Paulo Câmara diz que ''sem restrições'', Pernambuco corria o risco de acelerar um colapso
O governador concedeu entrevista à TV Jornal e falou de temas como vacina e aglomeração nos ônibus; confira
Diante do avanço da covid-19, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), justificou a necessidade das novas medidas restritivas, adotadas nesta semana, como forma de evitar um "colapso". Em entrevista à TV Jornal, nesta sexta-feira (5), o gestor falou sobre vacinação, aglomeração nos ônibus, aulas presenciais na rede pública de ensino e demais temas ligados ao período pandêmico pelo qual passamos.
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"Nas últimas duas semanas, o quadro se agravou. Na última sexta-feira (26), tínhamos 91% de leitos de UTI ocupados, abrimos 52 leitos essa semana e esse número foi para 94%. Estamos numa situação crítica, alguns hospitais estão trabalhando 100%, ou seja, não tem vaga de leito de UTI, e o cenário se repete, com a mesma intensidade, na rede privada. Há uma avaliação criteriosa cientifica de que a pandemia está em ritmo de aceleração no nosso Estado e ensejou que continuássemos o trabalho de reabertura de leitos e, também, focássemos em ampliar as restrições. Sem essas restrições, a gente corria risco de acelerar um colapso, que é o pior dos mundos", disse Paulo Câmara.
Desde a quarta-feira (3), atividades não essenciais em todos os 184 municípios de Pernambuco devem fechar entre 20h e 5h, de segunda a sexta-feira. Durante os finais de semana, essas atividades não estão autorizadas a funcionar. Aos sábados e domingos também estarão fechados clubes sociais, praias e parques. Nas praias, no entanto, será permitida apenas a prática de atividades esportivas individuais.
Leitos
Não há desperdício de leito, nem de equipamento (dos hospitais de campanha). Eles foram remanejados para outras estruturas e estamos licitando novas estruturas provisórias, que serão abertas em março.Paulo Câmara, governador de Pernambuco.
Questionado sobre o fechamento e, agora, a reabertura de hospitais de campanha, o governador disse que eles foram fechados, pois não havia demanda suficiente que justificasse o custo de manter a estrutura em funcionamento. "Com a diminuição da procura, muitos dos hospitais de campanha ficaram ociosos. As administrações municipais entenderam que o custo de manter esses hospitais não compensava, pela falta de procura. E o Estado tem ampliado a estrutura física e aumentando os leitos de UTI. Estamos numa segunda onda, podemos dizer assim, mas o número de leitos em disposição, hoje, é maior que nos períodos mais críticos do ano passado", afirmou o socialista.
Confira a íntegra da entrevista com o governador Paulo Câmara:
Panorama geral
Paulo Câmara: Desde o último mês de dezembro, estávamos registrando um aumento lento e gradual nos casos de covid-19, em óbitos e internações. Nas últimas duas semanas, o quadro se agravou, na sexta-feira (26), tínhamos 91% de leitos de UTI ocupados, abrimos 52 leitos essa semana, temos a expectativa de abrir 20, e esse número foi para 94%. Estamos numa situação crítica, alguns hospitais estão trabalhando 100%, ou seja, não tem vaga de leito de UTI e o mesmo cenário se repete na rede privada. Há uma avaliação criteriosa, científica, de todas as áreas da saúde de que a pandemia está em ritmo de aceleração no nosso Estado e ensejou que continuássemos o trabalho de reabertura de leitos e, também, focássemos em ampliar as restrições para que a população pudesse ficar mais em casa, com fechamento de algumas atividades no fim de semana e restrição de horário, buscando diminuir o aumento de casos. Se for possível baixar com rapidez (os casos), ótimo. Se pelo menos estabilizar, dá condições de continuar trabalhando. Mas sem essas restrições, a gente corria risco de acelerar um colapso, que é o pior dos mundos, pois as filas aumentam e a capacidade de atendimento no sistema de saúde fica aquém do necessário e isso resulta em vidas perdidas.
Novo lockdown?
Paulo Câmara: Se observarmos como fizemos ano passado, teremos uma espécie de lockdown nos próximos dois fins de semana. Temos o horário reduzido e vamos continuar observando os índices a cada hora, a cada momento e a tecnologia permite isso, ter condição de avaliar região a região. Se os números continuarem piorando, vamos ter que buscar formas ainda maiores de restrição. O nosso objetivo é salvar vidas, se a solução para salvar vidas for restrições mais duras, não vamos hesitar em fazer, mas a experiência do ano passado nos mostra que podemos tentar um caminho diferente, que é a restrição de horário e fechamento nos fins de semana. Estamos colocando em prática agora, teremos o primeiro fim de semana mais rígido e esperamos já ter resultados nos próximos dias.
Transporte público
Paulo Câmara: Infelizmente, não há transporte público de massa que tenha melhorado na pandemia. Eles são adaptáveis, mas foram pensados em receber muita gente e Pernambuco ainda tem a característica de receber toda a Região Metropolitana no sistema de integração. Nunca deixamos de afirmar que precisamos melhorar. Por isso, investimos 20 milhões a mais em subsídios para que empresas possam aumentar o número de ônibus em circulação e chegamos a 200 ônibus a mais, olhando as linhas com maior procura nos horários de pico. Trabalhamos para aumentar a segurança, temos seis terminais em obras, instalamos pias, reforçamos equipes de limpeza, distribuímos milhares de máscaras, incentivamos o horário social, para que as pessoas possam sair do horário de pico, com passagem mais barata e temos a certeza de que precisamos avançar e melhorar. Agora, mesmo com ônibus lotado ou com menos gente é usar máscara, higienizar as mãos quando descer. Sabemos que o transporte precisa ser utilizado, ele é utilizado por profissionais de saúde, inclusive. Mas quem puder contribuir mais é o que pedimos, fazemos a restrição para aglomerar menos, as pessoas precisam ter a consciência de que se podem procurar o comércio só uma vez e, hoje procuram duas, vamos procurar uma vez, vamos diminuir a ida, vamos nos resguardar no fim de semana. A restrição busca setores, ações, que podem ficar nessas duas semanas mais recolhidos sem maiores prejuízos, foi nessa ideia que trabalhamos, a essencialidade é salvar vidas, é a tentativa de manter as coisas abertas e salvar vidas e não ter outras restrições. Sabemos que é danoso no aspecto econômico e social, tentamos evitar e vamos vendo maneiras de melhorar.
Projeto
Paulo Câmara: Mandamos um Projeto de Lei para a Assembleia Legislativa dando gratuidade nos ônibus para pessoas desempregadas, na Região Metropolitana, mas fora do horário de pico, então buscamos diminuir o ir e vir no horário de pico.
Vacinação
Paulo Câmara: Estamos atrasados em relação à vacina. O Brasil não se planejou adequadamente no ano passado, enquanto outros países avançaram. Ainda não temos o ritmo necessário por absoluta falta de vacinas, não é por logística, por falta de seringa, de agulha, entregamos as vacinas que chegam em menos de oito horas em todas as regiões de Pernambuco. Estamos pressionando e buscando alternativas de comprar onde existem vacinas, o esforço dos governos estaduais de ver a possibilidade de acelerar a produção da vacina russa a Sputnik e que ela seja comprada e incluída no Plano Nacional de Imunização (PNI). E buscamos que o calendário seja cumprido, recebemos planilha na semana passada com previsão de 46 milhões de doses e ontem mudou para 30 milhões de vacinas. A falta de previsibilidade que atrapalha, se tivermos planejamento que seja cumprido, e se chegarem 30 milhões de doses em março e mais 50 milhões em abril, damos um passo fundamental para atingir um público mais vulnerável hoje nos leitos que são pessoas com mais de 60 anos. Eles ocupam mais de 60% dos leitos, então se houver êxito na entrega das vacinas, poderemos cobrir essa população nos próximos sessenta dias e será um grande passo para cuidarmos de outras áreas, outros profissionais, termos um olhar mais atento a quem tem faixa etária menor, mas tem comorbidade.
Governadores
Paulo Câmara: Vamos focar em outras frentes e trabalhar para que ações como a que fizemos com a vacina Sputnik tenham celeridade na Anvisa, que vacinas autorizadas sejam adquiridas com mais rapidez pelo governo federal. Temos um passivo, largamos atrasados e o que não podemos é que se perpetue. Não pode ter mais prejuízo é o enfoque que os governadores têm buscado, pois vemos muita competência de cada um de nós, com a vacina chegando, as prefeituras estão adaptadas, as equipes prontas, agulhas e seringas compradas, falta nada, só a vacina. Então, a prioridade é que a vacina chegue. Pela primeira vez temos cronograma, nem tínhamos um, e mesmo alterado caindo de 46 milhões para 30 milhões de doses, esperamos que seja cumprido.
Diálogo com Ministério da Saúde
Paulo Câmara: O diálogo existe, não podemos dizer que não estamos sendo atendidos pelo Ministério da Saúde, ele busca nos passar as informações, mas o planejamento não é cumprido. E quando temos a autoridade maior do País, que é o presidente da República, dando sinais desencontrados com relação à importância da vacina, à gravidade da pandemia, isso tudo atrapalha. Mas espero as portas abertas, isso tem acontecido, o Ministério tem nos atendido. O que precisamos é o cumprimento do planejamento.
Critério de vacinação nos municípios
Paulo Câmara: Os critérios das vacinas estão sendo respeitados. Há critérios com relação à faixa etária, profissionais de saúde, número de indígenas, quantidade de casas de abrigo e de idosos nestes ambientes e temos acompanhado em alguns municípios que têm conseguido avançar que é mais cálculo e projeções. Alguns municípios viram que a projeção de população com 85 anos houve alguma sobra de doses, o número de profissionais de saúde não alcançou o número previsto, isso dá certa manobra para avançar no plano de imunização para idades mais baixas e vemos isso em alguns municípios. Alguns utilizam aplicativos, com agendamento mais preciso, isso faz com que a flexibilidade possa ocorrer e ao nosso ver tem feito bem, pois chega a mais pessoas em faixas etárias que precisam da vacina e quanto mais avançar, será importante para desafogar sistema de saúde.
Hospitais de campanha
Paulo Câmara: Os hospitais de campanha foram abertos, em sua maioria, pelos municípios e no momento mais grave eles deram importante contribuição à saúde do Estado, ajudando com leito de enfermaria e alguns com UTI. Com a diminuição da procura, a partir de agosto, muitos dos hospitais de campanha ficaram ociosos, as administrações municipais entenderam que o custo de manter esses hospitais não compensa pela falta de procura. Ao mesmo tempo, o Estado tem ampliado a estrutura física e aumentado os leitos de UTI. Estamos enfrentando uma segunda onda, podemos dizer assim, mas o número de leitos à disposição hoje é maior que nos períodos mais críticos do ano passado. Não há desperdício de leito e de equipamento, eles foram remanejados para outras estruturas e serão utilizados nas expansões que estamos projetando, expansão não só na região metropolitana, mas no Agreste, no Sertão. Houve decisão lá atrás de fechamento, mas o governo do Estado está compensando qualquer falta de leito e estamos licitando estruturas provisórias que serão abertas em março, estamos buscando compensar essa questão, mas no momento cabia ao gestor municipal a decisão, diante da escassez de recursos e da falta de demanda.
UTIs
Paulo Câmara: Temos hoje mais de mil leitos de UTI com a maior capacidade de utilização já vista, quando tínhamos quase 100% da capacidade no ano passado, aquilo correspondia a 500 e 600 leitos. Aumentamos em seguida e, em agosto, não tivemos nenhum número de ocupação perto dos 90%, esse cálculo precisa ser feito, mas temos mais leitos utilizados hoje do que naquele momento.
Internações
Paulo Câmara: Temos mais pessoas internadas do que no ano passado, mas tinha fila. Infelizmente, muitas pessoas faleceram por falta de leitos. É isso que queremos evitar quando adotamos medidas restritivas. A gente quer evitar que a quantidade de pessoas esperando por leitos não corra na proporção do ano passado, fruto de tudo que foi a pandemia que chegou rápido e os sistemas de saúde não estavam preparados. Para se ter ideia, essa semana abrimos 72 leitos, se olharmos o que representa no passado, com normalidade, era o quantitativo do Dom e Hélder e do Miguel Arraes juntos.
Aulas presenciais
Paulo Câmara: Quando suspendemos o retorno das aulas, foi com agravamento da pandemia e se olharmos a grande parcela da população estudantil é das escolas públicas municipais. Mantivemos abertas as privadas que possuem um número bem menor de alunos que a pública e um ensino médio estadual, com jovens em média de 14 e 15 anos, que têm obediência ao protocolo sanitário mais fácil de ser respeitada. Temos visto que as escolas têm sido rigorosas nos protocolos, então na ocorrência de algum caso de alunos ou professor com covid, o protocolo é acionado, a turma é fechada, com isolamento e estamos vendo respeito. Há por parte das autoridades um reconhecimento de que, dessa forma, está funcionando, pode se manter as escolas abertas. Então, enquanto tiver essa orientação na ciência, vamos seguir. Se virmos que será necessário o retorno 100% em modo remoto, vamos adotar, mas temos visto que a capacidade tem funcionado com 50% e demais alunos em ensino remoto e sem surto significativo, nem avanço da doença em ambiente escolar.
Fiscalização
Paulo Câmara: A fiscalização será intensificada e se os protocolos forem seguidos, as pessoas terão consciência que não dá para burlar, pois serão penalizados com ausência do serviço e impossibilidade de circular. O setor de transporte de aplicativo não pode permitir passageiro sem máscara, o comércio não pode permitir entrada de cliente em loja sem máscara, não pode faltar álcool no estabelecimento, tudo precisa ser feito. Vamos intensificar a distribuição de máscaras e, infelizmente, quando as notícias ruins chegam o efeito é pedagógico e as pessoas voltam a observar a seriedade dessa doença. Houve relaxamento e ele não será mais permitido e quem tem apreço pela vida precisa respeitar. Não é só sua vida, é o entorno. Todos temos papel decisivo não de punir, a conscientização faz muito mais efeito que punição.
Comparando o momento atual com o momento de reabertura
Paulo Câmara: Reabrimos e fizemos o plano de convivência do momento, com números estáveis, com viés de queda, havia projeção de diminuição nos casos, as unidades públicas de saúde estavam preparadas com respiradores, equipes médicas contratadas, tínhamos o auxílio emergencial em vigor, isso dava condição de assistência à população. Os estados estavam recebendo auxílio de medidas aprovadas no Congresso, garantindo assistência à saúde. Hoje o auxílio ainda não voltou, não temos garantia de alguma ajuda aos Estados, em termos financeiros, esse momento exige ter capacidade de olhar o que precisa ser feito no aspecto social e seremos incansáveis. Ver o prejuízo na renda das pessoas, tudo isso é pesado, a experiência nos permite tomar medidas com mais propriedade, segurança e é fruto de aprendizado que esperamos que dê certo.
Não há desperdício de leito, nem de equipamento (dos hospitais de campanha). Eles foram remanejados para outras estruturas e estamos licitando novas estruturas provisórias, que serão abertas em março.
Paulo Câmara, governador de Pernambuco.