FEMINICÍDIO

Em cinco dias, Pernambuco tem pelo menos cinco mulheres assassinadas

Segundo a Secretaria de Defesa Social (SDS), de janeiro a novembro de 2020, número de feminicídios aumentou 26,8% em relação ao mesmo período de 2019

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Amanda Rainheri

Publicado em 05/01/2021 às 18:48 | Atualizado em 05/01/2021 às 19:13
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Rayane foi morta a tiros dentro de casa, em Goiana, no Grande Recife. Dione foi jogada de uma ponte no Rio Tejipió, na Zona Oeste da capital. Em menos de uma semana, Pernambuco já conta pelo menos cinco mortes de mulheres em 2021. A maioria das vítimas foi assassinada por companheiros, pelo simples fato de serem mulheres. Para quem atua na linha de frente do combate ao feminicídio, o aumento de casos e falta de ação de quem deveria proteger as vítimas preocupa.

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O corpo da manicure Dione Gomes da Silva, de 40 anos, foi encontrado nesta terça-feira (5) pelo Corpo de Bombeiros, no Rio Tejipió. Ela havia desaparecido na noite do sábado (2), quando saiu de casa, no bairro de Monte Verde, em Jaboatão dos Guararapes, Grande Recife, para visitar o namorado Maurício Alves de Andrade, 42, na Imbiribeira, Zona Sul da capital. Segundo a família, o homem teria ligado para um parente pedindo para socorrer a manicure, que estaria ensanguentada. Ao chegar na Ponte Motocolombó, ele teria pedido que parasse o veículo e jogado a vítima no rio. Não há informações se Dione estaria viva ou morta no momento da queda.

"Ele chegou aqui, bateu na janela e disse que a esposa estava passando mal. Eu imediatamente acordei, peguei o carro, coloquei na beira do portão. Ela estava deitada, com as costas pro chão, um pano branco coberto. Porque ele disse que ela teve um derrame, caiu, bateu a cabeça e ficou sangrando. Aí eu pensei que estava desmaiada", explicou o parente do suspeito, que preferiu não se identificar. Segundo ele, após colocar a mulher no carro, o companheiro teria voltado para buscar um balde com lençóis ensanguentados. Juntos, eles saíram em direção à Policlínica de Afogados, na Zona Oeste da capital.

Foi quando o carro passou pela ponte que Maurício pediu para parar. Eu questionei 'pra quê parar?' e ele disse que era pra jogar os panos com sangue. Aí eu parei, mas com medo dele estar com alguma arma ali, alguma coisa. Ele realmente jogou o balde, mas depois abriu a porta de trás do carro e pediu ajuda pra pegar ela", conta a testemunha. "Eu falei que o hospital estava bem pertinho, falei 'vamos levar pro hospital, por favor', aí ele mesmo pegou ela e jogou dentro da maré. Eu fiquei totalmente paralisado", revelou a testemunha, bastante abalada, em entrevista à Rádio Jornal.

Segundo a filha da vítima, que não terá identidade revelada, a mãe tinha um relacionamento com o suspeito há apenas nove meses, marcado por ciúmes. "Ele não deixava ela fazer nada. Até um riso que ela desse incomodava ele, chegou ao ponto até de ela terminar com ele, mas como ela tinha o coração mole, ela voltou com ele. "Me lembro que a última vez que a gente conversou, ela estava lá em casa deitada na minha cama, e disse que ia construir uma casa atrás da minha para que a gente pudesse viver mais perto uma da outra", continuou a filha. 

À tarde, Maurício se apresentou ao Departamento de Homicídios e Proteção a Pessoa (DHPP), no Cordeiro, Zona Oeste da capital, acompanhado do advogado. O homem recebeu voz de prisão e foi autuado em flagrante pelos crimes de feminicídio e ocultação de cadáver. A previsão era de que ele prestasse depoimento nesta terça-feira (05) e aguardasse audiência de custódia online, que deve acontecer nesta quarta.

Assim como Dione, outras mulheres perderam a vida em 2021 em crimes investigados como feminicídios. Rayane Costa de Lima, 20, foi assassinada a tiros dentro de casa por um homem que queria ter um relacionamento com ela. Em Pedra, no Agreste, uma mulher de 43 anos foi assassinada no último dia 3. O suspeito é o marido. Também no domingo, outra mulher, que não teve idade nem nome informado, foi assassinada em Jardim São Paulo, na Zona Oeste do Recife, com golpes de arma branca. Já na última segunda-feira (4), uma morte foi registrada em Palmares, na Zona da Mata.

Segundo a Secretaria de Defesa Social (SDS), em novembro do ano passado foram contabilizados sete casos de feminicídios, contra um no mesmo período do ano passado. De janeiro a novembro (últimos dados disponíveis), o aumento foi de 26,9%, subindo de 52 registros em 2019 para 66 em 2020.

Para Regina Célia Barbosa, vice-presidente do Instituto Maria da Penha (IMP), os números evidenciam uma realidade preocupante. "A pandemia chega quando a política pública já está fragilizada. Não temos um Plano Nacional de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher, que é um documento importantíssimo para a elaboração de políticas públicas e estratégias de enfrentamento. Estamos usando as mesmas velhas ferramentas para problemas novos, como a pandemia", avalia. "Precisamos de campanhas que possam divulgar o aspecto do rigor da lei. Os agressores precisam ter esse temor de que a lei será aplicada. Ela não é perfeita, mas é completa e a efetividade tem se fortalecido", completa.

Segundo ela, durante a pandemia do novo coronavírus, a mulher tem experimentado todas as formas de violência. "Temos altos índices de violência psicológica, moral e patrimonial. Outra questão que aumentou foi a violência sexual marital, aquela cometida pelo próprio marido. Era um termo que a gente usava em pesquisas, mas que se tornou uma realidade recorrente." Regina Célia critica a falta de investimento das autoridades em qualificação para os servidores e também a falta de delegacias de plantão especializado nos finais de semana para o atendimento a mulheres vítimas de violência.

Em nota, a SDS informou que, "para reforçar o combate à violência contra a mulher e evitar que esse tipo de crime culmine em feminicídio, a Secretaria de Defesa Social adota uma série de medidas, como a intensificação da Patrulha Maria da Penha, dos Plantões 190 e das 11 Delegacias da Mulher." A pasta lembrou ainda que onde não houver uma unidade especializada a população pode procurar qualquer delegacia de Polícia Civil mais próxima e, em caso de emergência policial, a orientação é ligar para o 190 Mulher.

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