MEIO AMBIENTE

Municípios de Pernambuco estão entre os primeiros a registrar clima árido no Brasil

Ministério do Meio Ambiente (MMA) descobriu que Petrolina e Belém de São Francisco, no Sertão do Estado, também estão na área onde pela primeira vez foi detectado clima árido no País

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Katarina Moraes

Publicado em 02/02/2024 às 15:40 | Atualizado em 02/02/2024 às 16:17
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Petrolina e Belém de São Francisco, no Sertão de Pernambuco, estão entre as cidades do Brasil onde foi identificado, pela primeira vez, a presença de clima árido no Brasil. No último mês, cientistas compartilharam a preocupante descoberta da tendência de desertificação no norte da Bahia; contudo, não havia sido divulgada que na área também estava inscrita uma pequena extensão de terra na fronteira com o Estado.

O diagnóstico do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) e do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) utilizou a metodologia da convenção de desertificação das Organização das Nações Unidas (ONU), internacionalmente reconhecida. Para chegar ao resultado, foi analisada a média de precipitação e da evaporação potencial da região durante 30 anos, entre 1990 e 2020.

Inicialmente, os pesquisadores haviam encontrado aridez nos municípios de Abaré, Chorrochó e Macururé, além de trechos de Curaçá, Juazeiro e Rodelas, na Bahia. Mas ao enviarem os dados para o Ministério do Meio Ambiente (MMA), este constatou que Pernambuco também se enquadra no traçado.

Segundo os cientistas, esse estado atmosférico inédito no país foi causado pelo aquecimento global. “O aumento de temperatura aumenta a demanda de evaporação da atmosfera e faz com que regiões fiquem mais áridas”, explicou ao JC Javier Tomasella, um dos pesquisadores responsáveis pela descoberta.

“Não é o fim do mundo, mas precisamos nos preparar, porque a tendência é sempre agir quando a tragédia aconteceu. Precisamos nos antecipar e nos planejar antes da água faltar”, pontuou ele.

DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
O Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (Nema) da Univasf tem apostado no reflorestamento da região - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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Em Pernambuco, 123 dos 184 municípios do Estado correm risco de desertificação, segundo estudo de 2021 da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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O Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (Nema) da Univasf tem apostado no reflorestamento da região - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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Em Pernambuco, 123 dos 184 municípios do Estado correm risco de desertificação, segundo estudo de 2021 da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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O Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (Nema) da Univasf tem apostado no reflorestamento da região - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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Em Pernambuco, 123 dos 184 municípios do Estado correm risco de desertificação, segundo estudo de 2021 da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF

O geógrafo Daniel Rodrigues de Lira, professor de ciências geográficas da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), destacou que o resultado já era esperado. “Nos estudos de clima passados já foi detectado que essa área teve clima árido há milhares de anos”, afirmou. “O ineditismo é conseguir detectar esse dado em tempo humano, mas era algo já esperado pelos índices de vegetação e de aridez da região”.

Ainda assim, hoje a localidade se parece mais com o semiárido que com um deserto propriamente dito, segundo o biólogo Renato Garcia, da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). “Não secou agora, sempre foi a mais seca, mas alguns processos potencializam o déficit hídrico”, disse. “Não foi perceptível que estava secando mais, sempre foi uma região diferente”.

EXPANSÃO DO SEMIÁRIDO

No mesmo estudo, o Cemaden e o Inpe alertaram que a tendência de aumento da aridez está em todo o país, com exceção da região Sul e do litoral dos estados de Rio de Janeiro e São Paulo. No Sul, por exemplo, é observada uma tendência inversa, associada ao aumento das chuvas — que também tem causado danos como enchentes e enxurradas nos últimos anos.

Em Pernambuco, 123 dos 184 municípios do Estado correm risco de desertificação, mostrou estudo de 2021 da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Esse processo pode resultar, segundo os especialistas, em ausência quase total de chuva, falta de água, solo com vegetação espaçada e poucos recursos naturais para sobrevivência. E, assim, em uma migração para o meio urbano, gerando mais inchaço nas cidades.

E, apesar do aumento da aridez afetar mais o semiárido brasileiro, o litoral também sofre as consequências. Um exemplo é o Rio Capibaribe, que passa pelo Recife, mas tem nascente no município de Poção, no Vale do Ipojuca, no Agreste Pernambucano. “Se essa situação afetar outras áreas, termina afetando também o litoral, já que a água que bebemos muitas vezes vem dos rios”, disse Javier.

Pelo aumento do clima estar ligado a um fenômeno global de aquecimento da atmosfera, dificilmente acontecerá a reversão da aridez atual, conforme explicaram os pesquisadores à reportagem. Eles defendem que o que pode ser feito, daqui para frente, é desacelerar e conter esse processo.

COMO CONTER A ARIDEZ

Para Javier, é preciso que essa região se adapte à nova realidade, sendo estratégica no uso de água, por exemplo. “Precisa melhorar a irrigação, Petrolina tem muitas áreas irrigadas. Universalizar o acesso à água tratada, fazer reuso dela. É urgente melhorar o nível do tratamento de esgoto no Nordeste”, sinalizou.

A necessidade de reverter a marginalização do semiárido é outra urgência. “Existe um fundo Amazônia, todo mundo está preocupado com ela, mas não existe nada para a Caatinga — que tem uma biodiversidade muito rica. É muito renegada e isso traz problemas, porque as pessoas cortam [sua vegetação]. Falta investir e monitorar essas áreas, investir em capacitação, educação ambiental e no setor de pesquisa", defende Daniel.

O Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (NEMA) da Univasf, do qual Renato Garcia é coordenador, tem apostado no reflorestamento da região — outra importante medida já que o plantio ajuda a esfriar a temperatura do solo e conter a evaporação.

Há dez anos, o grupo cria modelos de recuperação do solo nas áreas afetadas pela transposição do Rio São Francisco na Caatinga, com o uso de espécies nativas. “A água cai no solo, é filtrada pelas plantas que colocamos, param nas barreiras e infiltram no solo. Corre por baixo do solo e para na barragem, isso aumenta a quantidade de água no solo disponível para as plantas e impacta no índice de aridez”, descreveu.

“Não é uma reversão, mas diminuição da velocidade do aumento de aridez, e em ultima instância dando mais tempo para ter um planejamento. Porque se é uma mudança macro, numa escala maior, não é a recuperação de pequenos riachos que vai mudar essa realidade, mas estamos dando tempo até para ter mais políticas públicas”, concluiu.

DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
Pesquisadores defendem a ampliação de políticas públicas para salvar o semiárido brasileiro - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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O Núcleo de Ecologia e Monitoramento Ambiental (Nema) da Univasf tem apostado no reflorestamento da região - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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Pesquisadores defendem a ampliação de políticas públicas para salvar o semiárido brasileiro - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
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Pesquisadores defendem a ampliação de políticas públicas para salvar o semiárido brasileiro - DIVULGAÇÃO/NEMA/UNIVASF
Mr. & Mrs. Machado
Pesquisadores defendem a ampliação de políticas públicas para salvar o semiárido brasileiro - Mr. & Mrs. Machado

POLÍTICA NACIONAL DE COMBATE À DESERTIFICAÇÃO

O diagnóstico produzido pelo Inpe e pelo Cemaden servirá como base para atualização do Plano de Combate à Desertificação, elaborado em 2004. Ele contará com um conjunto de iniciativas e ações de combate ao efeito da seca, segundo o Diretor de Combate à Desertificação do MMA, Alexandre Pires.

“Ter o clima árido nesses municípios chama atenção, vamos precisar dedicar com as instituições de pesquisa um tempo para entender o que aconteceu, porque surgiu nessa região, e isso vai nos dar respostas em um tempo de médio a longo prazo para pensar como esses estudos nos subsidiam para elaboração de políticas públicas”, afirmou.

De acordo com ele, serão feitos, a partir de março, seminários estaduais para escutar os governos locais sobre quais medidas poderão ser tomadas. Depois, a escuta será compilada em um conjunto de propostas e medidas para que o governo federal estabeleça metas e prazos para execução das ações.

“Esperamos ter esse processo concluído até setembro de 2024, porque queremos ir para a Conferência das Partes (COP) na Arábia Saudita com o plano como nosso instrumento de diálogo com os países, para captar recursos com os fundos de financiamento de clima e de meio ambiente”, disse.

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