SOLIDARIEDADE

Dia do Voluntário Social: as dificuldades e a motivação de quem dedica a vida (ou parte dela) a quem mais precisa no Grande Recife

Neste dia 7 de julho, é comemorado o dia de quem pratica atos de serviço no Brasil. Conheça a história de alguns deles

Imagem do autor
Cadastrado por

Katarina Moraes

Publicado em 07/07/2021 às 6:00 | Atualizado em 07/07/2021 às 10:11
Notícia
X

Rafael Araújo, de 36 anos, escolheu trocar a defesa das leis pela defesa da vida ao fechar o escritório de advocacia para se dedicar como Voluntário Social - trabalho comemorado nesta quarta-feira (7). Para ele, a pergunta não é por que fazer os atos de serviço; mas como não fazer. Vivendo em um país com taxa de desemprego de 14,7%, segundo últimos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e com cerca de 9% da população passando fome, de acordo com a Rede Penssan, é “inconcebível normalizar a situação das pessoas nas ruas”. Foi com as duas mãos e um sentimento de “Brasil” - parafraseando Carlos Drummond de Andrade - que o empresário fundou a Samaritanos, com o olhar para os mais “invisíveis” da sociedade.

O projeto começou há quase seis anos a partir de uma inquietação de 14 amigos integrantes da Paróquia de Casa Forte, no bairro de mesmo nome, na Zona Norte do Recife. Aos poucos, mais interessados chegaram e começaram a ser divididos por expertise e interesse, criando comissões com atuações em áreas diferentes. Hoje, o Samaritanos conta com cerca de 400 voluntários, que se dividem em escalas para entregar quentinhas toda terça-feira em aproximadamente 20 bairros do Recife, e dez comissões ativas, coordenadas por quase 50 pessoas em uma gestão que Rafael elenca como “horizontal”. É assim que, mais do que alimento, o grupo traz esperança de um futuro.

“Quando fomos para as ruas e vimos a complexidade da situação das pessoas ali, colocamos como meta conseguir mudar vidas, não só atender a parte assistencial, e sabíamos que era um grande desafio. Minha motivação são as pessoas. Amo gente, não vejo diferença entre quem está em situação de rua e quem está em um apartamento. Não consigo ficar indiferente ao sofrimento e à desigualdade. Resolvi colocar os privilégios que tive a favor dessas pessoas marginalizadas e sem voz”, conta Rafael.

O trabalhador de serviços gerais Alex Santos pode dizer com convicção que tais ações mudaram a vida dele. Há sete anos, veio do Rio de Janeiro para o Recife com a promessa de um emprego, mas, quando chegou, viu que se tratava de uma empresa clandestina, e começou a morar nas ruas. “Passei quase seis meses nas ruas, não foi fácil. Só eu e Deus sabemos o que eu passei. Toda semana eles iam levar lanche para as pessoas, e eu os conheci. Falei que o que eu mais almejava era um emprego, e eles disseram que iriam correr atrás. Conseguiram uma vaga para mim como zelador em um prédio, e hoje estou em uma empresa terceirizada de limpeza também pela força deles. Agora, a vida está uma maravilha quando comparada com a que tive”, relata.

Os voluntários do Samaritanos são uma parcela das cerca de 7,2 milhões de pessoas que praticavam o voluntariado em 2019 no Brasil, segundo último levantamento do IBGE sobre o assunto. O suplemento Outras Formas de Trabalho, da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios Contínua (Pnad), trazia que, mesmo com todas as barreiras econômicas e sociais do país o trabalho era realizado “de forma consistente”, com duração média das atividades de 6,5 horas por semana e a maior parte dos voluntários, 48,4%, se dedicando quatro ou mais vezes por semana.

É o caso de Stone Silva, que aos 12 anos já sentava no gabinete do então prefeito do Recife para cobrar soluções para a Comunidade do Bode, no Pina, na Zona Sul da capital, que, dentre as várias demandas, precisava urgentemente de melhorias no saneamento básico e no calçamento das vias. Foi ali que surgiu nele o desejo de mudar a realidade da vizinhança: ao invés de dedicar o ‘tempo livre’ para ajudar as pessoas ao redor, o educador transformou os atos de serviço em um projeto de vida. Agora com 27 anos, ele coordena o grupo Amigos Solidários, da Paroquia Nossa Senhora do Rosário.

BOBBY FABISAK/JC IMAGEM
A engenheira Marcela Vasconcellos dá aulas de inglês voluntariamente durante a pandemia da covid-19 - BOBBY FABISAK/JC IMAGEM

“Servir dentro da comunidade não é fácil, porque a cada dia temos novos desafios; mas estar conectado a ela me possibilita sonhar ainda mais, porque estou falando do meu quintal, de cuidar do meu entorno, dos meus. A duas ruas de mim, tem moradores de palafitas sofrendo. É um servir permanente. [...] Parte de um lugar de incômodo, de não ser só mais um, mas de estar ali fazendo e buscando. Fico muito inquieto, o que ajuda no desenvolvimento do trabalho que a gente faz”, relata.

O Amigos Solidários trabalha com três frentes: as ações de cidadania, o Dia das Crianças e o Natal Solidário. Entretanto, com a chegada da pandemia e o acentuamento das dificuldades na Comunidade do Pina, precisou intensificar as ajudas. Agora, 28 jovens coordenados por outros três distribuem semanalmente 250 marmitas e, uma vez por mês, entre 100 e 150 cestas básicas para famílias da região. Entre abril de 2020 e julho de 2021, mais de 13 mil quentinhas, 5 mil cestas básicas, 2 mil máscaras contra a covid-19 e mil kits de higiene foram entregues.

Uma ajuda que, para a família de Ana Paula, de 39 anos, faz toda diferença. Morando em uma palafita com três filhos, ela e o marido estão desempregados e dependem do benefício do Bolsa Família e de serviços temporários - que “dão para comprar o pão” -, mas a alimentação da família é garantida pelas doações. “Meu armário chega a dar pena, mas eles nunca nos deixam desamparados, sempre vêm saber se a gente está bem, se a gente está precisando de alguma coisa. Eles nos ajudam muito, tanto a mim, quanto à Comunidade do Bode. São maravilhosos com a gente”, diz.

Na cidade ao lado, em Jaboatão dos Guararapes, ainda no Grande Recife, a engenheira de produção Marcela Vasconcellos, 28, também começou há 10 anos a usar seu conhecimento para ajudar quem precisava. Ela costumava participar de ações voluntárias para jovens carentes no centro comunitário Casa da Esperança, no bairro de Candeias, mas sentia um impulso para fazer além disso: algo que pudesse transformar a vida das pessoas. Assim, a então caloura universitária começou um curso pré-vestibular no local. A empolgação, contudo, esbarrou na falta de bagagem educacional dos adolescentes.

“Essa foi a minha primeira frustração. Comecei a dar aula e vi que as pessoas não tinham educação básica, e que não conseguiriam chegar lá em 2 ou 3 meses”, afirma. Então, o projeto foi interrompido, mas logo ela deu início a um curso de inglês na instituição - língua que aprendeu quando morou nos Estados Unidos. “Quando voltei, voltei com a cabeça de que não existe um herói. Antes, eu tinha a expectativa de que iria salvar a vida das pessoas, e hoje tenho a visão de que uma conversa, ou ter alguém que acredite nelas, que está disposto a passar um conhecimento e dizer algo que elas não pensavam antes, também pode mudá-las.”

Com a chegada da pandemia em 2020 ao Brasil, as aulas foram interrompidas; mas não a vontade da engenheira de praticar o bem. “Recentemente, achei um pessoal que dá aulas online e me inscrevi no projeto. Duas vezes por semana, ensino inglês para uma turma de quatro pessoas. É bem mais desafiador, porque não tem tanta interação, e é difícil saber se a pessoa entendeu sem ver o semblante dela”, descreve.

Marcela não foi a única que teve um projeto voluntário suspenso pela covid-19. Voluntário há quase 20 anos no Instituto Espírita Allan Kardec, em Salgadinho, Olinda, o engenheiro aposentado Valmir Costa viu as atividades do Lar Ceci Costa praticamente pararem. O centro, que atendia cerca de 150 crianças carentes com oficinas de dança, teatro, reforço e leitura realizadas no contra turno escolar, hoje consegue manter contato com apenas aproximadamente 15 delas através do celular. “Vão ter muitas perdas do vínculo presencial com as crianças”, lamenta o voluntário.

Mas, mesmo com as dificuldades impostas pela necessidade do isolamento social, a entrega de cestas básicas foi mantida. “Nossa motivação é colocar em prática os ensinamentos da doutrina de Jesus Cristo, que é de ser participante de um processo de caridade. O cristianismo revivido pelo espiritismo traz essa máxima para a gente, não só no aspecto da salvação, que é colocada de uma forma muito pejorativa às vezes, mas como uma força capaz de tornar você uma pessoa melhor”, completa.

Como ajudar

Quando questionado sobre até onde deveria ir o trabalho voluntário, Stone, do Pina, defende que a responsabilidade é de todos, tanto da população, quanto do poder público. “Claro, não podemos isentar o governo, mas nosso trabalho acaba tendo uma importância por alcançar espaços onde ele não consegue chegar. É nosso papel estar a serviço das pessoas também, não podemos nos isentar. A fome existia antes da pandemia e vai continuar existindo após ela. É preciso intensificar o trabalho e continuar pensando em possibilidades para melhorar a realidade dessas pessoas”. Quem se sentiu tocado e quiser colaborar, pode ajudar umas das instituições abaixo:

IJCPM de Compromisso Social

Para entrar em contato com a instituição, acesse www.ijcpm.com.br/contato

Amigos Solidários

As doações podem ser feitas através do PIX 094.629.874-24, entrando em contato pelo (81) 99534-8959 ou pela conta no Instagram @as_solidario, ou pessoalmente na Paróquia do Pina.

Associação Vizinhos Solidários
Rua Souto Filho, 118, Pina
Para doar, transferir valor para o PIX: 39.988.775/0001-52

Cúria Metropolitana
Av. Rui Barbosa, 409, Graças, Recife, todos os dias, de domingo a domingo, das 7h às 17h, além de paróquias das igrejas católicas

Armazém do Campo
Rua Imperador Dom Pedro II, 387, Santo Antônio
Para doações em dinheiro: Associação da Juventude Camponesa Nordestina - Terra Livre - Banco do Brasil | AG 0697-1 | CC 58892-X (outros bancos, substituir o X por 0)
PIX: 09.423.270.0001.80

A Fome Não Pode Esperar
As doações podem ser feitas por depósito bancário na conta: Diocese de Palmares - CNPJ: 10.193.944/0028-04 - Banco do Brasil | AG: 3924-1 | CC: 40.629-5

Casa da Esperança

As doações podem ser feitas por depósito bancário na conta: 23362-5, Agência: 3699-4, Banco do Brasil, ou 614-0, Agência: 1580, Caixa Econômica Federal, ou 66664-4, Agência: 0877, Itaú. Também é possível doar com cartão de crédito (recorrente ou doação única), cartão de débito, débito em conta ou boleto bancário no site https://design.fingerprint.com.br/CASA_ESPERANCA/PAG_CAPTACAO/index.html

Central de Cidadania
As doações podem ser feitas pelo site www.centraldecidadania.org/doe-contato

Cores do Amanhã
As doações podem ser feitas por depósito bancário na conta: Movimento Social e Cultural - Cores do Amanhã - CNPJ: 13.449.687/0001-9 - Banco do Brasil | AG: 4118-1 | CC: 20.766-7

Enche Panela
As doações podem ser feitas via vakinha.com.br/vaquinha/enche-panela

Núcleo de Apoio à Criança com Câncer (NACC)
As doações podem ser feitas pelo site www.nacc.org.br/como-ajudar/doacoes/

Samaritanos

As doações podem ser feitas por depósito bancário na conta: 43787-5 | AG: 3243-3 | CNPJ: 32.589.782/0001-32 | Banco do Brasil

Tags

Autor