Lula e a farsa das eleições na Venezuela
Nem a Organização das Nações Unidas, nem o presidente Lula reconhecem a democracia de fachada montada por Nicolas Maduro para se manter no poder

Nada no histórico do exercício autocrata de poder de Nicolás Maduro na Venezuela poderia indicar honestidade no propósito de realizar eleições livres para a presidência da República, para as quais a oposições concorreria com o governo, como em todo processo democrático que se preze. Mesmo assim, muitos acreditaram que a promessa seria cumprida, e a oposição poderia resgatar a confiança da população na democracia, e num governo mais representativo da vontade coletiva. Para surpresa de poucos, no entanto, o ditador venezuelano não abriu espaço para os críticos do regime, cercou a votação com desinformação, declarou-se vencedor num resultado sem provas, e continuou perseguindo os opositores que questionaram sua vitória, além de se voltar para inimigos externos imaginários para justificar a opacidade da contagem dos votos.
Depois de longo sono condescendente, até o presidente Lula, aliado e amigo do ditador, apesar de condenar ameaças à democracia no Brasil, veio a público declarar que não reconhece a eleição de Maduro. “Ele sabe que está devendo explicações para o mundo”, afirmou o presidente brasileiro, que ainda aguarda as investigações da Justiça eleitoral venezuelana para dar apoio a Maduro com algum verniz de credibilidade – mesmo sabendo que a Justiça de lá é tão submetida ao regime quanto os demais poderes. Ao menos Lula admite que “a situação política do país está ficando deteriorada”, sem dar detalhes do que considera deterioração, e como um processo eleitoral sob suspeita por todos os lados integra esse quadro que contamina o continente. Quanto à sugestão de novas eleições, trata-se de proposta fadada ao deboche dos venezuelanos, que só serve para o ocupante do Palácio do Planalto se pronunciar com alguma voz de cobrança, sem parecer completamente submetido ao obscurantismo chavista.
A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou relatório, esta semana, no qual não apenas aponta a falta de transparência, mas acusa o governo de Maduro de conduzir as eleições repletas de irregularidades. Noutras palavras, a fachada da democracia venezuelana não se sustenta em pé. Ao constatarem lacunas básicas para a confiabilidade dos resultados das urnas, os enviados da ONU à Venezuela denunciam que sequer as leis nacionais foram cumpridas, bem como os prazos dos trâmites da democracia. A não publicação dos resultados por candidatos significa um fato sem precedentes nas eleições democráticas contemporâneas, segundo os membros da equipe das Nações Unidas.
A deteriorada situação da Venezuela inclui, há anos, a repressão política às liberdades individuais e aos direitos de expressão. Mais de mil pessoas foram detidas, e duas dezenas mortas pelo regime de Maduro, entre o final de julho e o início de agosto, após protestos contra os resultados de eleições indignas desse nome. O desafio da comunidade internacional, especialmente do Brasil, é dar respaldo à demanda por democracia da população, em um país quebrado, em crise social e política, que continua escorando a ditadura em votos fabricados como fake news.