As praias lotadas e os flagrantes de desrespeito aos protocolos para evitar a disseminação do novo coronavírus, aliados à ineficiência da fiscalização do poder público, podem ser o prenúncio de uma situação ainda mais preocupante. No último final de semana, blocos e troças foram às ruas do Recife e Olinda, na Região Metropolitana, mesmo com o pedido de não haver aglomerações. O Estado anunciou a suspensão do Carnaval, mas ainda não decidiu sobre manter ou não o feriado. A possibilidade de reunião de centenas de pessoas nas ruas preocupa especialistas.
Nas imagens registradas no fim de semana, há aglomerações em ensaios de blocos no Pátio de Santa Cruz, na Boa Vista, Centro da capital, e nas ruas da Mangueira, na Zona Oeste. Nos vídeos, as pessoas aparecem sem máscara. Uma das troças seria a "Prato Misterioso", fundada em 1919. A reportagem não conseguiu contato com o bloco.
Segundo a Polícia Militar, PMs chegaram a entrar em contato com a organização do evento no Pátio de Santa Cruz antes de sua realização, orientando a encerrar a apresentação, o que não ocorreu.
Policiais também intervieram no desfile em comemoração aos 47 anos do Menino da Tarde, em Olinda. Segundo o presidente do bloco, Sílvio Botelho, que também é o criador dos bonecos gigantes, a intenção era fazer um pequeno cortejo de um quilômetro, com apenas nove pessoas, ao som de clarins, que pudesse ser acompanhado de casa ou pelas redes sociais. Quando o cortejo chegou ao Largo do Amparo, foi encerrado pela PM.
Segundo ele, outros blocos também devem sair às ruas apenas com os estandartes durante o período. Botelho acredita que será difícil manter as pessoas em casa. "O povo vai pra rua de todo jeito, nem que seja batendo lata. Está sedento pelo Carnaval."
O Governo de Pernambuco anunciou a suspensão da festa em dezembro. Vários clubes se posicionaram favoravelmente à decisão, como os tradicionais Galo da Madrugada e Homem da Meia Noite. "Por mais doloroso que seja, não tem como ser diferente", avaliou Luiz Adolpho, presidente do calunga. Para ele, o posicionamento dos blocos é importante para estimular as pessoas a ficarem em casa. "Mudamos nosso tema para 'Faltam 365 dias'. Pedimos para as pessoas esperarem. Mas é um desafio grande, porque é uma questão de base, de educação das pessoas."
Em nota, a Prefeitura de Olinda disse que mantém diálogo com as agremiações e que manterá o esquema de segurança para evitar descumprimento de medidas, com Guarda Municipal e PM. O município disse ainda que aguarda definição do Estado sobre a manutenção do feriado para definir operações. Já a Prefeitura do Recife afirmou que "não promove ou autoriza a realização de shows, eventos ou apresentações artísticas/culturais", e que seguirá orientando e fiscalizando.
A Secretaria de Defesa Social (SDS) informou que quem desrespeitar as regras poderá ser autuado por não adotar medidas sanitárias de prevenção à disseminação de doenças infectocontagiosas. A pena é de um mês a um ano de prisão, além de multa. Já a Secretaria de Turismo e Lazer de Pernambuco lembrou que as prévias estão vetadas. A pasta salientou que a fiscalização cabe aos municípios.
As aglomerações preocupam especialistas. "É surpreendente estar havendo prévia. Essas aglomerações, tanto de fim de ano como de Carnaval, vão ter um preço", apostou a infectologista Vera Magalhães. Para ela, é possível que em 2022 a festa não aconteça. "Mesmo com vacina, é preciso que 70 a 80% da população esteja vacinada. Há a previsão de 100 milhões de doses, que atenderiam a 50 milhões de pessoas, e temos mais de 200 milhões de brasileiros. Vai demorar para que haja vacinação."
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