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Trajeto é risco de morte

De acordo com a Organização Internacional para as Migrações, o recorde de migrantes mortos nos deslocamentos, em 2024, é uma tragédia evitável

Publicado em 23/03/2025 às 0:00
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As rotas são perigosas, mas a motivação que leva milhares de pessoas a saírem de seus países de origem para buscar morada e trabalho em outros lugares, é maior do que a ponderação sobre o risco à própria vida, e às de familiares que se aventuram nos trajetos. Todos os anos, muitos morrem, em decorrência das condições precárias de travessia, e da falta de assistência dos governos nacionais que preferem fazer de conta que o fluxo migratório não existe. Ou pior, fazem questão de transformar a postura antimigratória, não raro xenófoba, em atos de desumanidade, deixando os viajantes sem socorro nem acolhimento.
No âmbito da diplomacia internacional, refugiados e povos migrantes contam com status de preocupação especial, recebendo recursos específicos para áreas de cuidados e recepção temporária, sob a gestão de entidades não-governamentais e a supervisão da Organização das Nações Unidas (ONU). Mas na prática, quando batem à porta das fronteiras de países desenvolvidos, os migrantes, a maioria fugitiva de zonas de guerra e miséria, não são bem recebidos. Governantes, na maioria dos casos, enxergam nos fluxos migratórios um movimento de ameaça e desestabilização às economias dos países a que se destinam. E quando o presidente da maior potência ocidental, que ergueu sua história na boa vontade com os que chegavam, passa a tratar migrantes como criminosos, o mundo se depara com uma espécie de agressividade contrária aos princípios que deveriam nortear a humanidade – estabelecidos em torno da paz, da convivência e da empatia.
Quase 9 mil migrantes morreram tentando chegar em lugar seguro, em 2024, segundo a ONU. Um número recorde. Que deve ser bem maior, pois nem todas as vidas perdidas são notificadas oficialmente. Na expressão da diretora-geral adjunta da Organização Internacional para as Migrações, Ugochi Daniels, trata-se de uma tragédia inaceitável e evitável, que vem se repetindo e aumentando nos últimos cinco anos. O cenário pode piorar bastante nos próximos anos, já que em outra face dos fluxos migratórios – a fuga ambiental – o agravamento da crise climática deve fazer com que mais gente precise sair de onde nasceram e moram.
O que se pede da comunidade global – se é que existe – são sistemas de busca e salvamento, em rotas reconhecidas e seguras. Além das mortes registradas, a falta de identificação das vítimas é comum, tornando ainda mais dramática a espera das famílias desfeitas pela necessidade de migração. E mais cruel a nossa linha do tempo civilizatória, na qual a insegurança e a fatalidade associadas às rotas migratórias foram normalizadas, ou até incentivadas pela segregação que aponta os migrantes como inimigos.
A vida de quem consegue aportar em novo local para se estabelecer não é fácil, cercada por preconceitos e desafios. Mas ainda antes do início de uma nova vida, a sobrevivência se impõe no trajeto, e requer muito mais coragem, diante da incompreensão e da falta de apoio para simplesmente chegar.

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