Atualizada às 18h10
Na comemoração do aniversário de 483 anos do Recife, o boi voaria mais uma vez. Neste domingo (15), a partir das 18h, um espetáculo gratuito no Marco Zero, Bairro do Recife, contaria história do lendário boi voador que o conde holandês Maurício de Nassau colocou no ar em 1644. Por conta dos dois primeiros casos de coronavírus (Covid-19) confirmados no Estado, a apresentação foi adiada.
O motivo do boi voar foi a inauguração da primeira ponte do Brasil: a Ponte do Recife, que séculos depois foi substituída pela atual Ponte Maurício de Nassau. A sua construção levou quatro anos - tanto tempo que a população começou a fazer seus gracejos: “é mais fácil um boi voar que a ponte ficar pronta”. No fatídico dia da abertura da estrutura, Nassau levou um animal de verdade (e manso) para caminhar entre a população. Ao anoitecer, um boi empalhado erguido por roldanas surgiu no céu e sobrevoou a estrutura, para o encanto dos espectadores.
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A partir das 15h, os atores vão estar nas ruas, trajando o figurino de época, para tirar foto e divulgar a peça. A ocasião também é oportunidade para comer e beber. Além da cervejaria Ekäut, o bairro vai receber barracas de culinária judaica, africana, e de restaurantes locais: Negra Linda, da Ilha de Deus, Boi Voador, do Recife Antigo, Espetinho da Ceça, da Bomba do Hemetério.
A peça narra não só este acontecimento que habita o imaginário popular do pernambucano, mas o contextualiza dentro panorama que vivia Pernambuco: a colonização e expulsão dos holandeses. Além do próprio Nassau, outros personagens históricos aparecem, como os pintores Frans Post e Albert Eckhout e os líderes da resistência recifense Fernandes Vieira, Ana Paz, Felipe Camarão e Henrique Dias.
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Dois palcos e uma réplica da ponte serão montadas para a encenação. Além do cenário, os 90 atores vão interagir com a paisagem local, surgindo das janelas de prédios históricos do Recife Antigo. Para o idealizador, gerente de Projetos Turísticos e especialista em História do Nordeste, Bráulio Moura, essa relação é um dos diferenciais.
“Você tem as histórias contadas ali, nas praças, nos monumentos, nas janelas. A ideia é aproximar as pessoas, criando laços de afetividade com a cidade, seus bens históricos e, quem sabe, incentivá-las a cuidar melhor, a preservar, a recontar a história para seus descendentes”, afirmou.
Esta é a terceiro vez que a Prefeitura do Recife promove a peça, com realização da Metron Produções. Nas duas primeiras edições, o texto foi de José Pimentel. Este ano, é de Ruy Aguiar, que também assina a direção. Em 2019, a montagem ganhou o Prêmio Nacional do Turismo como melhor iniciativa do Brasil de aproveitamento do patrimônio cultural no turismo.
A atriz Angélica Zenith, 29 anos, interpreta Ana Paz desde o início. “Acho que é uma marca da nossa cidade fazer teatro ao ar livre. Temos Paixão de Cristo, Baile do Menino Deus. É uma tradição reunir muitos atores, dançarinos, artistas, e o Boi Voador é assim, grandioso”, elogiou.
Segundo a secretária municipal de Turismo, Ana Paula Vilaça, são esperadas 10 mil pessoas para a edição deste ano. “O cenário já começou a ser montado e no sábado já fica pronto”, revelou.
Maurício de Nassau e o Recife
A ideia do espetáculo surgiu quando pensou-se em fazer o aniversário de 2018 do Recife com uma festa de tema que habitasse o imaginário popular. “O período holandês, apesar de ter durado 24 anos, de fato desperta muito orgulho. Não pela presença holandesa em si, mas pelos feitos e coisas que aconteceram aqui - os pioneirismos”, disse Braulio Moura.
A chegada de Nassau com uma comitiva de intelectuais, artistas e paisagistas colocou Recife em destaque. Foi com ele no comando que a “Cidade Mauricea” construiu a primeira sinagoga das américas, o primeiro observatório astronômico do Hemisfério Sul, a primeira fábrica de cerveja.
“É com ele que a gente vai ter pela primeira vez nas Américas manifestação de artes plásticas laicas, pintura das paisagens, dos mangues. Tem a construção de palácios como o do Friburgo e Boa Vista, da primeira ponte do Brasil, de canais, de jardim zoológico, jardim botânico - mudanças que transformam o Recife como a principal cidade do Novo Mundo”, relatou.
Inclusive, Nassau financiou do próprio bolso a conclusão da Ponte do Recife. “Ela começou a ser construída em pedra, com dinheiro da Companhia das índias Ocidentais. Mas ela queria, na verdade, explorar o açúcar, e não investir”, explicou Bráulio. A interrupção foi o motivo da demora de quatro anos para finalizá-la. “A estrutura foi concluída em madeira. Nassau resolveu cobrar pedágio para as pessoas atravessarem no dia da inauguração”, disse. Com o dinheiro arrecadado, cobriu todo o custo que teve.
Resistência pernambucana
A insurreição pernambucana também mexe com o sentimento de quem nasceu no Estado. Não foi fácil para a Holanda conquistar o Recife. Os soldados encontraram resistência, mesmo após terem assumido controle da cidade. Os embates só deram trégua quando Nassau assumiu e aplicou uma política mais branda, com tolerância religiosa. “Ele fez uma certa conciliação com senhores de engenho e promoveu um momento de paz depois de quase 10 anos de violência”, contou.
Mesmo assim, quando acaba o seu governo e um conselho mais rígido toma posse, retorna a revolta que estava adormecida.
“É quando o Exército brasileiro primeiramente se entende como Exército, para combater os holandeses que aqui restavam. Houve conflito em Itamaracá, Goiana (com as heroínas de Tejucupapo), Vitória em Santo antão, e culminou na Batalha dos Guararapes, quando os holandeses finalmente perdem a guerra do açúcar e se rendem. Em 1654, entregam a chave da cidade e vão embora.”
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