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Burro sem rabo

Geralmente, em cada feriado os horários mudam, as famílias curtem, os finais de semana são prolongados. Para alguns, não para todos.

Por PAULO ROBERTO BARROS E SILVA Publicado em 21/11/2024 às 0:00 | Atualizado em 21/11/2024 às 11:42

E assim foi nesse consagrado 15 de Novembro - a Proclamação da República. Tempo coincidente com a modelagem de eventos em curso no Brasil, o G20 Social no Rio de Janeiro e COP-30 em Belém. O clima e a pobreza são as estrelas em debate, no G20 o Presidente Lula afirmou com muita convicção que "em 2026 nenhum brasileiro passará fome." E assim seguem os dirigentes a prometer nos encontros internacionais as mudanças que o planeta Terra requer. Olham para o amanhã no faz de conta de anúncios e de promessas.

Por coincidência estamos saindo de eleições. Plena de heróis agradecidos e, surpreendentemente, afinados em rupturas eloquentes. Prometem o mesmo de sempre, tanto nos municípios brasileiros, quanto no Azerbaijão, na Argentina ou Estados Unidos. Pois no geral os malucos foram eleitos. Apesar de alguns que não se deram bem. Agora temos trilionários já se apresentando para o amanhã, é assustador e lamentável.

Aqui, o drama urbano e humano se apresenta com ou sem feriadão. O planeta vai de mal a pior e a temática da desigualdade está sempre presente cotidianamente. Para os milhões de miseráveis resta esperar o milagre ou chorar a desgraça do porvir. Embora exemplos de enfrentamento dados pelo povo sejam evidentes, e não se quer reconhecer. Nestes três dias de folga do feriadão acompanhei nos finais da manhã um personagem dos tempos do meu avô - "o burro sem rabo." Quando muito reclamam de carroceiros atrapalhando o trânsito. Naquele tempo eram o transporte de carga dos mais pobres. Não precisavam das despesas com os cavalos puxando carroças.

Pois bem, aquele que usava o "burro" está com sua carroça de duas rodas colhendo material dos depósitos de lixo dos edifícios. Na verdade, exercendo a plenitude da reciclagem. A reciclagem que não é pauta para os membros do G20 ou do COP-30, era o exemplo e mais que isso, a sobrevivência tanto do planeta quanto de sua família. Apreciando a reciclagem imaginei dizer ao cidadão o seu significado. O que é isso, responderia. Eu deveria ir além dizendo que era o exemplo da sustentabilidade, palavra que junta quase tudo, como idade, vitalidade, moralidade e etc. É um conceito que abraça a reciclagem, senhor trabalhador autônomo. O senhor sem carteira, sem leitura, sem quase nada, exerce o desafio cotidiano de coletar papelão, plástico, alimentos sobrantes para transformar em meio de vida que sustenta a família. Aqui e acolá, aparece alguma serventia para a casa sua moradia - provavelmente um vão sem janela, sem banheiro e com restos de coisas para acomodar os filhos. A sua camisa, calça e sandália eram as mesmas peças dos três dias do feriadão. Não está só. Temos 16 milhões ou bem mais de "brasileiros com burros ou carroças" tentando sub-viver neste mundo anárquico e inconsequente.

Os participantes dos Fóruns Mundiais deveriam ouvir o que diria aquele cidadão sobre o seu cotidiano. Por exemplo substituir o burro pela carroça, não muda para quem está descalço, pisando o fervente asfalto, braços erguidos e a força da teimosia na busca de matéria prima para comercializar. Feriadão é bom, diria o cidadão, o trânsito não atrapalha, o lixo é rico, tem muitas festas e eventos onde buscam seus restos. E nada mais diria.

Quem sabe, alguém prestaria a atenção ao que dizia o cidadão e mais, cuidaria de romper com esse faz de conta das convenções mundiais antes que os trilionários resolvam proibir o "burro sem rabo" de permanecer no Planeta Terra. Hoje já poderiam ser enviados para uma incrível experiência, enviar milhões de burros sem carroça e sem rabo com destino à Marte. Tem foguete novo para vender enquanto a NASA, a China, os Russos se aquietam.

Os donos do mundo, inteligentes e responsáveis, ficariam aliviados e passariam a usufruir dos feriados permanentes para a felicidade geral dos que por aqui ficaram. Pois quem manda ser burro, ainda mais sem rabo, não é mesmo!

Paulo Roberto Barros e Silva, desenhista

 

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