão.

Este simpático sexagenário uma vez disse "quanto mais burocracia, menos democracia". Soa irônico tais palavras virem de um dileto "servidor" da Ditadura Militar instalada pós-1964.

Outro ocupante de cargos no Estado, o também ex-Ministro, ex-Governador, cremos que ainda Professor Cristovam Buarque, disse que "a indiferença é a melhor aliada da burocracia. E a burocracia é a maior fábrica de indiferença, uma doença incurável".

O nome, burocracia, há de fazer-nos medo posto que tem origem francesa e quer significar, por sinédoque, o "poder do escritório".

No linguajar mais pedestre pode expressar algo muito pior, o "poder do birô". Assim como o mercado fica nervoso, aquela mesa, na visão de muitos empoeirada e cheia de teias de aranha, exerce uma autoridade sobre aqueles que se colocam perante ela a pedir algo e sempre a ouvir: "não é aqui, é no birô ao lado".

Não sem motivos, para muitos é preferível acrescer-se um "R" e denominarmos simplesmente de BURROCRACIA.

No entanto, nas sociedades que se organizam a partir do Século XVIII, este fenômeno merece uma maior atenção e consideração na medida em que uma ampla gama de serviços públicos e privados só se viabilizam graças a ação dos burocratas.

O sociólogo alemão Max Weber disse que o burocrata moderno é um tipo de profissional treinado para o exercício de certas atribuições, recrutado por meio de exames especiais e que, fundamentalmente, a sua lealdade não é pessoal, destinada a alguém ou senhor, e sim dedicada a finalidades impessoais e funcionais.

A quem passou desapercebido, lembremos que o servidor público é a pessoa que mantém com o Estado uma relação de trabalho de natureza profissional, de caráter não eventual, recrutado por meio de procedimentos específicos, via de regra concursos, e que se submetem exclusivamente à vontade impessoal da lei.

Assim, aquilo que muitos desejam exercer para o resto de suas vidas por tranquilidade socioeconômica ou propensão pessoal, inclusive no Judiciário, deve acostumar-se ao exercício de atividades burocráticas.

Assim, apesar de sua aparente má fama, não estamos diante de atividades que possam descartadas ou secundarizadas pelo Estado contemporâneo. Muito pelo contrário, em grande parte esta instituição só funciona porque a burocracia a põe a andar executando tarefas imprescindíveis e só percebidas quando não atingem seus objetivos.

Quando se vai ao Poder Judiciário pretende-se a resolução de uma desavença, quer por uma sentença, quer por um acordo.

As sentenças são obras, muitas das vezes, de concentração de anos e anos de estudos e experiências. Os acordos são frutos de muito diálogo. No entanto, as suas feituras só são possíveis graças a dezenas de atos burocráticos anteriores e posteriores.

Intimações, ofícios, digitação de audiências, publicações, etc., precisam ser confeccionados para que uma sentença venha ao mundo dos vivos.

De nada serve, corriqueiramente, uma "bela sentença se ela não é publicada". Portanto, uma boa gestão desses atos burocráticos ao invés de estorvo deve ser vista como uma condição de eficiência dos serviços prestados pelo Judiciário.

Fábio André de Farias, desembargador corregedor do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região (PE)

 

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