Educação e Trabalho: mudanças e desafios
As estatísticas indicaram um movimento expressivo de desligamentos autônomos de trabalhadores em busca de outras oportunidades fora do assalariamento
O mercado de trabalho está em mudança no Brasil e no mundo por diversas razões. Uma é a tendência liberal do trabalho libertário no qual a pessoa prefere empreender com autonomia para definir sua jornada laboral sem ter nenhum vínculo de subordinação hierárquica. Muitas pessoas em ambiente de prosperidade preferem trabalhar como conta-própria desligando-se do seu vínculo empregatício que, em alguns países como Estados Unidos pagam relativamente pouco, oferecem escassos benefícios sociais e ainda os sujeitam a situações constrangedoras e repressoras no ambiente de trabalho.
As estatísticas do mercado de trabalho, no Brasil como nos EUA, indicaram recentemente um movimento expressivo de desligamentos autônomos de trabalhadores dos seus empregos em busca de outras oportunidades de trabalho fora do assalariamento formal. Outra razão, agora de natureza tecnológica é o avanço do mundo digital, especialmente sob a égide da disrupção provocada pela inteligência artificial que está provocando mudanças nas formas de trabalhar e nas relações de trabalho.
No Brasil, em paralelo a essas mudanças, observa-se dois fenômenos. Um é a crise do sistema universitário privado e, em menor escala do público, com demanda cadente e evasão em alta. O mercado aparenta estar recebendo a taxas mais rápidas do que pode absorver pessoas com nível superior completo.
O problema e o desafio é que a qualificação desses trabalhadores com diploma superior, frequentemente não atende aos requisitos dos postos de trabalho oferecidos pelos empresários. Há um descompasso entre os requisitos da oferta e as características da demanda. Ter nível superior pouco ou nada pode significar em termos de aptidão para ocupar os empregos ofertados pelo aparelho produtivo.
Muitos batem a porta e ela não se abre, conduzindo esses jovens portadores de diploma a se inserir no mercado como autônomos, não por decisão própria, libertária, mas como única alternativa para ganhar dinheiro pela venda do seu trabalho.
Não é incomum encontrar pessoas que concluíram o curso superior trabalhando em ocupações que nada tem a ver com sua formação, sobretudo no mercado de prestadores de serviços, como motorista de UBER, por exemplo. Boa parte desses diplomas não são da área de Ciências Exatas e da Tecnologia onde a escassez de mão de obra é muito acentuada e a demanda insatisfeita. Muitos se formaram nas áreas das ciências jurídicas e sociais, básicas ou aplicadas, cujas aptidões especificas são limitadas e as genéricas pouco ou nada aderentes às necessidades do sistema produtivo.
O outro fenômeno, portanto, é a discrepância entre o perfil de quem procura emprego e os requisitos, em termos de habilidades e competências, de quem oferta. Em país de cultura bacharelesca que valoriza o diploma pelo diploma e não o que ele contém em termos de qualidade e aderência às necessidades da economia, precisa-se reiterar o foco no ensino básico e profissional. O primeiro, como o nome bem o revela, com ênfase na formação em matemática e português, e em disciplinas que abram o caminho (rotas) para o mercado de trabalho.
O segundo, para formar profissionais de nível intermediário em áreas técnicas demandadas pela indústria, pelo comércio, pelos serviços e pelo agronegócio. No Brasil, contrariamente à experiência britânica que muito valorizou o ensino profissionalizante de nível médio, criou-se agora uma situação inusitada: um excesso de oferta de mão de obra com curso superior completo, em geral de mediana a baixa qualidade, e um excesso de demanda por trabalhadores de nível básico e intermediário portadores de habilidades e competências aderentes aos requisitos do sistema produtivo.
Uma consequência deste descompasso é a queda na remuneração média de quem detém curso superior (cerca de 11%) e a subida do rendimento médio dos trabalhadores de nível intermediário, especialmente os qualificados nas funções mais técnicas (5,1%) segundo dados da PNAD-IBGE. Houve, portanto, uma mudança nos salários relativos, indicando onde a oferta deveria aumentar e onde precisa diminuir.
O mercado apresenta seus números. As políticas públicas de educação e formação profissional precisam estar atentos aos que eles significam.
Jorge Jatobá, Doutor em Economia, Professor Titular da UFPE, Ex-Secretário da Fazenda de Pernambuco, Presidente do Conselho de Honra do LIDE-PE e sócio da CEPLAN-Consultoria Econômica e Planejamento.