URBANISMO

Temendo despejos, comunidades vulneráveis do Recife cobram transparência do ProMorar

Aplicação de questionário em localidades beneficiadas pelo programa mostrou que a desinformação e o medo ainda rondam os moradores

Imagem do autor
Cadastrado por

Katarina Moraes

Publicado em 13/12/2023 às 14:45 | Atualizado em 13/12/2023 às 17:15
Notícia
X

Apresentado como um dos carros-chefes da gestão João Campos (PSB), o ProMorar tem sido visto com apreensão por parte das comunidades que serão urbanizadas. Isso porque há a previsão de reassentamento para 3 mil casas, mas ainda não se sabe quais são e para aonde seus moradores vão. Por isso, a Articulação Recife de Luta (ARL) preparou um plano com sugestões para Prefeitura se comunicar melhor com os moradores das localidades.

Entre os pedidos, estão a disponibilização no site do programa da metodologia, cronograma, execução orçamentária, projetos e calendários de ações em cada comunidade contemplada. Base física nos territórios e ouvidoria próprias do ProMorar também são requisitadas.

“Não estamos indo contra, só queremos trazer respostas para as comunidades que estão envolvidas no programa”, afirmou Joelma Andrade, coordenadora geral do Centro Comunitário Mário de Andrade, que integra a iniciativa.

As sugestões serão enviadas após a audiência pública na Câmara Municipal, em 1º de dezembro, convocada pelo vereador Ivan Moraes (PSOL). Nela, organizações sociais, junto a 21 comunidades, alegaram falta de transparência da gestão e pediram um canal de diálogo sobre o programa.

Evanildo Barbosa/Divulgação
Audiência pública sobre o ProMorar na Câmara Municipal, em 1º de dezembro - Evanildo Barbosa/Divulgação

QUESTIONÁRIO REVELOU DÚVIDAS

Em outubro, a FASE Pernambuco visitou 16 territórios já anunciados para receber ações do ProMorar com o intuito de entender quais as expectativas quanto à execução das obras em cada e as dúvidas encontradas. Por meio de questionários in loco, constatou-se que o “resultado foi de muita dúvida”, contou André Araripe, arquiteto e urbanista da FASE.

O maior temor de 90% dos moradores entrevistados é de serem removidos de áreas de risco sem perspectivas de uma outra habitação digna. “É uma questão delicada porque se propõe a eliminar moradias em áreas de risco da cidade, o que é meritório, mas isso tem que ser feito com muito cuidado, porque não podem sair de uma situação de risco para serem colocadas em outro local de risco", explicou André.

Uma delas é Maria da Penha Gouveia, de 65, que mora na Comunidade Jardim Uchoa, em Areias, na Zona Oeste da capital. “As pessoas estão com medo, com insegurança. Querem que seja bom, acreditamos que vai ter uma coisa boa, mas estamos ansiosos por não sabermos. Estamos em praticamente novembro, daqui a pouco as chuvas começam de novo e é capaz de termos outra cheia daquela”, relatou.

Na Comunidade Padre Henrique, na Várzea, também na Zona Oeste, ainda não houve debates, segundo a estudante Samantha Vallentine Cabral, de 36 anos. "A gente não viu nenhuma esfera participativa para deliberação das propostas do programa. Chega de forma unilateral. Nossos anseios são justamente a nitidez de como acontece esse processo", pediu.

Durante a audiência, a coordenadora geral do ProMorar, Beatriz Menezes, afirmou que promete incluir as informações no site oficial do programa. Ainda, garantiu que nenhum residente será removido sem um plano negritado de reassentamento e que todos os territórios se tornarão Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis). Por fim, que trabalhará junto à ARL para aprimorar a comunicação, a participação no cronograma de ações e que vai realizar reuniões periódicas para discutir os próximos passos.

Procurada pelo JC, a Prefeitura do Recife informou os investimentos que vem fazendo no Pro morar, além da tentativa de garantir eficiência ao processo.

Veja resposta na íntegra: 

Atualmente, a cidade do Recife possui R$ 126 milhões de investimentos sendo executados em obras de encostas permanentes através do Promorar. Desde 2022, antes mesmo de assinar contrato com o BID, a Prefeitura do Recife deu início às escutas ativas e realizações de oficinas em 17 das 40 comunidades que serão contempladas através do Programa Promorar. O processo visou imprimir mais eficiência e otimizar processos. Durante esses encontros, a população manifesta seus interesses acerca de equipamentos e obras de urbanização para posterior validação de um plano para execução.

A primeira destas comunidades contempladas pelo Programa, a Vila do Papel, no Coque, validou na última quarta (6) o projeto do complexo de lazer da localidade, que irá receber também urbanização integrada e implantação de equipamentos públicos como creche.

As equipes sociais do Promorar também acompanham, diariamente, as comunidades contempladas mediando e mobilizando a prestação de serviços e intervenções públicas antes mesmo da validação dos projetos. O Promorar ratifica ainda que o site do Promorar está sendo permanentemente atualizado com os processos de validação dos planejamentos conforme já previsto para atendimento às premissas do BID.

O QUE É O PROMORAR

O Programa de Requalificação e Resiliência Urbana em Áreas de Vulnerabilidade Socioambiental – ProMorar Recife foi pensado após as chuvas de 2022 deixarem 134 mortos em Pernambuco, sendo 52 na capital do Estado. O grande objetivo é reduzir o risco de inundações durante o inverno e realizar obras de infraestrutura para conter as encostas em risco de deslizamento.

Para isso, é prevista a retirada e o reassentamento de 3 mil famílias em áreas de risco para alagamentos ou deslizamentos, a urbanização de 40 comunidades de interesse social e redução do déficit habitacional. O conjunto de ações será financiado por meio de empréstimo de R$ 2 bilhões firmado neste ano entre o município e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

No começo de 2024, a ARL pretende realizar um seminário entre a sociedade civil e a Prefeitura do Recife sobre o assunto. Estão na organização a FASE Pernambuco, Centro Popular de Direitos Humanos (CPRH), Habitat para a Humanidade Brasil, Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (Cendhec), Gris Espaço Solidário, Centro Comunitário Mário de Andrade e Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU).

Tags

Autor