Após aprovação do decreto de calamidade pública no Estado, 49 municípios - dos quais apenas o Recife também seguiram a mesma medida para possibilitar a maior celeridade e desburocratização das ações de combate ao novo coronavírus. Apesar de o cenário ainda ser prematuro para algumas mudanças nos prazos do calendário eleitoral, segundo especialistas ouvidos pelo JC, essas medidas podem abrir exceções sobre determinadas condutas vedadas em ano eleitoral, como a distribuição de bens ou benefícios, e o repasse voluntário da União para os municípios e dos estados para os municípios.
De acordo com a legislação (inciso IV do artigo 73 da Lei 9504/97), desde o dia 1º de janeiro de 2020, “é proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública”. No entanto, no décimo parágrafo do artigo, fica estabelecida “a exceção nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária, caso em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa”.
A Procuradoria-Geral do município de Ipojuca, Litoral Sul do Estado, já iniciou um estudo sobre a viabilidade de criar programas sociais para minimizar os efeitos provocados pela Covid-19 em diversos setores. “Nós já temos uma ideia, o programa, agora a forma do programa, se seria transferência de renda ou doação de cesta básica, ainda não. Mas criação de um programa assistencialista para os trabalhadores que ficaram desassistidos, isso aí é fato. Agora, para ser criado precisa ser declarado a calamidade pública”, explica o procurador-geral Marcos Lira.
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Ainda segundo Lira, a preocupação da gestão não é com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), já que o município estaria dentro do limite, mas com as condutas vedadas em ano eleitoral. “A gente não pode dar uma pipoca porque a gente cai na lei eleitoral. A preocupação de agora é essa (assistência)”, afirma.
A prefeita de São Bento do Una, Débora Almeida (PSB), também se mostrou atenta a essa questão da criação de programas sociais em atenção aos que forem atingidos diretamente ou indiretamente com a crise sanitária. “Nós precisamos atender a população, seja por meio de programas, doação de cestas básicas. Não temos ambiente para falar de eleições. Como os prefeitos vão cumprir os prazos eleitorais?”, questiona a gestora, que também integra a direção da Associação Municipalista de Pernambuco (Amupe).
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“Hoje, tem pessoas achando que o isolamento não é necessário, mas a situação pode se agravar ainda mais daqui a 10 dias ou mais. Os prefeitos precisam tomar decisões difíceis, porque nas ruas com os comércios fechados, as pessoas ficam raiva e vem nos cobrar”, ressalta a prefeita.
Outro impedimento na lei eleitoral refere-se a transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios. Segundo a legislação, há ressalvas apenas "nos recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado", “e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública”.
Mas, é preciso estar atento, porque o calendário eleitoral estipula que estes repasses voluntários sejam feitos até três meses antes da realização das eleições - que este ano será no dia 4 de outubro. “As transferências voluntárias são decorrentes de convênios, acordos e contratos firmados entre a prefeitura e a secretaria estadual, ou a prefeitura e um ministério. Elas são proibidas três meses antes das eleições, mas neste momento nada está proibido (mesmo no caso dos municípios que decretaram calamidade pública)”, explica o advogado especialista em Direito Eleitoral, Bruno Brennand.
“Essa é uma situação absolutamente nova. Com certeza vai haver algum tipo de flexibilização, mas é um momento muito prematuro para tratar dessa questão. Sobre esses repasses voluntários, nós ainda não atingimos o período, que seria em julho”, ressalta Brennand.
O advogado também relembra que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mantém todos os prazos estipulados no calendário eleitoral em vigência até o momento. “O próprio TSE respondeu uma consulta sobre filiação, que termina dia 4 de abril, afirmando que está mantido o prazo e que ela pode ser feita de forma eletrônica”, afirma.
Mudança nos prazos eleitorais
O prefeito de Petrolina, Miguel Coelho (MDB), também concorda que é cedo para mudar prazos, mas que diante dos números da doença que são apresentados em todo o país, “vamos passar um bom tempo nessa situação”. “A responsabilidade da gente é com o mandato que já ganhamos. Quanto mais dinheiro a gente receber do Estado, melhor. Se tiver essa briga de governadores e presidente, pior. Os postos de saúde ficam aqui nos municípios”, declara Coelho.
Mesmo diante da possibilidade dos decretos de calamidade pública nos municípios, continuarem em vigência até o período de proibição dos repasses voluntários entre os entes da federação, ainda assim os gestores não podem aplicar as verbas em qualquer área. “Essa exceção da calamidade pública, ela não abre janela para tudo e qualquer coisa. Ele abre para o repasse de recursos voluntários para o que tem relação com a situação de calamidade”, esclarece a professora da Escola de Direito e Administração Pública do IDP, de São Paulo, Marilda Silveira.
Ou seja, a verba a ser repassada teria que ser correspondente à aplicação que o decreto de calamidade pública amara. Neste caso, os recursos seriam destinados ao combate do coronavírus, como a compra para equipamentos hospitalares, por exemplo. “O prefeito não teria margem de manobra para destinar esse recurso para outra coisa. Os órgãos de fiscalização como a controladoria, os tribunais de contas, vão ver se, mediante o socorro, ele foi devidamente utilizado para aquela destinação”, afirma o advogado eleitoral Bruno Brennand.
A professora do IDP, também cita outra exceção como exemplo, o programa federal Bolsa Família e o cronograma de obras em execução. “Esses repasses continuam normalmente, mesmo em ano eleitoral. A lei, ela já cobre as hipóteses necessárias para os momentos que estamos vivendo. Mas, é muito cedo para falar de alteração de datas”, afirma Marilda.
Confira calendário eleitoral
Janeiro
Desde 1º de janeiro:
Todas as pesquisas de opinião devem ser obrigatoriamente registradas no Sistema de Registro de Pesquisas Eleitorais (PesqEle) até cinco dias antes da sua divulgação.
Fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da administração pública, exceto em casos de calamidade pública, estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já previstos no orçamento do ano anterior.
Também fica proibida a execução de programas sociais por entidades vinculadas a candidato ou mantidas por ele.
Março
5 de março ao dia 3 de abril:
Janela partidária - vereadores poderão mudar de partido para concorrerem nas eleições sem perderem o mandato
Abril
1º de abril até 30 de julho:
O TSE começará a promover propaganda institucional em emissoras de rádio e televisão para incentivar a participação de mulheres, jovens e da comunidade negra na política, além de esclarecer sobre as regras e o funcionamento do sistema eleitoral brasileiro.
4 de abril (seis meses antes da eleição):
Registro do partido - prazo para que os partidos obtenham registro junto ao TSE.
Domicílio eleitoral - prazo para que pré-candidatos tenham domicílio eleitoral na cidade em que pretendem concorrer.
Filiação partidária - prazo para os que desejam concorrer estarem filiados a um partido registrado no TSE.
Maio
6 de maio:
Alistamento - prazo para eleitores emitirem obterem o título de eleitor, solicitarem transferência e revisão de dados cadastrais.
15 de maio:
Financiamento coletivo - pré-candidatos poderão fazer arrecadação prévia de recursos, que só poderão ser utilizados na campanha após o registro de candidatura.
Junho
16 de junho:
Fundo eleitoral - TSE vai divulgar os recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC)
30 de junho:
Ficam vedado às emissoras de rádio e televisão a transmissão de programas apresentados ou comentados por pré-candidatos.
Prestação de contas:
Último dia para envio de prestação de contas de 2019 pelos partidos.
Julho
A partir de 4 de julho (seis meses antes da eleição) fica vedado aos agentes públicos condutas que possam afetar a igualdade entre candidatos. Ex: Contratação de shows artísticos pagos com recursos públicos na realização de inaugurações.
20 de julho a 5 de agosto:
Convenções partidárias - fica permitida a realização de convenções para escolha de coligações e candidatos a prefeito, vice-prefeito e a vereador.
Agosto
Até 15 de agosto:
Registro de candidatura - prazo para partidos e coligações apresentarem à Justiça Eleitoral o requerimento de registro de candidatura.
A partir de 16 de agosto:
Propaganda eleitoral -permitida a propaganda inclusive na internet
Setembro
A partir de 19 de setembro (15 dias antes da eleição):
Nenhum candidato poderá ser detido ou preso, a não ser em flagrante delito.
24 de setembro (10 dias antes da eleição):
2ª via - último dia para o eleitor requerer a segunda via do título dentro do domicílio eleitoral
A partir de 19 de setembro:
Nenhum candidato poderá ser detido ou preso, a não ser em flagrante delito ou devido à sentença criminal condenatória por crime inafiançável.
Outubro
1º de outubro:
Propaganda eleitoral
Último dia para divulgação da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV relativa ao 1º turno
Último dia para a realização de debate no rádio e na TV relativo ao 1º turno
4 de outubro:
Primeiro turno das eleições
23 de outubro:
Último dia para divulgação da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV relativa ao 2º turno
Último dia para realização de debate no rádio e na TV relativo ao 2º turno
25 de outubro:
Segundo turno das eleições
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